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Crise já tirou “salário” do árbitro. Desprotegido por lei, ele está aflito

A crise provocada pelo coronavírus colocou as pessoas em casa, parou o esporte em grande parte do mundo e acabou com a receita financeira de muitos trabalhadores. No futebol uma das classes mais atingidas nessa crise inimaginável é a dos árbitros.

Marcelo de Vico e Pedro Lopes trouxeram aqui no UOL uma realidade dura, difícil e que recebe pouca atenção da gente (imprensa) e do movimento esportivo brasileiro: a situação dos árbitros nesse momento de crise. A categoria foi profundamente atingida, e está aflita.

Em conversa com o Lei em Campo alguns árbitros desabafaram: “estou contando com a ajuda da minha família”, disse um. Outro também reforçou que vive só do dinheiro da arbitragem e que sem jogos “cortei despesas, e se a situação se alongar terei que pensar em vender algo”. Os dois preferiram não se identificar.

Remunerados por partida, juízes e bandeirinhas ficaram sem renda com a suspensão de todas as competições em função do coronavírus, e estão assustados com o futuro financeiro incerto. Essa é uma situação ainda mais grave porque o árbitro no Brasil sequer é tratado como deveria ser, um profissional do futebol.

É importante a gente falar de uma lei que perdeu sua razão de ser. Ou seja, ela existe, mas não tem eficácia. Afinal, segundo Hans Kelsen – austríaco e um dos maiores influenciadores da história do direito –, a eficácia do direito se dá quando os homens agem de acordo com as normas jurídicas. Ou seja, uma lei só é válida quando atinge sua finalidade. Não é o caso da lei do árbitro. Costumo trazer neste espaço histórias que transformaram as regras do jogo. Seja por uma lei, por um movimento do esporte, por uma decisão da Justiça, ou até em função de uma tragédia (quando um fato mostra a necessidade de se proteger mais a integridade dos atletas). Não é o caso da Lei 12.867/2013.

A começar pelo fato de que o árbitro sequer é tratado como manda a Lei, como profissionais. Isso porque a Lei Pelé, a Lei Geral do Esporte, estabelece que os árbitros não têm vínculo de emprego com a entidade pagadora do seu “salário”.

Até em função desse vazio jurídico, pipocam problemas Como se vende um patrocínio para a camisa do árbitro e ele não recebe nada para virar garoto-propaganda em um jogo visto por milhões de pessoas?

Árbitro é garoto-propaganda

Já existem decisões judiciais que determinam que o árbitro receba por esses patrocínios. Magistrados entendem que as entidades esportivas que escalam os árbitros e determinam o uso do uniforme exploram de maneira abusiva a imagem deles ao firmar contratos com terceiros para exposição de marcas nesses uniformes. Sem qualquer repasse a quem aparece expondo o nome dessas empresas.

E aqui uma consideração se faz importante. Diferentemente do direito de arena, o direito de imagem é um direito fundamental, personalíssimo e inviolável, garantido pela Constituição Federal, com direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Além disso, a CF também protege as participações individuais em obras coletivas e a reprodução da imagem e voz humanas nas atividades desportivas.

E tudo isso acontece porque não existe uma profissionalização jurídica dos árbitros. Com medo das implicações que isso traria, nem sequer se cobra dos árbitros dedicação exclusiva à atividade

Agora, os fatos mostram que os árbitros são profissionais. Recebem ordens, precisam cumprir escala, para dar entrevistas buscam autorização, o trabalho é permanente, recebem por isso, e se dedicam – em sua imensa maioria – exclusivamente ao jogo. Ou você acredita que alguém que apita 2 jogos por semana, está viajando de 3 a 4 dias para chegar ao local do jogo, consegue ter outro emprego?

Olhem os bons exemplos

Em países como Inglaterra, Espanha, a relação é outra. O árbitro tem salário e uma remuneração a mais por jogo trabalhado. É possível. E seria mais justo.

A remuneração e a dedicação exclusiva seriam importantes para a atividade, e são reivindicações antigas dos profissionais do apito.

A profissionalização não elimina erros, mas os diminui. Diminui porque traz com ela uma preparação mais adequada, um compromisso maior. E também deixa mais legítima qualquer reclamação por erro.

A arbitragem no Brasil precisa ser repensada. Ela tem que ser discutida e debatida por todos os operadores do esporte. Legisladores, associações esportivas e árbitros, claro. São muitos os problemas.

A crise do coronavírus colocou o mundo do futebol em alerta, e no Brasil a categoria dos árbitros é das mais atingidas. Eles simplesmente pararam de receber. Estão em casa, sem dinheiro e sem direitos assegurados.

Nossa legislação precisa mudar!

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