Dono da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do Botafogo, John Textor não poupou críticas sobre a lei que regulamentou o clube-empresa no Brasil (Lei 14.193/2021). Durante uma live no site FogãoNET, o empresário criticou as recentes decisões da Justiça sobre o entendimento do texto da legislação. O Lei em Campo repercutiu com especialistas as declarações do mandatário. Afinal, a reclamação coloca em xeque a Lei da SAF?
“Particularmente entendo que as declarações do dirigente não refletem a realidade em relação a Lei da SAF, que tem trazido bons resultados em relação a gestão nos clubes de futebol e na forma profissional com a qual o futebol passou a ser tratado. A interpretação da lei pelos tribunais ainda está em evolução e vem amadurecendo. No tocante a alegação de que entidades ‘furaram a fila’ do RCE (Regime Centralizado de Execuções), trata-se de uma acusação grave e a princípio leviana, pois não trouxe nenhum argumento ou indício para comprovar o que foi dito e mereceria até uma interpelação judicial para que houvesse esclarecimento para o público. O investidor estrangeiro tem que ter segurança para investir – o que a lei assegura – mas não pode pensar que terá um salvo conduto para fazer o bem entender. A declaração soa mais como uma justificativa antecipada para eventual fracasso de gestão”, avalia Maurício Corrêa da Veiga, advogado especialista em direito desportivo.
O Lei em Campo conversou com o relator da Lei 14.193/2021, o senador Carlos Portinho (PL-RJ). Ele ressalta que a Lei da SAF é uma mudança cultural, sendo necessário paciência.
“Toda lei nova está sujeita a ser desafiada. É preciso que haja uma compreensão. A SAF antes de ser uma transformação econômica é uma mudança cultural, então é preciso ter paciência. Os credores, investidores e a justiça do trabalho precisam entender isso. Os tribunais precisam compreender que os clubes precisam ter fluxo de caixa enquanto os investidores precisam entender que precisam pagar as suas dívidas. A gente sempre desejou isso no futebol brasileiro: responsabilidade de gestão e pagamento de seus compromissos”, afirma.
Durante a live, Textor afirmou que a Lei da SAF não funciona.
“A Lei da SAF está quebrada. Ela não funciona. Começamos a controlar o clube no dia 11 de março, e desde o começo sentimos que os juízes e as cortes brasileiras não tiveram cuidado em interpretar a lei como ela foi criada”, declarou.
“A Lei da SAF deveria nos ajudar, mas ela está quebrada, não funciona. É a primeira vez que falo isso aqui. Não estamos prontos para aportar no futuro porque os fantasmas do passado continuam interferindo”, acrescentou.
Um dos dispositivos previstos na Lei da SAF é a criação do RCE, que permite renegociar dívidas trabalhistas e cíveis em um único juízo, ou seja, seguindo uma lista dos credores. O regime possibilita o fim de bloqueios e execuções, comuns em muitos clubes do futebol brasileiro por conta de dívidas. O prazo para pagamento é válido por seis anos, mas pode ser ampliado para mais quatro, caso já tenha pagado pelo menos 60% da dívida total. O RCE determina que 20% da receita do clube-empresa e 50% dos lucros e dividendos, caso tenha, devem ser destinados ao clube (associação) para pagar as dívidas.
O principal questionamento de Textor é que essa lista de pagamento aos credores não está sendo respeitada em recentes decisões da Justiça e a SAF do Botafogo tem pagado mais dívidas do que o previsto na lei, atrapalhando as operações do futebol.
“Ganhamos R$ 3,5 milhões do prêmio da Copa do Brasil e a CBF pegou o dinheiro porque o clube social (associação) tinha uma dívida histórica com eles. Fizemos ofícios à CBF e nunca tivemos uma resposta”, contou Textor.
“O contrato da TV vem de meses em meses, e não mensalmente. Em junho, estávamos gastando dinheiro investindo em jogadores, contando com o dinheiro da Globo, e esse dinheiro não veio. Aparentemente, dois presidentes do clube social antes do Durcesio (presidente do Botafogo) assinaram um documento dando o contrato da Globo como garantia de uma dívida fiscal com o Governo. Essa mesma dívida estava renegociada com o Governo, sendo paga em dia. Porém, um procurador federal resolveu resgatar aquele antigo contrato e falar que o dinheiro era dele. Era muito dinheiro. O contrato da TV é a maior receita da SAF e foi tomado sem mais nem menos”, criticou o empresário.
Textor disse ainda que vai buscar uma solução alternativa, afirmando que Botafogo não vai repassar os 20% das receitas até que a lei seja melhor definida e respeitada.
Caso decida deixar o RCE, o Botafogo SAF não terá mais benefícios como descontos e prazos maiores para o pagamento de dívidas. Além disso, estará sujeito a bloqueios e execuções. Como dito acima pelos especialistas, outra alternativa de renegociação de dívida é a recuperação judicial e extrajudicial.
Por fim, o senador Carlos Portinho explica que a Lei da SAF não criou o RCE, mas que apenas uniformizou esse modelo de renegociação de dívida. Ele cita que caso a legislação continue sendo desrespeitada por investidores e credores, a tendência é de que os clubes encontrem a recuperação judicial como alternativa.
“A Lei da SAF não criou o RCE, apenas uniformizou. Sempre que o RCE não atender seu objetivo, seja por indisciplina, má gestão ou dificuldade de pagamento, estará disponível alternativas, como a recuperação judicial. A diferença é que na recuperação judicial a negociação com os credores é feita de forma coletiva. Se os investidores burlarem a lei em suas obrigações, assim como os credores não respeitarem a lei, querendo atalhos para ver seus créditos, eles vão acabar empurrando os clubes para a recuperação judicial. O Flamengo é um exemplo emblemático. Mesmo como associação, o clube imprimiu uma gestão e quitou sua dívida milionária em poucos anos. Portanto, mais do que nunca, é necessário mudar a cultura”, finaliza.
Crédito imagem: Botafogo/Divulgação
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