Pesquisar
Close this search box.

Deixe-a correr!

O mês de setembro de 2020 marca mais uma derrota para a medalhista olímpica Caster Semenya, em sua luta em prol da mudança das regras impostas pela Federação Internacional de Atletismo (antiga IAAF, atual World Athletics) a atletas do sexo feminino.

Após ter levado seu apelo à Federação Internacional e ao Tribunal Arbitral de Esporte, a atleta sul-africana apresentou um novo pleito, agora à Suprema Corte Suíça, mas novamente teve seu pedido negado, portanto mantida a regra que a torna inelegível para qualquer prova regulada pela Federação de até 1500 metros, inclusive nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020.

O objetivo da atleta é apenas competir em provas femininas, em sua condição física natural, sem se submeter a uma cirurgia corretiva ou ao uso de medicamentos que regulem os níveis de testosterona, como hoje impõe a Federação.

É que desde 2018, a entidade que rege o atletismo mundial vem impondo às atletas do sexo feminino uma regra de elegibilidade impossível de ser superada por corpos como o da atleta Caster Semenya e de tantas outras que sofrem das chamadas “diferenças no desenvolvimento sexual” (DSDs) e produzem, naturalmente, níveis de testosterona acima dos considerados regulares, segundo as regras vigentes.

Assim como Caster, as atletas Francine Niynsaba, Margaret Wambui, Dutee Chand, Shanthi Soundarajn, encontram-se igualmente inelegíveis para as provas que as consagraram e para o esporte que possivelmente as ajudou a aceitar e a entender as potencialidades de seus organismos desde sempre diferenciados.

Para competir em provas em que a explosão muscular da competidora seja determinante para o resultado, essas atletas precisariam, segundo as regras da Federação, ofender suas condições naturais e nivelar seus níveis de testosterona através de medicação ou cirurgia. Uma espécie de dopagem, mas permitida e recomendada que as torne tão mulheres quanto as demais. Tudo em nome da igualdade entre as participantes.

A regra, mantida em nome da paridade de armas entre adversárias, ofende claramente os Direitos Humanos, o que é uma contradição em termos. Afinal, não deveria haver conflito possível entre as normas da Lex Sportiva e as de Direitos Humanos, pois estes últimos são parte essencial do sistema esportivo.

Nunca é tarde para lembrar que Direitos humanos são os direitos básicos de todos os seres humanos, tais como, o direito à vida, à saúde, à liberdade e à educação. E vale lembrar ainda que a reivindicação de Direitos Humanos especificamente aplicados às mulheres, só faz sentido porque até bem pouco tempo não éramos consideradas nem mesmo humanas, mas sim, mães, filhas ou esposas de humanos.

A prevalecer a regra da Federação Internacional, analisadas e examinadas através de exames invasivos e em um ambiente masculino, essas atletas, cujos organismos nasceram preparados para a explosão muscular, seguem sendo medidas e, se obtidos resultados não aceitáveis, precisarão descer seus níveis hormonais a uma concentração que as tornem aptas para então participar das provas de suas preferências e nas quais progrediram, mesmo que seu direito à saúde e sua liberdade de escolha estejam sendo afrontados.

As histórias e lutas dessas atletas motivaram a criação do movimento “Let her run” (“Deixe-a correr”, em tradução livre), que é uma espécie de convite para que as pessoas enviem mensagens via Twitter à Federação Internacional para informar que o atletismo já é um esporte muito difícil para as meninas e que a parte mais difícil segue sendo ter que responder se você é mulher o suficiente.

Vale lembrar que sexo se refere à biologia, enquanto gênero se refere ao seu papel social a sua autoidentificação. No esporte, a definição de masculino e feminino costumava ser baseada apenas no sexo, ou seja, na biologia. Até que, finalmente, testes anatômicos deram lugar aos testes biológicos após o que, finalmente, a determinação através do sexo foi abandonada na década de 90, dando lugar a de gênero. A partir dos Jogos Olímpicos de Sydney 2000, não houve mais testes de gênero, apenas a autoidentificação.

O gênero do Caster Semenya é inegavelmente feminino. Ela é legalmente uma mulher, assim foi criada desde o seu nascimento e assim ela se identifica, como mulher. Portanto, na definição atual, Semenya é uma mulher. Na verdade, nunca houve dúvida quanto ao seu gênero. Por que impedi-la de, por meio do esporte, desenvolver toda a sua potencialidade?

……….

Para saber mais:

https://letherrun.com.br/en-us/

https://globoesporte.globo.com/sportv/programas/redacao-sportv/video/jaqueline-silva-explica-proposta-do-let-her-run-contra-testes-abusivos-em-atletas-8861061.ghtml

Compartilhe

Você pode gostar

Assine nossa newsletter

Toda sexta você receberá no seu e-mail os destaques da semana e as novidades do mundo do direito esportivo.