Por Ana Camila Barbosa Freire[1]
A frase de Nelson Mandela “o esporte tem o poder de mudar o mundo” é primordial para mostrar a força que possui para unir pessoas e comunidades além de encontrar pontos em comum, principalmente em época de campeonatos, vale citar, a exemplo da paixão nacional, a Copa do Mundo onde a nação inteira se reúne para vibrar, torcer e acompanhar os jogos.
De mais a mais, vale destacar a essencialidade do esporte o qual é um direito constitucional estabelecido na Carta Magna que trata sobre a educação, cultura e o desporto, previstos no artigo 217 da Constituição Federal[2].
Inexorável que é um direito tutelado na Lex Magna quanto nas leis infraconstitucionais, posto que seja um direito individual de cada cidadão, o qual deverá ser protegido.
“Fenômeno sociocultural cuja prática é considerada direito de todos e que tem no jogo o seu vínculo cultural e na competição o seu elemento essencial[3].”
O esporte é algo complexo e uma ferramenta para o desenvolvimento da pessoa, seja no aspecto psicológico, físico, intelectual e moral, debruçado sobre a vertente da educação, inclusão e saúde, promovendo a paz e a dignidade humana.
Com efeito, o desporto paralímpico se pode atribuir ao médico alemão Ludwing Guttmann, neurologista, que ano de 1944, criou um centro de atendimento a pacientes que se internavam no Hospital Stoke Mandeville na cidade de Aylesbury, na Inglaterra, a pedido do governo britânico, para cuidar de lesões medulares, cujo objetivo do centro era cuidar e reabilitar os pacientes, digam-se, os soldados e civis quando retornavam da Segunda Guerra Mundial.
Considerada a situação relatada como o marco da prática esportiva de pessoas com deficiência, isto porque o Ludwing Guttmann introduziu como formas de tratamentos atividades esportivas, e ao estudá-las observou que há melhora no psicológico, inclusão social e na qualidade de vida dos pacientes, surgindo, então, a prática esportiva de pessoas com deficiência.
O reconhecimento internacional como a primeira edição dos Jogos Paralímpicos de Verão, ocorreu no ano de 1960, em Roma, com a realização dos Jogos Internacionais de Stoke Mandeville.
Já no Brasil, foram por meio de Robson Sampaio de Almeida e Sérgio Del Grande, ambos com paraplegia, que ao realizarem o processo de reabilitação nos Estados Unidos da América (EUA), fundaram no Rio de Janeiro e em São Paulo, respectivamente, em 1958, instituições pioneiras para a prática de basquetebol em cadeira de rodas, (Clube do Otimismo e o Clube dos Paraplégicos), o qual foi o marco histórico no país.
Desde então, o paradesporto tomou mais força a qual se pode citar para exemplificar, Rio de Janeiro, em 1978, que foi a sede dos Jogos Pan-Americanos em Cadeiras de Rodas, além de o Brasil participar nos anos seguintes (1980, 1984 e 1988) de Jogos Paralímpicos em outros países, e já incluindo nesse momento atleta de Para-natação, Para-atletismo, Para-tênis, Para-judô.
Por fim, é cristalino dizer que desde o início do paradesporto no Brasil, houve muita evolução e difusão entre as pessoas, surgindo diversas equipes e modalidades, e sabe-se que não estagnará, visto que é um movimento que continuará em ascensão.
Pôde-se vislumbrar tamanha ascensão nos Jogos Paralímpicos de Tóquio 2020 em que o Brasil foi reconhecido como potência paralímpica, a qual se tratou da melhor participação histórica dos Jogos Paralímpicos[4].
Embora haja reconhecimento como máquina de medalhas paralímpicas, os recursos financeiros, muitas vezes são limitados. Alguns atletas paralímpicos, vem de entidades desportivas que sobrevivem mensalmente de doações e de patrocínio. Além de treinarem em lugares precários com pouca estrutura, porém, se vê que isso não é fator limitante para alcançar o objetivo.
As leis nos trazem possibilidades de mecanismos de fomento para o desporto, além da conhecida Lei de Incentivo ao Esporte, também se tem a Certificação 18 e 18 – A, prevista na Lei 9.615/98, sendo um mecanismo para entidades desportivas, especificamente às associações sem fins lucrativos que necessitam dos incentivos garantidos por lei para que possam manter a sua missão e desenvolver os atletas, sendo ou não de alto rendimento.
