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Decreto-lei n° 3.199/1941 – não havia vida esportiva fora do controle do Estado

Falei na coluna passada acerca da forma como o Estado passou a controlar a organização esportiva nacional, não somente substituindo o comitê olímpico nacional como o ápice da pirâmide olímpica como decretando que a Confederação Brasileira de Desportos (CBD) passaria a ser a representante oficial do futebol.

Tratou-se da apropriação da organização autônoma do esporte no país e, como venho dizendo, da ascensão do grupo getulista/botafoguense ao topo do poder esportivo nacional. O nome do protegido do Regime era Luiz Aranha. Seu irmão Oswaldo Aranha, então ministro das Relações Exteriores, é justamente um dos signatários do Decreto-lei n° 3.199, de 1941, que devolveu a relevância da CBD no futebol. A entidade era justamente presidida por Luiz Aranha naquele momento.

Se pesquisarmos o verbete Luiz Aranha ou Lulu Aranha (como também era chamado) no arquivo FGV CPDOC, entenderemos a importância do então presidente da CBD para o Movimento Getulista:

“Segundo João Neves da Fontoura, Luís Aranha foi um dos conspiradores mais lúcidos da articulação da Revolução de 1930, cabendo-lhe grande parte do êxito do movimento.

[…]

Na tarde de 3 de outubro de 1930, eclodiu em Porto Alegre o movimento revolucionário. A tomada do quartel-general do Exército ficou a cargo da Guarda Civil estadual, acrescida de algumas pessoas, entre as quais Luís Aranha e seus irmãos Ciro e Euclides. Apesar da surpresa do ataque, os poucos elementos que se encontravam no quartel ofereceram forte resistência durante quase uma hora, após o que o prédio foi ocupado pelos revolucionários.

Assim que se consolidou a situação militar no Rio Grande do Sul, as forças rebeldes iniciaram sua marcha para o norte e, em poucos dias, atingiram os arredores de São Paulo. Em 12 de outubro, Getúlio Vargas, assumindo o comando da revolução, decidiu partir de Porto Alegre rumo ao Distrito Federal. Além de seu estado-maior, seguiu com ele toda uma comitiva, da qual também fazia parte Luís Aranha.”

Uma pessoa tão leal a Getúlio Vargas na Revolução de 1930 e que vinha exercendo funções relevantes na administração federal e na vida partidária não seria deixada de lado quando de seus apuros na Cisão Esportiva.

Assim, também por isso, a intervenção do Estado Novo nos esportes foi contundente, total.

Além de ter ocupado o topo da Pirâmide Olímpica no Brasil, o Governo Federal criou uma centralização completa do sistema esportivo nacional a partir deste Decreto-lei.

Seu art. 46 previa competência exclusiva da União para matéria esportiva. Isso importava em que Estados, DF e municípios se submetiam à União em toda a regulação esportiva. Hoje, a Constituição de 1988 dispõe que a matéria é de competência legislativa concorrente entre os membros da federação.

Do mesmo modo, as entidades esportivas se curvavam ao Poder Executivo federal. Como mostrei na coluna anterior, a CBD e as demais confederações se vinculavam ao Conselho Nacional de Desportos (CND) (art. 9º), que tinha todos seus membros nomeados pelo presidente da República (art. 2º). Até mesmo os estatutos das confederações eram aprovados pelo CND, que também decidia pela possibilidade de suas alterações (art. 17, parágrafo único).

As confederações (filiadas ao CND) vinculavam as federações regionais (estaduais), art. 18. Também estas deveriam submeter seus estatutos ao CND (art. 23). Nos municípios estavam os clubes e ligas, que viam seus estatutos serem controlados pelas federações (arts. 24 e 26).

Por fim, fechando a cadeia de controles, cabia ao governo federal por meio do CND decidir sobre a possibilidade de participação de delegações esportivas nacionais (seleções) em competições internacionais (art. 3º, “c”) e quais as confederações, federações, ligas e clubes poderiam receber auxílio financeiro estatal (subvenções), art. 38, e isenções tributárias (arts. 40 a 42).

E, para também poder dominar completamente o setor, a prática esportiva profissional era estritamente controlada pelo CND:

“Art. 36. Não poderão promover exibições públicas de qualquer modo remuneradas, as entidades desportivas que não sejam direta ou indiretamente vinculadas ao Conselho Nacional de Desportos.”

Quando o art. 36 acima transcrito dizia que somente as entidades vinculadas ao CND poderiam promover partidas esportivas remuneradas, leia-se que ninguém, além das organizações chanceladas pelo Estado Novo, poderiam cobrar ingressos ou assalariar atletas.

Até mesmo os delegados do Comitê Olímpico Internacional (COI) se vinculavam ao sistema esportivo estatizado no Brasil quanto aos assuntos internos, como se vê no art. 4º da primeira Lei Geral do Esporte do país (Decreto-lei n° 3.199, de 1941).

Não havia vida esportiva fora do controle do Estado.

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