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Condenação de Daniel Alves por agressão sexual traz lições ao esporte

A Justiça espanhola condenou o lateral Daniel Alves a 4 anos e 6 meses de prisão por agressão sexual a uma mulher de 24 anos em uma boate. O veredicto foi anunciado nesta quinta-feira (22) pela juíza Isabel Delgado Pérez, da 21ª Seção da Audiência de Barcelona, 15 dias após o fim do julgamento do caso, que aconteceu entre os dias 5 e 7 de fevereiro.

A decisão, apesar de não ser definitiva, já é considerada histórica. Além disso, o caso envolvendo Daniel Alves traz lições importantes ao esporte.

“Pode-se discutir a pena de prisão e a multa (pra mim, extremamente baixa pela gravidade do fato e poder aquisitivo do réu), mas algo é inquestionável: esta foi, principalmente uma vitória das mulheres. A sentença reconhece dois direitos internacionais da mulher, a importância do consentimento e a força da palavra da vítima. Não existe mais essa da ‘palavra de um contra a de outro’, o depoimento de quem sofre uma violência tem peso importante para o início de uma investigação cuidadosa”, afirma o advogado e mestre em direito desportivo Andrei Kampff.

“Não deveria ser necessária a acusação e, agora, a condenação de um atleta por crime sexual para que o tema da violência contra a mulher passasse a receber atenção massiva da mídia e do público no âmbito esportivo. Apesar dos avanços que já tivemos nesse aspecto, sabemos que esse meio – e, em especial, o do futebol – ainda é extremamente masculinizado e, em certa medida, blindado a muitas regras sociais e, inclusive, legais. Por isso é que esse caso, pelo personagem envolvido e pela atenção que tem recebido do público, tem o potencial de penetrar a bolha esportiva com mais facilidade, podendo servir como importante exemplo de que os profissionais deste meio não são intocáveis e não estão alheios às consequências de seus atos”, avalia a advogada Ana Maria Colombo, especialista em direito penal.

A Espanha é considerada uma referência na luta contra a violência sexual e pela igualdade de gênero. Em Barcelona, cidade onde o crime cometido por Daniel Alves aconteceu, um protocolo de segurança que visa o controle de violências sexuais em ambientes de lazer foi criado. Chamado de ‘No Callem’, o documento foi desenvolvido em 2018, e detalha como espaços privados devem agir para prevenir e agir no caso de agressões dentro desses locais.

Esse protocolo foi criado após uma pesquisa, realizada em 2016, apontar que estabelecimentos de lazer estão entre os três cenários mais recorrentes de registros de casos de violências sexuais.

Além do protocolo, em agosto de 2022, foi aprovada a Lei da Liberdade Sexual na Espanha, denominada de lei “solo sí es sí” (só sim é sim), que elimina distinções entre abuso e agressão sexual e passa a considerar toda intenção sexual sem consentimento com outra pessoa como uma agressão.

A medida foi inspirada no caso conhecido como La Manada, quando cinco homens estupraram uma jovem de 18 anos nas festas de São Firmino, em Pamplona, em 2016, e gravaram as cenas. Eles foram inicialmente condenados por abuso sexual após entendimento da Justiça de que não houve violência.

“O caso em questão chama a atenção, também, para o chamado protocolo ‘No Callem’, o qual consiste em uma série de medidas para combater violência contra mulheres em espaços de lazer. O foco do protocolo é a proteção à integridade física e psicológica da vítima e, embora não tenha o processo penal como alvo de atenção principal, ele traz ações importantes para a preservação de eventuais provas e para a punição do agressor. A repercussão do caso trouxe consigo, também, maior atenção à importância de protocolos como esse e, em especial, do envolvimento do setor privado nessa temática. No Brasil, inclusive, o tema inspirou a aprovação, pelo Senado, de projeto similar denominado ‘Não Nos Calaremos’, o qual atualmente aguarda análise pela Câmara”, acrescenta a advogada Ana Maria Colombo.

A decisão da justiça espanhola

A pena imposta a Daniel Alves acabou sendo mais baixa do que o esperado. O Ministério Público Espanhol havia pedido 9 anos de prisão para o brasileiro, enquanto a acusação pedia 12 anos – pena máxima para esse tipo de crime na Espanha.

A decisão levou em conta o pagamento da multa de 150 mil euros (R$ 900 mil) como atenuante de pena, o que é previsto na constituição espanhola. A quantia será destinada à vítima por danos morais e lesões causadas.

Daniel Alves terá liberdade vigiada por cinco anos depois de cumprir os 4 anos e 6 meses em regime fechado. Além disso, o brasileiro também está proibido de se aproximar da casa ou do local de trabalho da vítima. Ele deve manter uma distância de ao menos 1 quilômetro e não se comunicar com ela, por qualquer meio, por nove anos e seis meses.

Em comunicado oficial, a Justiça espanhola declarou que “ficou provado que a mulher não consentiu e que existem elementos de prova, além do testemunho da denunciante, para entender comprovada a violação”.

“O tribunal considera provado que ‘o acusado agarrou abruptamente a denunciante, a jogou no chão e, a impedindo de se mexer, a penetrou pela vagina, apesar de a denunciante ter dito que não, que queria ir embora’. E entende que ‘isso cumpre o tipo de ausência de consentimento, com uso de violência, e com acesso carnal’, diz um trecho da decisão.

A Justiça não aceitou a embriaguez como atenuante.

“… Pois não foi comprovado em plenário o impacto que o consumo de álcool poderia ter tido nas faculdades volitivas e cognitivas do arguido”, decidiu o Tribunal.

O Tribunal acrescenta que segundo relatórios de licença médica, relatos psicológicos e hospitais psiquiátricos, a denúncia traria à vítima mais problemas do que vantagens. E ressalta: “a vítima tinha medo de relatar os fatos devido à repercussão midiática. Ela temia ter sua identidade revelada. Medo endossado pelo vazamento de dados da denunciante, no fim do ano passado, no Brasil”.

A decisão não é definitiva e cabe recurso de ambas as partes no Tribunal de Apelação – segunda instância espanhola – e posteriormente ao Tribunal Supremo, em Madri.

Relembre o caso

Daniel Alves foi preso pela polícia espanhola no dia 20 de janeiro de 2023 após ser acusado de violência sexual por uma mulher na boate Sutton, em Barcelona, no final de dezembro de 2022. Ele foi detido após prestar depoimento em uma delegacia da cidade.

Em fevereiro de 2023, a polícia da Catalunha encaminhou laudos forenses para a Justiça de Barcelona em que foi indicado restos de sêmen do brasileiro no corpo da vítima e no chão do banheiro da boate.

A defesa de Daniel Alves entrou com ao menos quatro pedidos de liberdade, mas todos foram recusados pela Justiça espanhola sob alegação do “risco de fuga”.

Desde o início do processo, Daniel Alves mudou de versão diversas vezes: o brasileiro já afirmou que não conhecia a mulher, depois disse que entrou no banheiro com ela, mas nada aconteceu; posteriormente, afirmou à Justiça que houve apenas sexo oral, que houve sexo com penetração, mas com consentimento, e, por fim, que estava embriagado.

Crédito imagem: EUROPA PRESS/D.Zorrakino. POOL via Getty Images

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