Por Higor Maffei Bellini e Aline Peitl[1]
Estamos juntos para refletir sobre como o “Caso Monark” mostra que situações semelhantes podem trazer possíveis impactos no mundo dos patrocínios esportivos.
Não vamos entrar no mérito dos acontecimentos, isto deixaremos para as instâncias competentes, focaremos apenas em como estes dois fatos impactarão os contratos de patrocínio, em especial os contratos individuais de patrocínio, onde a marca patrocinadora escolhe uma personalidade para patrocinar, porque “via de regra”, entende que aquela pessoa é um representante dos seus valores que pode terá por objetivo ser a “imagem” da marca e criar um espaço para que a mesma seja lembrada.
Apenas queremos deixar registrados de modo expresso que o direito à liberdade de expressão, não permite que seja discutido ou rediscutidos fatos históricos, comprovadamente ocorridos e as consequências destes para a humanidade. A todo direito existem limitações, nenhum direito é ilimitado. E neste caso o limite do direito da liberdade de expressão vem da legislação penal, para que a pessoa responda penalmente, pelas suas palavras e atos e da legislação civil para possível ação de reparação de danos.
Bem como registramos que, a alegação de consumo de bebidas alcoólicas não pode ser usada como justificativa para qualquer atitude. Até mesmo, porque a declaração de consumir muita bebida alcoólica, antes de desempenhar uma atividade, até onde percebe-se profissional, de entrevistas que será transmitida por qualquer meio de comunicação, denota desrespeito ao público que assiste ao programa.
É comum nos contratos de patrocínio, firmado com atletas, cláusulas que obriguem ao patrocinado ter uma conduta ilibada, que se abstenha de ter um comportamento inadequado, como por exemplo consumir bebidas alcoólicas em público, sendo fotografado ou filmado fazendo o uso de álcool, bem como uso de cigarros e de até outras drogas.
É esta mesma cláusula que permite ao patrocinador romper os contratos de patrocínio, em caso de situações, como por exemplo que envolva violência doméstica, envolvimento em crimes, superexposição em redes socias, falas e posicionamentos que remetem conteúdo tendencioso, uso de marcas de concorrentes, entre vários outros fatores que podem determinar o rompimento imediato de um contrato de patrocínio.
Contudo é muito mais comum que estas cláusulas não sejam utilizadas para a ruptura dos contratos, mesmo, quando os fatos permitem. O que só acaba ocorrendo quando existe a pressão da opinião pública, que exige uma postura determinante, tanto aos empregadores deste atleta como também aos patrocinadores, fator esse que pode ser considerado determinante.
Lembrando que para o tribunal da internet não se pode pedir que seja dado o necessário tempo para a ocorrência do devido processo legal, seja respeitada a presunção de inocência que são inerentes aos processos judiciais, uma vez que, na internet, tudo é muito imediato e a informação verídica ou falsa é disseminada em segundos, seja para o bem seja para o mau. Mas não estamos aqui, também, para fazer a análise da força da internet e em cancelar pessoas, ou contratos de patrocínio.
Mas o que estes fatos podem causar de impacto no mercado de patrocínio esportivo? A final este é o tema deste artigo. A resposta é: TUDO!!!!
Estes dois fatos deixaram evidente, que os consumidores de qualquer produto não aceitam ver aquela marca ligada a pessoas que tenham como representantes profissionais que tenham atitudes que contrariam a opinião da sociedade, e quando falamos SOCIEDADE, estamos incluindo todos os seus fatores históricos, tanto socias como comportamentais.
E muito se fala em construir novos caminhos e criar um novo ciclo para o futuro da humanidade, mas poucos falam em como isso veem acontecendo. Com a globalização e o imediatismo da internet, estamos todos no famoso “panoptismo”, conceito de prisão perfeita criado no século 18 pelo filósofo britânico Jeremy Bentham, traduzindo para uma linguagem atual, estamos sendo vigiados o tempo todo e o tribunal cibernético é imediato, uma vez que a maioria tem acesso aos acontecimentos da história da humanidade.
