Em abril de 2019 conversei com um dirigente de um grande clube brasileiro sobre a importância de projetos de compliance, uma realidade distante do futebol. Disse que o que era questão moral, se tornaria obrigação legal e – logo – sobrevivência. No último dia 5 de março, já fora do clube, ele me ligou depois que soube da condenação de ex-dirigentes: “lembrei de vc”.
A condenação de ex-dirigentes do Inter por estelionato e organização criminosa pode ser um marco para a gestão do futebol. O caso mostra importância do trabalho conjunto do esporte e do Estado na proteção da integridade no esporte.
O clube começou o processo. Juntou provas, analisou internamente, julgou e baniu os dirigentes da associação. Repassou os documentos ao Ministério Público que começou novo processo de investigação que culminou com a sentença dada no dia 4 de março.
Ou seja, a partir desses dois movimentos é possível banir dirigente irresponsável/criminoso do quadro do clube de acordo com regras privadas e também indiciar, julgar e punir na Justiça Comum por crimes cometidos.
Por isso que repito por aqui o que dizia lá atras para dirigentes do esporte, investir em integridade não é só compromisso moral, mas questão de sobrevivência no esporte. A mudança já está aí.
A verdade é: a vida do gestor irresponsável e/ou criminoso está se tornando muito mais difícil. Não só porque o esporte esta se autorregulando, mas porque o Estado decidiu agir. E com a ajuda dos próprios clubes.
O caso mostra a vitória da democracia interna
O caso do Internacional mostra que, apesar de muitos não acreditarem, existem caminhos legais para investigar, julgar e condenar administradores que roubam instituições esportivas. Ainda mais agora, quando em 2023 foi aprovada a nova Lei Geral do esporte que tipificou o crime de corrupção privada no Brasil.
Sobre as denúncias e o processo há muitos registros, inclusive do excelente repórter Fabrício Folkowskim do Correio do Povo, que trouxe a notícia da condenação.
Mas quero destacar aqui algo pouco comentado.
A condenação desses ex-dirigentes foi uma conquista da democracia do esporte e, como me disse o amigo Ricardo Porto, também do modelo associativo.
Movimento interno, investigação, mobilização de associados e punição.
E isso só foi possível porque o esporte esta – acredite – se protegendo a partir das regras e políticas privadas que escreve.
O esporte se alicerça na sua autonomia.
Ele cria as próprias regras de funcionamento e participação. Não concorda, não participe da cadeia associativa do movimento. Daí a necessária autorregulação para obrigar entidades esportivas a trabalharem de acordo com a integridade.
O fair play financeiro é um exemplo dessa autorregulação. O Licenciamento de Clubes da Fifa, outro. Dois regulamentos jurídicos desportivos que buscam dar credibilidade, integridade, transparência desportiva e financeira. Eles já estão ajudando na profissionalização da gestão esportiva, e tentando preservar um necessário equilíbrio esportivo.
Assim como a FIFA e a Conmebol, a CBF também adotou o Licenciamento de Clubes e promete – vem quando?- um Fair Play Financeiro por aqui.
O CNRD também é uma esperança.
O fato é que esse caminho que o esporte está tomando – inserindo regras que auxiliam na gestão responsável e no combate aos absurdos do negócio – transformará não só a administração esportiva, mas também o próprio direito.
Nos clubes, conselhos atuantes e autônomos, comitês de ética, estatutos atualizados, transparência e ouvidoria independente são caminhos necessários para proteger a instituição.
O Inter mostrou como isso é importante. E como pode ser feito no modelo associativo.
Gestor responsabilizado criminalmente. Isso mostra a urgência de clubes profissionalizarem gestão e implementarem mecanismos internos de conformidade para proteger a instituição.
Quem insistir em não enxergar, irá aprender da pior maneira, como os ex-dirigentes do Internacional.
Crédito imagem: Gazeta do Povo
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