A verdade é que muitas vezes aprendemos na dor, assim como o esporte. Foi a partir de escândalos que tanto o futebol como o movimento olímpico deram passos importantes em direção a uma agenda mais inclusiva e transparente. A Copa do Qatar pode ser mais um exemplo.
Foi notícia que após as diversas críticas pela escolha do país como sede da Copa do Mundo, FIFA e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) passaram a discutir uma “futura cooperação” para prevenir abusos de direitos sociais e trabalhistas em obras dos Mundiais futuros. A ideia da OIT é que seja feita uma “revisão diligente” em matéria de direitos sociais dos países candidatos a sediar a Copa do Mundo.
E claro que esse seria um avanço gigante, como outros que já foram anunciados recentemente. A próxima Copa e Olimpíadas já trazem boas notícias em relação à integridade e direitos humanos.
Compliance no COI
Pela primeira vez na história das Olimpíadas, os jogos de 2024, em Paris, passaram a ter um programa de compliance. Dentro dele, foi dada uma atenção a proteção de direitos humanos e ao combate à corrupção.
No item 13.1, são apresentados o compromisso da cidade-sede com os princípios da Carta Olímpica, como a proteção de direitos humanos. Já o item 13.2 do documento diz que a cidade anfitriã, o comitê olímpico nacional e o comitê organizador dos jogos devem “abster-se de qualquer ato envolvendo fraude ou corrupção, de forma consistente com quaisquer acordos internacionais, leis e regulamentos aplicáveis no país anfitrião e todos os padrões anticorrupção internacionalmente reconhecidos aplicáveis no país anfitrião, inclusive estabelecendo e mantendo relatórios efetivos e compliance“.
Além disso, o documento exige respeito às leis nacionais e internacionais de direitos humanos. Dessa maneira, por exemplo, a cidade-sede não pode contratar empresas que usam trabalho escravo, além de intensificar o combate ao tráfico de pessoas, por exemplo.
O documento também determina que se for constatado algum ato de corrupção ou que viole os direitos humanos, a sede dos jogos deverá pagar multa ao Comitê Olímpico Internacional. E, mais: se a falta for muito grave, está prevista, inclusive, a possibilidade do COI determinar a troca de sede das Olimpíadas.
No futebol…
Depois do escândalo do Fifagate, a Fifa precisava criar uma agenda positiva. Dentro dessa estratégia, a valorização de direitos humanos ganhou destaque. Em 2017 foi lançada a Política de Direitos Humanos da entidade.
Como avanço trazido por essa política, há que se destacar a Copa de 2026, com sede em três países – Canadá, México e Estados Unidos. Ela é a primeira a ter no contrato com o país-sede cláusulas de direitos humanos.
Como parte dessas medidas, os países sedes do Mundial precisam se comprometer a seguir obrigatoriamente os princípios orientadores da ONU sobre empresas e direitos humanos e a desenvolver estratégias nessa proteção.
A determinação acaba por trazer para o ambiente esportivo o debate necessário e contemporâneo indispensável à sociedade, aos Estados e aos organismos internacionais. O esporte não se afasta do direito e o direito não se afasta da proteção de direitos humanos.
2024 e 2026, novos tempos?
Com essas novidades, as principais entidades do esporte mundial vão além da proteção da integridade e dos direitos humanos. Elas também protegem a própria autonomia, evitando irritações que a vigilância do Estado poderia trazer.
A Copa do Qatar foi um erro da Fifa, mas ele pode servir de aprendizado. A ideia de uma diligência para entender como são tratados os operários em países que querem sediar o principal evento esportivo do planeta pode ser mais um exemplo.
Crédito imagem: ANNE-CHRISTINE POUJOULAT / AFP
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