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Contrato de streaming para atletas profissionais: o exemplo do esporte eletrônico e a nova forma de exploração da imagem de atletas

Por João Pedro Leite

Os esportes eletrônicos inovaram em diversas searas desde a sua concepção, da formação de clubes na estrutura de empresas até o formato de transmissão dos jogos. No entanto, chama a atenção para o presente artigo um novo instrumento jurídico celebrado entre clubes e atletas: o contrato de streaming.

Em um primeiro momento, é importante explorarmos as plataformas de streaming e como elas são utilizadas nos eSports. Nesta perspectiva, são responsáveis por apresentações virtuais em formato de vídeo na internet, com transmissão ao vivo e interação direta com o público. Os espectadores podem inserir comentários ao lado da transmissão, bem como enviar mensagens para serem exibidas pelo responsável do canal mediante entrega de recompensas, doações e/ou modelo de assinatura mensal. Para o público que não está familiarizado com essa prática, “clássica” dos eSports, o paralelo pode ser feito com as lives/apresentações musicais, que ficaram famosas recentemente devido às medidas de distanciamento social em virtude da pandemia do novo coronavírus.

Neste sentido, além da “casa” das transmissões dos campeonatos e eventos de eSports, também são conhecidas pelas apresentações individuais de atletas dos clubes de esporte eletrônico. É neste ponto que entra o contrato de streaming entre clube e atletas, uma nova forma de exploração do direito de imagem do atleta que já está chamando a atenção de clubes de modalidades tradicionais.

Sobre o tema, vale ressaltar que tanto os clubes quanto atletas possuem interesse em participar das plataformas de streaming, por serem hoje uma grande oportunidade para aumentar a base de fãs, bem como divulgar marcas, produtos e patrocinadores. Representam, ainda, uma nova fonte de receita, tendo em vista a monetização das plataformas em diversos formatos, incluindo subscrição mensal (assinatura com entrega de ‘privilégios’ na interação com o streamer/atleta), divulgação de produtos, anúncios fixos no canal (faixas que aparecem durante as transmissões), patrocínio e doações em dinheiro.

Como prática hoje de mercado nos eSports, as atividades de streaming geralmente são executadas no canal pessoal do atleta na plataforma, com a dedicação de determinada porcentagem do total para ser executado no canal do clube pelo atleta. Este é um ponto especial de negociação, tendo em vista que as fontes de receita das plataformas são direcionadas diretamente ao proprietário do canal. Não obstante o canal a ser utilizado, a vinculação de banner de patrocinadores será realizada em ambas as hipóteses, incluindo formatos de interação ao vivo com sites e canais de parceiros.

Considerando este cenário e o surgimento de uma nova forma de exploração do direito de imagem dos atletas, nota-se que clubes tradicionais do esporte também já estão se movimentando nos bastidores. Um exemplo é o Paris Saint-Germain, que já tem seu canal oficial na Twitch, a maior plataforma de streaming de jogos[1].A referida plataforma inclusive já possui páginas oficiais para diversas ligas esportivas, incluindo UFC (artes marciais mistas), NFL (futebol americano) NBA (basquete), NHL (hóquei no gelo), RFL (rúgbi) e MLB (beisebol).

Ademais, vários atletas profissionais se engajaram nas referidas transmissões online em virtude da suspensão de campeonatos relacionada à pandemia do coronavírus, sendo realizados inclusive campeonatos entre times na tentativa de satisfazer os torcedores durante a paralisação. No entanto, tudo indica que esse movimento será contínuo e não pontual.

Foto: reprodução Twitch.tv/ca5emiro.

A justificativa está no fato de que, diferentes dos eSports que nasceram nestas plataformas, os esportes tradicionais podem alcançar uma nova base de fãs, bem como permitir novas oportunidades comerciais e um formato inovador de interação com o público. As marcas responsáveis pela comercialização de equipamentos utilizados pelos jogadores, incluindo fones, mouses, teclados, bem como componentes de computadores, também estão diante da possibilidade de novos consumidores e acordos comerciais.

Ademais, em virtude da grande visibilidade dos clubes, é comum que plataformas de streaming ofereçam contratos de exclusividade para os clubes, tal como a Twitch fez recentemente com Real MadridArsenalJuventus e Paris Saint-Germain para transmissão de conteúdo exclusivo das equipes.[2]

No entanto, por se tratar de um cenário diferente e que não permite erros, considerando a característica inerente do streaming que é executado ao vivo e sem cortes, o planejamento e a responsabilidade devem andar lado a lado para os clubes seguirem com este movimento e vincularem seus atletas às atividades de streaming. Há inúmeros casos de jogadores profissionais de eSports envolvidos em polêmicas que causaram dano à imagem do próprio clube[3].

Neste contexto, considerando todas as particularidades supracitadas, um típico “contrato de cessão de imagem” não se mostra adequado e suficiente para reger esta relação complexa entre atleta e clube, de modo que o instrumento autônomo do contrato de streaming deve ser celebrado. Nele, além dos pontos acima elencados, como distribuição de receitas, tempo de transmissão no canal do atleta e do clube, atividades promocionais, também estarão presentes cláusulas típicas como hipóteses de rescisão, prazo, multas, responsabilidades, licença de imagem e código de conduta do streamer. Por fim, ficam evidentes direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo.

Este contrato para atletas profissionais pode representar mais uma forma de questionamento ao limite legal previsto no art. 87-A da Lei Pelé, em que o valor correspondente ao uso da imagem não pode ultrapassar 40% da remuneração total paga ao atleta. Aliás, o contrato de streaming está contemplado nesta hipótese legal? Os valores pagos pelas plataformas aos atletas entram nesta conta?  Ponto que em breve dedicaremos um texto exclusivo nesta coluna para aprofundarmos.

De todo modo, esta inovação trazida pelo esporte eletrônico a respeito da exploração da imagem de seus atletas parece ganhar território nos esportes tradicionais, de forma que os instrumentos jurídicos, modelo de negócio e o próprio ordenamento podem ser objeto de embate diante do mercado e de suas novas necessidades.

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João Pedro Leite é  advogado formado na Faculdade de Direito da USP – Largo São Francisco –, especialista em Direito Desportivo e atualmente head jurídico do INTZ ESPORTS, clube que conta com mais de 70 atletas em 12 modalidades.

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[1] Disponível em: <https://www.twitch.tv/psg/>. Acesso em 13/08/2020.

[2] ORCAL, ARDA. Twitch lança categorias de esportes tradicionais com canais oficiais do Real Madrid e NBA. Disponível em: <https://www.espn.com.br/esports/artigo/_/id/7194046/twitch-lanca-categoria-de-esportes-tradicionais-com-canais-oficiais-do-real-madrid-e-nba>. Acesso em 13/08/2020.

[3] ABREU, Victor de. CS:GO: fer, da MIBR, é banido da Twitch TV. Disponível em: <https://www.techtudo.com.br/noticias/2020/06/csgo-fer-da-mibr-e-banido-da-twitch-tv-esports.ghtml>. Acesso em 13/08/2020.

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