A Certificação 18 e 18-A da Lei Pelé, dispõe sobre insenções e benefícios para fomentar as atividades de caráter desportivo, permitindo que recursos sejam aplicados em projetos das diversas manifestações desportivas e paradesportivas distribuídos por todo o território nacional, desde que cumpridos os requisitos exigidos em lei.
A Certidão do Registro Cadastral emitida pela Secretaria Especial do Esporte, do Ministério da Cidadania dá a entidade o direito de receber recursos da Lei de Incentivo ao Esporte para projetos de rendimento e o direito à isenção de Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica (IRPJ) e de Controbuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Para que entidades desportivas que fazem parte do Sistema Nacional do Desporto (SND), como confederações, associações, institutos e clubes, tenham isenção fiscal e o direito de receber recursos públicos para investir em seus projetos, é necessário cumprir uma série exigências previstas em lei. Após a apresentação dos documentos estabelecimentos pela Portaria nº 115/2018 e de análise do Governo Federal, a entidade passa a contar com a Certidão de Registro Cadastral.
Este documento comprova o cumprimento dos atigos 18 e 18-A da Lei nº 9.615/98. Com validade prevista de um ano, a certificação permite que sejam beneficiadas as entidades que tiverem viabilidade e autonomia financeira, transparência ativa, gestão democrática e participação de atletas, entre outros aspectos importantes de uma gestão séria e compromissada com a Governança.
Imperioso destacar que para obter recebimentos de recursos públicos por meio da Lei de Incentivo ao Esporte para projetos de rendimentos e formação, seja no paradesporto seja no desporto olímpico, é necessário que a entidade de prática de desportiva tenha a Certificação 18 e 18ª, da Lei 9.615/98[5], emitida pela Secretaria Especial de Esporte, do Ministério da Cidadania[6].
Conforme se pode constatar pelo artigo 18 e 18 – A, da Lei 9.615/98 transcrito abaixo, somente as entidades que integram o Sistema Nacional do Desporto (SND) serão beneficiadas com as isenções fiscais e repasses de recursos públicos desde que preencham os seguintes requisitos, veja:
Art. 18. Somente serão beneficiadas com isenções fiscais e repasses de recursos públicos federais da administração direta e indireta, nos termos do inciso II do art. 217 da Constituição Federal, as entidades do Sistema Nacional do Desporto que):
I – possuírem viabilidade e autonomia financeiras;
III – atendam aos demais requisitos estabelecidos em lei;
IV – estiverem em situação regular com suas obrigações fiscais e trabalhistas;
V – demonstrem compatibilidade entre as ações desenvolvidas para a melhoria das respectivas modalidades desportivas e o Plano Nacional do Desporto.
Parágrafo único. A verificação do cumprimento das exigências contidas nos incisos I a V deste artigo será de responsabilidade do Ministério do Esporte.
Art. 18-A. Sem prejuízo do disposto no art. 18, as entidades sem fins lucrativos componentes do Sistema Nacional do Desporto, referidas no parágrafo único do art. 13, somente poderão receber recursos da administração pública federal direta e indireta caso:
I – seu presidente ou dirigente máximo tenham o mandato de até 4 (quatro) anos, permitida 1 (uma) única recondução;
II – atendam às disposições previstas nas alíneas “b” a “e” do § 2o e no § 3o do art. 12 da Lei no 9.532, de 10 de dezembro de 1997;
III – destinem integralmente os resultados financeiros à manutenção e ao desenvolvimento dos seus objetivos sociais
IV – sejam transparentes na gestão, inclusive quanto aos dados econômicos e financeiros, contratos, patrocinadores, direitos de imagem, propriedade intelectual e quaisquer outros aspectos de gestão;
V – garantam a representação da categoria de atletas das respectivas modalidades no âmbito dos órgãos e conselhos técnicos incumbidos da aprovação de regulamentos das competições;
V – garantam a representação da categoria de atletas das respectivas modalidades no âmbito dos órgãos da entidade incumbidos diretamente de assuntos esportivos e dos órgãos e conselhos técnicos responsáveis pela aprovação de regulamentos das competições;
VI – assegurem a existência e a autonomia do seu conselho fiscal;
VII – estabeleçam em seus estatutos:
a) princípios definidores de gestão democrática;
b) instrumentos de controle social;
c) transparência da gestão da movimentação de recursos; (Incluído pela Lei nº 12.868, de 2013)
d) fiscalização interna;
d) mecanismos de controle interno;
e) alternância no exercício dos cargos de direção; (Incluído pela Lei nº 12.868, de 2013)
