Pesquisar
Close this search box.

Como relógios de luxo têm funcionado como propina no futebol

O que era para ser apenas um presente tem se tornado dor de cabeça para os agraciados. Não é de hoje que os relógios de luxo alimentam suspeitas de corrupção. No círculo do futebol, as peças têm tido papel fundamental na queda de dirigentes. A última vítima foi Reinhard Grindel. O ex-presidente da federação alemã de futebol foi obrigado a renunciar ao cargo depois que veio a público que ele recebeu um relógio avaliado em 6 mil euros de Grigoriy Surkis, um empresário ucraniano que também é vice-presidente da Uefa. A suspeita é que Grindel tenha recebido o presente por ter votado na Ucrânia como sede da Eurocopa em 2012.

“Temos visto muita distorção, não são presentes, são formas diversas de corromper pessoas; isso gera suspeita sobre os presentes. Não basta ser honesto, tem que parecer honesto. Alguns presentes são injustificáveis. Quando se fala em presente, fala-se de pessoas que têm motivos para presentear umas às outras. Quando a gente fala de pessoas que não têm relacionamento pessoal, você falar em de relógios de até R$ 100 mil, isso claramente não é um presente. É uma tentativa de troca de interesses, para ser o mais sutil possível”, explica o especialista em direito esportivo Vinícius Loureiro.

Depois que explodiu o Fifagate, a investigação conjunta entre Estados Unidos e Suíça que possibilitou a prisão de dirigentes de federações nacionais, entre eles o ex-presidente da CBF José Maria Marin, a entidade que rege o futebol mundial passou a ter uma conduta mais rígida, para não ficar mais exposta e suscetível a escândalos.

Um deles envolve a CBF. Na Copa do Mundo de 2014, pelo menos 48 presidentes de federações receberam um relógio Parmigiani, avaliado em US$ 26 mil. Um ano depois do Mundial realizado no Brasil, o Comitê de Ética da Fifa forçou os presenteados a devolverem os relógios e os doou para a ONG “Street Football World”. A Fifa entendeu que a entrega dos presentes violou o Código de Ética da entidade.

“Receber presentes na esfera privada não é crime. Mas hoje em dia, a ética recomenda cautela nessas atitudes quando existe uma relação de hierarquia ou poder envolvida”, pondera o advogado Domingos Zainaghi.

Um dos presos no Fifagate, Jeffrey Webb fez valer os relógios de luxo que tinha guardado. Para se livrar da cadeia enquanto aguarda o julgamento, o ex-presidente da Concacaf se desfez de 11 peças, entre elas cinco relógios da marca Rolex, para pagar a fiança estabelecida pela Justiça dos Estados Unidos, estipulada em US$ 10 milhões.

“Não existe limite para o valor de presentes recebidos por dirigentes. É prática comum em vários países do mundo. Obviamente, tendo em vista a responsabilidade da empresa com seus acionistas, esses presentes devem ter valor proporcional ao retorno que proporcionam e não podem configurar-se como tentativa de propina privada, de um ponto de vista mais ético do que jurídico, inclusive, e podem ser alvo de questionamentos do ponto de vista dos deveres do administrador. O que pode ser feito, sob essa ótica, depende de análise. Em tese, os cotistas poderiam pedir o afastamento do dirigente e a reposição de perdas”, analisa o advogado e professor de Direito Empresarial Alexandre Kawakami.

Recentemente a Fifa recebeu um pedido inusitado de um de seus ex-dirigentes. Joseph Blatter ameaçou entrar com uma ação judicial contra a entidade pedindo a devolução de 84 relógios. Ele alega que, depois de ter sido suspenso por seis anos do futebol, deixou na sede da Fifa em Zurique alguns modelos, que agora ele quer de volta. A Fifa, por sua vez, afirma que devolveu todas as peças que o ex-presidente pediu e que ele até assinou um recibo, e, meses depois, foi surpreendida pelo novo pedido de Blatter.

Entre os relógios requisitados por Blatter, estão modelos das marcas Patek Philippe, IWC e Omega. O ex-presidente da Fifa alega que as peças fazem parte de sua coleção pessoal, formada desde que ele trabalhava na fábrica suíça de relógios Longines.

“Não podemos definir que todo presente é ocultação de corrupção. Tudo tem que ser analisado caso a caso. Mas é um problema ético, e eu entendo que sim, cabe uma punição esportiva em relação a essa troca de presentes injustificada”, finaliza Vinícius Loureiro.

Compartilhe

Você pode gostar

Assine nossa newsletter

Toda sexta você receberá no seu e-mail os destaques da semana e as novidades do mundo do direito esportivo.