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Calma e prudência

Inúmeros patrocinadores do Santos ameaçaram rescindir os contratos que mantinham com o clube da baixada santista, caso ele insistisse na contratação do jogador Robinho, em virtude do crime sexual pelo qual responde na Itália.

Muito embora não se saiba o conteúdo desses ajustes nem que tipo de cláusula foi invocada para que fosse acenada a possibilidade de rescisão, é importante que se atente para algumas questões que passaram despercebidas pelo grande público e até por especialistas.

É comum em contratos de patrocínio existirem cláusulas de rescisão com conteúdo genérico, dando ao patrocinador a prerrogativa de “rescindir de pleno direito o contrato, caso o clube faça algo que prejudique a sua imagem”.

Mas será que o patrocinador deve ter esse poder? Ao fim e ao cabo, esse juízo de valor, feito exclusivamente pelo patrocinador, representa dar a ele um poder de vida e de morte sobre o contrato.

Nosso direito veda expressamente as condições puramente potestativas, que são aquelas que sujeitam todo o efeito de um negócio jurídico ao puro arbítrio de uma das partes. (Art. 122 – CC).

Assim, por exemplo,  são as cláusulas que digam que a prestação será honrada se uma das partes quiser ou entender conveniente. Assim quis o nosso ordenamento porque estas disposições geram grande insegurança jurídica. E onde há insegurança jurídica, o Direito não dá a sua proteção.

Cláusulas genéricas que concedem ao patrocinador o amplo arbítrio de dizer quando o clube descumpre ou não a obrigação de preservar a imagem de seu parceiro contratual produzem esse mesmo efeito, sendo, portanto, inválidas.

Como se não bastasse, deixamos de ter uma relação contratual igualitária para vermos um vínculo desigual, acarretando num estado de sujeição de uma parte quanto à outra, o que é juridicamente inadmissível, pois o patrocinador ficaria a cavalheiro para definir qual conduta é certa ou errada, boa ou ruim.

Essa ampla margem de discricionariedade aumenta a chance do cometimento de abusos e da produção de atos lesivos ao Direito. Talvez essa questão não tenha sido colocada na mesa no caso do Robinho, diante da gravidade dos fatos envolvidos. Entretanto, um olhar atento sobre a hipótese evidencia a existência de potenciais ilegalidades, senão vejamos.

A “falta” atribuída ao Santos foi a de contratar um profissional para prestar serviços à equipe. O Santos não cometeu nenhuma ilicitude. Simplesmente por essa iniciativa, ele não pode ser punido. Eventual ilícito foi cometido por Robinho e não pelo clube.

Talvez os patrocinadores poderiam ter razão se o Santos estivesse envolvido diretamente em algum episódio ilícito ou manifestasse apoio a movimentos supremacistas brancos, misóginos e homofóbicos, por exemplo. Não foi isso, contudo, o que ocorreu, porque o fato de querer contratar Robinho não implica necessariamente em dizer que ele apoia a prática de crimes sexuais ou de qualquer outra prática de abuso à mulher.

Não se perca de mira também que Robinho ainda não foi condenado de forma definitiva, militando em seu favor o princípio da presunção de inocência. Ademais, seu processo corre na Itália e para que uma sentença penal proferida no estrangeiro tenha eficácia no Brasil é necessário que a mesma seja homologada pelo STJ.

Por outro lado, essas ameaças dos patrocinadores implicam em clara ingerência nos negócios internos da agremiação e em sua autonomia para contratar e administrar o seu departamento de futebol, o que implica claramente na prática de um abuso de direito.

É preciso ter cuidado ao rescindir contratos imputando-se faltas inexistentes à outra parte. Tomar atitudes impensadas no calor dos acontecimentos pode levar patrocinadores a terem de indenizar os clubes pelos prejuízos a eles causados injustamente.

Calma e prudência são fundamentais nessa hora.

Porque quando o assunto envolve extinguir um negócio jurídico, antes dar ouvidos à pressão social, é melhor primeiro escutar os conselhos de um bom advogado.

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