Reflexos desta não aceitação de esportistas com a sua imagem ligada a fatos contrários ao que a sociedade entende como aceitável, já podiam ser vistos no caso do famoso tenista, que foi impedido de participar de um grande torneio de tênis, por não estar vacinado. Ou seja, temos marcas socias, temos histórias que nos falam da peste, gripe espanhola, holocausto, entre tantos outros.
Assim as marcas devem antes de começar a negociar um contrato de patrocínio fazer uma verificação de quem são os atletas, de quem é a família deste esportista. Já que o meio familiar pode impactar nas relações dele com a marca, aparecendo em postagem de produtos direta ou indiretamente junto do atleta, saber se aquele jogador vai conseguir representar tais valores e quais serão suas exigências para representar o patrocinador. É necessário que tudo esteja em sintonia, para então, celebrar o contrato de vínculo de imagem entre patrocinado e patrocinador. Em algumas situações, é preciso verificar se a torcida do clube atual aceita aqueles valores, ou do futuro clube. As vezes as negociações de contratos de patrocínios, vêm junto com a troca de clube, o que é um procedimento muito comum nos dias de hoje.
Mas o atleta também pode e deve verificar os ideais ligados a aquela marca aquele produto, já que não adianta receber valores, mesmo que elevados, para divulgar um produto no qual não acredita?
SIM, pois é preciso se identificar com a marca, com a visão que ela vai transmitir e principalmente estar de acordo com a disponibilidade para promover e fomentar o uso da marca, se não estiver consciente e familiarizado com os termos do contrato e com os objetivos do patrocinador, o atleta poderá ter a decisão de não celebrar o mesmo ou até romper, caso a marca tenha se posicionado de uma maneira contraria a opinião do atleta.
Tanto o patrocinador como o patrocinado devem ter poder de decisão. Já imaginou uma grande marca que se posiciona favorável ao desmatamento das florestas? Neste caso fictício, o atleta poderá ter a opção de encerrar seu contrato.
Os casos apresentados revelam a necessidade de uma simbiose entre patrocinador e patrocinado, de uma forma que a parceria seja boa para ambas as partes, não pode ser somente boa para uma delas, se assim o for esta estará fadada ao fracasso.
E outro reflexo dos mesmos é a demonstração que o patrocínio deixou de ser uma via de mão dupla, passando a ser uma via de mão tripla, pois em várias situações pela presença de um terceiro envolvido, que alguns chamariam de stakeholders.
Apresentando uma relação na qual os consumidores do produto passarão a ter uma grande importância e relevância, que mesmo gostando de um produto, para não deixar de consumi-los pedem o final da relação de patrocínio ou até mesmo de emprego com o atleta.
Há alguns anos poderíamos dizer que tudo girava em volto dos números para visar uma alta lucratividade, hoje não podemos dizer que esse padrão segue ativo, pois as pessoas possuem acesso e algumas vezes ilimitado, as informações. Sim, o mundo mudou muito e não podemos admitir comportamentos que são convergentes com os erros praticados no passado.
Por isso a semana de 07 a 11 de fevereiro de 2022, pelos casos ocorridos no Brasil, poderá e deverá entrar para a história do mundo dos contratos de patrocínio, como uma quebra do padrão até então vigente, em razão, do fato dos consumidores estarem tomando cada vez mais importância da sua forma nos contratos de patrocínio, tanto para fazer com que estes ocorram ajudando atletas a serem patrocinados, como para fazer com que os contratos sejam interrompidos. Estamos vivendo a história ser escrita sob os nossos olhos.
Crédito imagem: Reprodução/Flow Podcast
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[1] •Jornalista Esportiva
- Assessora de Atletas
- Gestora de Futebol
- Relações Institucionais e Gestora Administrativa da Associação Nacional de Clubes