Não é exagero dizer que o Barcelona vive a maior crise de sua história. Nesta quarta-feira (6), Ferran Reverter, CEO do clube, detalhou a atual situação financeira dos catalães por meio da auditoria ‘Due Diligence’ e afirmou que se a tradicional equipe do futebol espanhol fosse uma sociedade anônima, entraria em processo de falência.
Mas como um dos maiores clubes de futebol do planeta chegou nesse ponto? O que foi feito de errado? Bom, sem dúvidas um conjunto de fatores levaram a isso, passando pela falta de governança interna e um bom planejamento financeiro. A situação do Barcelona escancara como gestões danosas podem trazer consequências por anos, décadas e as vezes até selar o fim de uma instituição, servindo de alerta para outras equipes.
“O Barcelona fatura mais de € 700 MM anuais, com potencial de € 1 bilhão em anos normais. Não dá para dizer que falta dinheiro nem responsabilizar os clubes-estado. Vimos que o modelo associativo com 100 mil sócios e ‘controles’ não funciona. A governança interna não funcionou, o fair play financeiro da LaLiga não funcionou, a auditoria não funcionou. Nenhum sistema é infalível, mas estamos falando de um elefante que passou sem ser visto”, ressalta o economista Cesar Grafietti.
“Como a governança é a estrutura que abarca tudo que se relaciona à direção, monitoramento, controles e incentivos, a principal falha do Barcelona começa por aí, o que irradia para os controles internos, compliance e auditoria. Até mesmo os mecanismos de segurança da informação foram falhos ou inexistentes, levando em consideração que o CEO afirmou que armazenados documentos em notebook pessoais e e-mails foram trocados em contas privadas”, avalia Fernando Monfardini, advogado especialista em compliance.
João Paulo Di Carlo, advogado especialista em direito desportivo na Espanha, conta que há saídas na legislação espanhola para clubes altamente endividados.
“Em caso de insolvência extrema, a Legislação Espanhola permite que, mesmo sem ter ânimo de lucro, o clube pode entrar em concurso de credores, o que traria alguns benefícios já no curto prazo, como, por exemplo, a suspensão das ações dos credores, congelamento das dívidas com a Fazenda e liberação das receitas embargadas. No entanto, é evidente que esse cenário não é o ideal, já que podem ter consequências na esfera desportiva, como a impossibilidade de inscrição do clube na Laliga e em competições UEFA”, explica.
De acordo com os números obtidos pela auditoria, o Barcelona teve prejuízo de 481 milhões de euros (R$ 3 bilhões) na última temporada, quando o previsto era um lucro de 1 milhão de euros (R$ 6,3 milhões). Fora isso, o balanço aponta que o clube sofreu uma grande queda nas receitas, de 855 milhões de euros (R$ 5,4 bilhões) para 631 milhões de euros (R$ 4 bilhões). Já as despesas, essa só aumentou, atingindo o maior número já registrado na história da instituição, aproximadamente 1,1 bilhão de euros (R$ 7 bilhões).
Reverter detalhou que a gestão de Josep Maria Bartomeu – principal responsável pelo “caos” econômico do Barcelona, segundo o executivo – fez a folha salarial disparar em 61% (de 471 para 759 milhões de euros) somente em três anos, gastando 1,4 bilhão de euros (R$ 8,9 bilhões) com apenas quatro jogadores.
“Houve uma falta de planejamento financeiro. No caso de Griezmann, na mesma noite que o contrataram, viram que não havia dinheiro e buscaram um fundo para fazer ‘factoring’ (operação financeira). A transferência de Coutinho, que custa 120 milhões de euros, acaba custando 16,6 milhões de euros a mais. Compravam jogadores sem saber se podiam contratá-los”, disse Reverter.
Com uma folha salarial prevista de 835 milhões de euros, 108% acima das receitas, o Barcelona teve de renegociar contratos com alguns jogadores e viu seu maior ídolo, Lionel Messi, deixar o clube após anos por conta das regras de Fair Play Financeiro impostas pela LaLiga.
Por fim, Reverter ainda disse caso o Barcelona fosse uma empresa de sociedade anônima, entraria em processo de falência.
“Em março, nos encontramos com o patrimônio líquido negativo. Se fosse uma empresa de sociedade anônima, seria uma falência contábil que iria supor dissolução. A dívida e os compromissos futuros eram de 1,35 bilhão de euros (R$ 8,6 bilhões).
Apesar da situação extremamente complicada, o dirigente se mostrou otimista quanto ao futuro, ressaltando que o Barcelona irá se recuperar em quatro ou cinco anos. “O clube sempre voltou mais forte e essa diretoria tem um plano que os investidores compraram”, encerrou Reverter.
“O cumprimento das obrigações e a recuperação do clube dependem da responsabilidade financeira, controle dos gastos, implementação de práticas de boa governança e criatividade para a captação de novos recursos”, ressalta João Paulo.
Para Grafietti, o Barcelona consegue se reerguer financeiramente, mas para isso, não adianta ter pressa.
“O clube tem marca, estrutura e condições de se recuperar. Precisa de tempo, paciência e alguém aportando dinheiro, que é o que bancos americanos têm feito”, finaliza o economista.
Crédito imagem: Getty Images
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