O caso de racismo na partida entre Flamengo e Bahia, no domingo (20), pelo Campeonato Brasileiro, poderia ter tido um outro rumo se houvesse uma clareza maior no novo Código Disciplinar da Fifa em casos de atos racistas durante partidas de futebol. A entidade dá permissão para o árbitro suspender e até cancelar partidas, mas não deixa claro se em casos envolvendo jogador isso poderia ser aplicado.
“Entendo que o protocolo da Fifa foi desenvolvido pensando nas atitudes dos torcedores, o que não foi o caso (do Gerson). A interrupção da partida é a última etapa de três, sendo a primeira a solicitação para que as ofensas parem, a suspensão da partida até que as ofensas parem e, em último caso, a interrupção da partida com possibilidade de W.O”, avalia Vinicius Loureiro, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
Em julho de 2019, a Fifa colocou em prática um novo Código Disciplinar, com a luta contra o racismo sendo um dos principais pilares. De acordo com o documento, árbitros passaram a receber autorização para suspender e até encerrar um jogo de futebol por incidentes racistas. Além disso, há poder de atribuir derrota ao time infrator das ofensas.
Para isso ser posto em prática, é preciso que o árbitro aplique o “procedimento de três etapas” em casos que o racismo acontecer:
- Solicitar um anúncio público para que tal comportamento pare;
- Suspender o jogo até que essas atitudes cessem e;
- Abandonar a partida definitivamente.
Entretanto, a entidade não deixa claro se essas medidas devem ser aplicadas somente em casos que as ofensas são proferidas por torcedores, ou se vale para jogadores também.
“Árbitros e o futebol brasileiro não estão usando os caminhos jurídicos que se tem para combater o preconceito. Isso não ajuda no combate ao problema. O juiz só colocou o caso na súmula por causa da repercussão. Entre o que determinou a Fifa e a prática há uma distância muito grande, e isso impede a luta antirracista. É preciso que as autoridades pensem em como implementar essas determinações. Um curso com árbitros para esclarecer o problema poderia ser um bom caminho”, afirma Marcelo Carvalho, diretor do Observatório do Racismo no Futebol.
Essa falta de clareza no Código Disciplinar foi explícita na partida de ontem. Aos 7 minutos do 2º tempo, Gerson parece descontrolado e ‘peitando’ Ramírez após ouvir algo do adversário. Durante a confusão, o volante se dirigiu ao banco de reservas do Bahia para discutir com o técnico Mano Menezes, que alegou ‘malandragem’ por parte do jogador.
O árbitro da partida, Flávio Rodrigues de Souza, relatou o ocorrido na súmula, mas contou que a equipe de arbitragem não ouviu Ramírez proferindo o insulto denunciado por Gerson. Após minutos de discussão, a partida foi retomada e encerrada normalmente ao fim do tempo regulamentar.
“Nesse caso, não vejo descumprimento do protocolo. É uma questão que certamente será analisada pela Justiça Desportiva, com possibilidade de pena grave para o Ramírez. Mas como não foi uma ação continuada, não entendo que o árbitro tenha descumprido o protocolo e, por isso, não vejo possibilidade de ser denunciado”, completa Loureiro.
A diretoria do Flamengo prometeu acionar o jogador colombiano na esfera criminal e desportiva. O Lei em Campo já conversou com especialistas sobre as possíveis punições.
Em nota oficial, o Bahia afirmou que Ramírez negou veementemente as acusações, mas que em casos dessa natureza a voz da vítima é preponderante, decidindo afastar o jogador das atividades até a “conclusão da apuração”.
Crédito imagem: Uefa/Divulgação
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