O caso envolvendo Daniel Alves, preso preventivamente na Espanha acusado de estuprar uma mulher em uma boate em Barcelona, no dia 30 de dezembro de 2022, levantou uma série de debates. Uma das reflexões sem dúvidas passa pela necessidade da criação de medidas urgentes no esporte de proteção às mulheres. Números alarmantes de um levantamento feito pelo jornal ‘Folha de S. Paulo’ reforçam isso.
“Nos últimos anos, o esporte tem sido palco de inúmeras discussões sobre medidas para assegurar a proteção de mulheres contra atos de violência em ambientes de prática esportiva e em eventos públicos de entretenimento, no entanto ainda passam longe da responsabilidade social que o tema exige. Não basta falarmos em inclusão das mulheres, combate à misoginia, se as páginas policiais invadem o caderno esportivo. E o caso recente de Daniel Alves, nos deixa claro que mais do que projeto de lei, regulamento e comissões, o esporte deve imediatamente aplicar medidas urgentes que assegurem os direitos humanos, como a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, dentro e fora dos ambientes esportivos, demonstrando assim, seu compromisso e dever com o desenvolvimento humano e social”, afirma a advogada Alessandra Ambrogi, especialista em direito desportivo.
Renan Gandolfi, especialista em direito penal, diz que “a prisão preventiva de Daniel Alves possui todos os elementos para contrariar o senso comum machista de que as mulheres inventam ser vítimas de crimes para ganhar fama”.
“O caso, amplamente repercutido internacionalmente, serve para várias reflexões importantes sobre a violência contra as mulheres: protocolos efetivos de proteção, profissionais treinados e comprometidos para lidar com as situações de agressão sexual, encorajar denúncias, o machismo no mundo do futebol e o debate urgente a respeito de como todos os homens precisam entender que estupro é crime e que as mulheres não são objetos à disposição do prazer masculino. Os detalhes da investigação contra Daniel Alves reúnem todos esses elementos”, ressalta o advogado.
De acordo com o levantamento, entre 2019 e 2021, foram registrados 240 boletins de ocorrência de crimes contra a mulher praticados por atletas no estado de São Paulo, sendo a maioria deles jogadores de futebol. O número não leva em conta as subnotificações das ocorrências, além das vítimas que preferem não denunciar.
Daniel Alves não é o primeiro jogador renomado a ser acusado de um crime sexual. Um dos casos mais emblemáticos é o de Robinho, que foi condenado a nove anos de prisão pela Justiça da Itália por violência sexual em grupo contra uma mulher albanesa, em Milão, em 2013.
Apesar da condenação, Robinho está em liberdade no Brasil. O ex-jogador não pode ser extraditado para a Itália uma vez que a Constituição Federal veta a extradição de pessoas nascidas no País.
Espanha e o combate à violência sexual
A Espanha é considerada uma referência na luta contra a violência sexual e pela igualdade de gênero. Em Barcelona, cidade onde o caso envolvendo Daniel Alves aconteceu, um protocolo de segurança que visa o controle de violências sexuais em ambientes de lazer foi criado. Chamado de ‘No Callem’, o documento foi desenvolvido em 2018, e detalha como espaços privados devem agir para prevenir e agir no caso de agressões dentro desses locais.
Esse protocolo foi criado após uma pesquisa, realizada em 2016, apontar que estabelecimentos de lazer estão entre os três cenários mais recorrentes de registros de casos de violências sexuais.
Além do protocolo, em agosto do ano passado, foi aprovada a Lei da Liberdade Sexual na Espanha, denominada de lei “solo sí es sí” (só sim é sim), que elimina distinções entre abuso e agressão sexual e passa a considerar toda intenção sexual sem consentimento com outra pessoa como uma agressão.
A medida foi inspirada no caso conhecido como La Manada, quando cinco homens estupraram uma jovem de 18 anos nas festas de São Firmino, em Pamplona, em 2016, e gravaram as cenas. Eles foram inicialmente condenados por abuso sexual após entendimento da Justiça de que não houve violência.
“A divulgação de como a vítima foi atendida deve servir de exemplo para outros países, afinal, onde estão homens e mulheres, o risco existe. Com iniciativas como ‘No Callem’, muitas mulheres podem ter mais chance de buscar justiça e apoio e muitos estupradores podem ser punidos. Por isso, é essencial uma mudança na sociedade. Especificamente, no mundo do futebol, ainda totalmente masculino, é preciso normalizar a presença das mulheres: na arbitragem, no jornalismo, na narração, no campo, no comando dos times, na torcida. Não para serem vistas como objetos sexuais, mas como seres humanos desempenhando suas funções com profissionalismo e talento ou desfrutando da paixão pelo futebol”, finaliza Gandolfi.
Crédito imagem: JORGE GUERRERO / AFP
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