f) aprovação das prestações de contas anuais por conselho de direção, precedida por parecer do conselho fiscal; e
g) participação de atletas nos colegiados de direção e na eleição para os cargos da entidade; e
h) colégio eleitoral constituído de todos os filiados no gozo de seus direitos, observado que a categoria de atleta deverá possuir o equivalente a, no mínimo, 1/3 (um terço) dos votos, já computada a eventual diferenciação de valor de que trata o inciso I do caput do art. 22 desta Lei;
h) colégio eleitoral constituído de representantes de todos os filiados no gozo de seus direitos, observado que a categoria de atleta deverá possuir o equivalente a, no mínimo, 1/3 (um terço) do valor total dos votos, já computada a eventual diferenciação de valor de que trata o inciso I do caputdo art. 22 desta Lei;
i) possibilidade de apresentação de candidatura ao cargo de presidente ou dirigente máximo da entidade com exigência de apoiamento limitada a, no máximo, 5% (cinco por cento) do colégio eleitoral;
j) publicação prévia do calendário de reuniões da assembleia geral e posterior publicação sequencial das atas das reuniões realizadas durante o ano; e
k) participação de atletas nos colegiados de direção e no colégio eleitoral por meio de representantes de atletas eleitos diretamente e de forma independente pelos atletas filiados da entidade; e
k) participação de atletas nos colegiados de direção e no colégio eleitoral por meio de representantes de atletas eleitos diretamente e de forma independente pelos atletas filiados da entidade, assegurado, ao menos, 1/5 (um quinto) de representação de cada sexo;
VIII – garantam a todos os associados e filiados acesso irrestrito aos documentos e informações relativos à prestação de contas, bem como àqueles relacionados à gestão da respectiva entidade de administração do desporto, os quais deverão ser publicados na íntegra no sítio eletrônico desta.
IX – deem publicidade em sítio eletrônico da entidade aos recursos recebidos mediante convênio ou transferidos em virtude desta Lei, à sua destinação e às prestações de contas apresentadas;
X – submetam seus demonstrativos anuais a auditoria independente quando auferirem, em cada ano-calendário, receita bruta superior à definida para a empresa de pequeno porte, nos termos do inciso II do caput do art. 3º da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.
Preenchidos os requisitos previstos em Lei e aprovado após a verificação da Secretaria Especial de Esporte, a entidade desportiva será certificada pelo artigo 18 e 18-A, podendo usufruir de seus benefícios, contudo, vale mencionar que tal certificação tem validade de 01 (um) ano, sendo necessária a renovação anual.
Mais do que um instrumento jurídico, trata-se de uma inovação e um avanço na consolidação do paradigma do esporte como um meio de inclusão social.
Em suma, o Decreto nº 6.180/07 regulamenta a Lei no 11.438, de 29 de dezembro de 2006, Lei de Incentivo ao Esporte, que trata dos incentivos e benefícios para fomentar as atividades de caráter desportivo, considerando que projeto desportivo é o conjunto de ações organizadas e sistematizadas por entidades de natureza esportiva, destinado à implementação, à prática, ao ensino, ao estudo, à pesquisa e ao desenvolvimento do desporto[7], observando pelo menos uma das manifestações do desporto (educacional, participação, rendimento ou de formação) e entidade de natureza esportiva é toda pessoa jurídica de direito público, ou de direito privado com fins não econômicos, cujo ato constitutivo disponha expressamente sobre sua finalidade esportiva[8]. Ainda, a Portaria nº 424, publicada em 22 de junho de 2020, dispõe sobre o procedimento dos projetos desportivos ou paradesportivos, e que com a Certificação 18 e 18-A, poderá captar recursos e executar projetos de alto rendimento.
Para garantir e fomentar o desporto paralímpico além das Leis também se tem princípios elencados no artigo 217 da Constituição Federal, destacando, o da proteção e incentivo ao desporto de criação nacional, disposto no inciso IV que se refere à “proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional”, que pode ser dividida em dois aspectos, sendo o primeiro concernente a proteção daquelas geradas no Brasil, com cunho educacional, cultural e social. Já o segundo é sobre o incentivo, que originou a Lei de Incentivo ao Esporte, com o fito de criar mecanismos realistas, a qual também se pode incluir a Certificação 18 e 18-A para superar as dificuldades financeiras que tolhem o desenvolvimento do desporto nacional.
