Por Fernando Silvestre Filho
No último domingo, a final da Supercopa da Espanha entre Real Madrid e Barcelona foi disputada em Riad, capital da Arábia Saudita. Nesta quarta, a final da Supercopa da Itália também acontecerá na mesma cidade. Mas ora, por qual razão que competições que nada tem a ver com o país saudita vêm sendo disputadas ali? Será que se trata meramente de questões comerciais?! Certamente não.
Você já ouviu falar de sportwashing? Em caso negativo, aqui te explico: trata-se de uma estratégia consistente no uso do esporte para limpar (daí o termo “washing”) a imagem negativa de um determinado país ou de um grupo político, fazendo com que a comunidade mundial passe a vê-los como possuidores de uma ética compatível com as convenções internacionais e respeitadores dos direitos humanos.
No entanto, apesar do termo ser relativamente recente, a sua prática é bastante antiga. Podemos citar aqui o exemplo da Copa de 1978 realizada sob a ditadura argentina, ou das Olimpíadas de Berlim de 1936, no auge da propaganda nazista. A nossa própria ditadura militar, inclusive, aproveitou muito bem a conquista do tricampeonato de 1970 como forma de desviar as atenções das violações que aqui aconteciam.
Recentemente, o governo Catari utilizou-se muito bem dessa estratégia, desde o momento da aquisição do Paris Saint Germain em 2011, até a contratação de craques como Neymar, Mbappé e Messi, culminando com a excelente organização da Copa do Mundo Fifa 2022. Afinal, é evidente que craques desse renome não vinculariam sua imagem a governos ditatoriais que não respeitam os direitos humanos, e que tampouco um evento dessa magnitude seria realizado em um local assim, não é mesmo?!
Atualmente, é o governo árabe que vem adotando essa estratégia. Além de ser um país, tal qual o Catar, que adota a sharia como sua lei, restringindo os direitos das mulheres e dos homossexuais, o príncipe herdeiro do Governo Saudita, Sr. Mohammad Bin Salman, é acusado de ter autorizado a operação que torturou e esquartejou um jornalista opositor dentro da embaixada árabe em Istambul.
Contudo, tais fatos vêm sendo “esquecidos” pela comunidade global e, certamente, o uso do esporte é um dos mecanismos utilizados para limpar essa má imagem. E vai muito além de sediar as Supercopas.
Como se sabe, recentemente, o astro português Cristiano Ronaldo foi transferido ao Al Nassr (clube saudita) naquele que é o maior contrato da história do esporte mundial. Ademais, em outubro de 2021, um fundo de investimentos ligado ao governo saudita adquiriu o controle do Newcastle United, equipe que disputa a principal liga nacional do mundo. Além de tudo isso, a Arábia Saudita possui interesse em sediar a Copa do Mundo de 2030, segundo declaração do seu Ministro do Turismo.
Notaram as semelhanças do modus operandi?
- Contratação de estrelas do futebol mundial
- Compra de clube de forte liga europeia
- Interesse em sediar evento de grande porte
Diante de tudo isso, é notória a estratégia saudita de limpar a sua imagem perante a comunidade global através do esporte, aproximando-se dos principais players do mercado e levando entretenimento aos fãs e amantes do esporte, estratégia essa muito similar à utilizada por outros países ao redor do globo, em diversos momentos da história, como já exemplificado. Essa tática ainda dará o que falar no mundo do esporte, sobretudo no do futebol, não sendo esse o primeiro, nem o último caso de sportwashing a ocorrer.
Crédito imagem: Reuters
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