A primeira final da Taça Libertadores decidida em uma só partida reúne dois clubes que mostraram poder de reação e subverteram a própria história recente para se tornarem duas potências do continente. O River Plate usou o trauma da queda para a segunda divisão argentina como impulso para virar o “rei da América”. Depois da chegada do técnico Marcelo Gallardo, foram duas Libertadores, uma Copa Sul-Americana, uma Recopa, uma Copa Argentina. O Flamengo não precisou ser rebaixado. Mas teve de “cortar na carne” para se reestruturar, em um processo que começou em 2013, mas que só começou a dar retorno neste ano. O rubro-negro renegociou contratos, reduziu a dívida trabalhista, pagou credores e começou a investir no elenco.
“Se o Flamengo jogar hoje com a camisa da seleção brasileira, pode jogar contra qualquer equipe do mundo no nível de seleção. A diferença é que nosso time vem trabalhando há muito tempo, existe um projeto integral que avalia todos os tipos de falhas em todas as áreas. Isso pode ser um diferencial ao nosso favor. Também o fato de jogar finais, saber como enfrentar situações de nervosismo, estão ao nosso lado”, analisou Gustavo Grossi, CEO do River Plate, em entrevista ao programa “Bola da Vez”, da ESPN Brasil.
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Segundo dados do “Transfermarkt”, site que avalia o valor dos elencos dos clubes de futebol mundial, o Flamengo gastou 67,5 milhões de euros para montar o grupo que hoje está à disposição do técnico Jorge Jesus. O custo da montagem do elenco do River foi menor, mas nem tanto. Os “Millonarios” gastaram 47,8 milhões de euros na tentativa de conseguir o terceiro título da Libertadores em cinco temporadas.
Só que as semelhanças entre Flamengo e River Plate na reconstrução da história dos clubes para por aí. “É o embate entre o bom gestor e o gestor antigo, que faz tudo de forma atropelada em detrimento da sustentabilidade do clube”, explica o economista César Grafietti, especialista em gestão dos clubes de futebol.
Enquanto o Flamengo puxa o modelo da modernização no Brasil, o River segue apostando no modelo adotado por muitos clubes brasileiros ao apostar nas conquistas para sanar as finanças. O clube argentino, por exemplo, ainda não pagou ao São Paulo o valor pela contratação do atacante Lucas Pratto, comprado junto ao Tricolor no começo de 2018.
“A situação do River Plate não é boa. Então o que a gente consegue ver é que mesmo com as premiações, mesmo com a venda de jogadores, o que faz o River realmente uma potência é o seu torcedor. E isso para mim é muito interessante porque o River não é a maior torcida da Argentina, mas tem o torcedor de maior renda e ele conseguiu converter mesmo no mercado em crise”, avalia o consultor de marketing esportivo Amir Somoggi.
A receita do Flamengo é 64% maior que a do River Plate, e o destaque fica para a diferença no valor recebido da TV. O clube brasileiro recebeu R$ 248 milhões pelo contrato de televisão, enquanto os argentinos ficaram só com R$ 21 milhões. Mas a situação se inverte quando falamos dos sócios. Os torcedores Millonarios contribuíram com R$ 97 milhões para os cofres do River Plate. Já os flamenguistas gastaram R$ 58 milhões com o clube do coração.
“Não há como competir com a economia brasileira e o futebol brasileiro no meu entender. Temos 40 milhões de habitantes, com 40% das pessoas abaixo da linha da pobreza. [A Argentina] é um país muito complicado, que está muito mal. O Brasil não tem concorrente. Somos concorrentes a partir de uma organização muito cuidadosa que olha cada detalhe. Mas, economicamente, se algum desses projetos ampliar o campo de busca, o campo de integração, a paciência com os treinadores, será muito complicado um time da Argentina, ou de qualquer parte da América do Sul, ter a possibilidade de estar na final da Taça Libertadores. Quando isso acontecer no Brasil, não haverá rivais”, prevê Gustavo Grossi, CEO do River Plate.
Enquanto o modelo de administração do Flamengo joga ilumina o caminho de quem quiser ter uma gestão profissional, não se pode falar o mesmo do River Plate, que vai na contramão do que está em curso no Rubro-Negro.
“O River Plate é aquele clube que o torcedor brasileiro conhece. Gasta tudo para ser campeão. Sendo campeão, tem os louros como gestor, consegue a premiação, e depois vende dois ou três atletas, paga as contas e faz a bicicleta girar. Enquanto conseguirem formar atletas e vender, [este modelo] funcionará. Mas está cada vez mais difícil fazer boas vendas. Tanto lá na Argentina como no Brasil, quem depende de vendas para fechar as contas não aguentará mais duas ou três temporadas assim”, finaliza o economista César Grafietti.
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