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Concentração, viagens, pré-temporada, participação em partida: aplicação da Lei Pelé ou Lei Geral do Esporte

Em continuidade sobre a teratologia da vigência paralela na seara justrabalhista da Lei n. 9.615/98 (Lei Pelé) e Lei n. 14.597/23 (Lei Geral do Esporte-LGE), discorrida nesta coluna no início de julho de 2023, dias após a publicação da LGE, constantemente criticada por este escritor, identifica-se o mesmo dispositivo descrito de maneira inversa nas duas Leis, em matéria laboral.

Consoante aborda-se no livro deste colunista, “Curso de Direito do Trabalho Desportivo” (Editora Juspodivm, 2023), quando o legislador regulamenta os acréscimos remuneratórios, pactuados no contrato laboral desportivo, para compensar os períodos do atleta à disposição do clube em concentração, viagens, pré-temporada, participação nas partidas, também pretendeu (interpretação extensiva) recompensar o tempo de transporte ao estádio, preleção, preparação (aquecimento) e vestuário (art. 28, § 4°, III, da Lei Pelé).

Por outra dimensão, relativo ao mesmo exato conteúdo, a atual Lei Geral do Esporte descreve texto normativo, porém de maneira diametralmente oposta, ao delinear que não serão devidos os referidos acréscimos remuneratórios para compensar o tempo à disposição do atleta em favor do clube nas atividades detalhadamente descritas no parágrafo anterior (art. 97, III, da LGE).

Diante desta sobreposição normativa em sentido inverso, tratando-se de matéria estritamente trabalhista desportiva, qual delas deve prevalecer na regulação da realidade prática do emprego esportivo entre jogador e clube?

A solução recomendada deve ser a mesma manifestada no texto publicado em 03 de julho de 2023 desta coluna, afastando-se os critérios tradicionais de antinomia de normas e a utilizar o metaprincípio juslaboral da prevalecência da norma mais favorável em benefício do empregado desportivo.

Para tal concretização na aplicação do princípio da norma mais favorável diante deste problema supracitado, independe-se das vertentes teóricas de sua funcionalidade, tais como: teoria da acumulação ou atomista, teoria do conglobamento, teoria do conglobamento mitigado (orgânico ou por instituto). Isto porque a Lei Pelé e a LGE normatizam temas complexos em somente um dispositivo, conforme é o caso destas normas em conflito.

Nesse esteio, entre as duas normas apresentadas acima, não predomina o critério da Lei posterior que revoga a anterior por regular-se inteiramente a mesma matéria (art. 2°, § 1°, do Decreto-Lei n. 4.657/42, Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro-LINDB).

Mencionado critério, muito conhecido pelo brocardo jurídico Lex Posterior Derogat Legi Priori não incide na área trabalhista com a mesma força que recai nos demais campos jurídicos, mas somente quando a Lei posterior é mais favorável do que a anterior.

Perante esta contraposição legal, também não se vislumbra a incidência do critério da Lex Specialis Derogat Legi Generali, uma vez que ambas as Leis regulamentam, especialmente, a mesma exata matéria: Desporto em Geral, com um segmento de Trabalho Desportivo.

Em síntese, ainda que a Lei Pelé seja a mais antiga, o operador do Direito deve interpretar que o seu art. 28, § 4°, III, prevaleça sobre o art. 97, III, da LGE, a garantir que em favor do atleta empregado seja devido os acréscimos remuneratórios em razão do tempo laborado em concentração, viagens, pré-temporada, participação nas partidas, transporte ao estádio, preleção, preparação (aquecimento) e vestuário.

Por fim, mesmo que o jogador empregado celebre contrato com cláusula que não preveja acréscimos remuneratórios para a compensação do período pormenorizado acima, pode-se alegar que o caráter de adesão e de sua hipossuficiência no desejo de ter acesso ao labor não o permitiu contestar tal clausulado, prefigurando-se um vício de consentimento que comprimiu a sua livre manifestação de vontade, a requerer uma reparação adicional em sua remuneração contratual.

Crédito imagem: CBF/Divulgação

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