De mais a mais, resta evidente que os mecanismos dos incentivos fiscais direcionados ao desporto servem como investimento social tendo em vista a contribuição significativa na inclusão e inserção social além de no âmbito econômico geram remuneração não só para quem está efetivamente vinculado à indústria do desporto bem como o aumento das exportações deste setor.
Destarte, o desporto não pode parar tendo em vista a sua importância na vida de atletas e de todos que acompanham o trabalho das entidades desportivas.
Por fim, com base no explanado, conclui-se que o Estado tem o dever protetivo do desporto, incentivando e um do mecanismo para o fomento para torná-lo mais difundido e sedimento além da inclusão social, é a Certificação 18 e 18-A que com esta, poderá captar recursos mediante aprovação de projetos submetidos por meio da Lei de Incentivo ao Esporte.
Crédito imagem: CPB
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Referências Gerais:
FACHADA, Rafael Terreiro. Direito desportivo: uma disciplina autônoma / Rafael Terreiro Fachada. – 1. Ed. – – Rio de Janeiro : Autografia, 2017, p.34.
FILHO, Álvaro Melo. Revista Brasileira de Direito Desportivo: edição especial. Homenagem ao Professor Álvaro Melo Filho, ano XVII – nº 30/2018, p. 374-394.
RENAUD, Michel. Ética e valores no desporto. Porto: Edições Afrontamento, 2014. P: 13/14.
TUBINO, Manoel J.G.; Tubino, Fábio M; GARRIDO, Fernando A.C.. Dicionário Enciclopédico Tubino do Esporte. Rio de Janeiro: Editora Senac Rio, 2007. P: 37.
Ibirarema: Comitê Paralímpico Brasileiro. Movimento Paralímpico. Disponível em <https://www.cpb.org.br/> Acesso em 02 abril 2022.
Ibirarema: Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em: 15 setembro 2021.
Ibirarema: LEI, 9615. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/19615consol.htm> Acesso em: 06 setembro 2021.
Ibirarema: LEI, 13146. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm> Acesso em: 15 setembro 2021.
Ibirarema: A Melhor Campanha de Todos os Tempos Brasil Termina os Jogos Paralímpicos de Tóquio com Recorde de Ouros e Feitos Inéditos. Disponível em <https://www.cpb.org.br/noticia/detalhe/3570/a-melhor-campanha-de-todos-os-tempos-brasil-termina-os-jogos-paralimpicos-de-toquio-com-recorde-de-ouros-e-feitos-ineditos.> 10 de setembro de 2021.
[1] Advogada especialista em Negócios no Esporte e Direito Desportivo no Gonçales Galhardo Advogados. Presidente da Comissão de Direito Desportivo da Subseção OAB/Palmital. Vice-Presidente na Associação Mariliense de Esportes Inclusivos (AMEI). Auditora da 1ª Comissão Disciplinar do Tribunal de Justiça Desportiva de Basquete do Estado do Rio de Janeiro. Auditora Suplente da 1ª Comissão Disciplinar do Superior Tribunal de Justiça da Liga Nacional de Futsal. Auditora da Comissão Disciplinar do Tribunal de Justiça Desportiva da Federação Paulista de Volleyball. Membro de Grupo de Estudos no Instituto Brasileiro de Direito Desportivo – IBDD.
[2] Art. 217. É dever do Estado (fomentar práticas desportivas) formais e não-formais, como direito de cada um, observados: I – a autonomia das (entidades desportivas) dirigentes e (associações), quanto a sua organização e funcionamento; II – a (destinação de recursos públicos) para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento; III – o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não- profissional; IV – a (proteção) e o (incentivo às manifestações desportivas) de criação nacional. § 1º O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei. § 2º A justiça desportiva terá o prazo máximo de sessenta dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final. § 3º O Poder Público (incentivará) o lazer, como forma de (promoção social).
[3] TUBINO. Manoel J.G.; Tubino, Fábio M; GARRIDO, Fernando A.C.. Dicionário Enciclopédico Tubino do Esporte. Rio de Janeiro: Editora Senac Rio, 2007. P: 37.
[4] Disponível em https://www.cpb.org.br/noticia/detalhe/3570/a-melhor-campanha-de-todos-os-tempos-brasil-termina-os-jogos-paralimpicos-de-toquio-com-recorde-de-ouros-e-feitos-ineditos.
[6] http://arquivo.esporte.gov.br/index.php/institucional/certificacoes-18-e-18-a.
[7] Art. 3º, inciso I, do Decreto 6.180/07.
[8] Art. 3º, inciso II, do Decreto 6.80/07.