Fazer o certo é sempre uma escolha. Teria que ser um dever moral de todo dirigente do esporte, mas a história recente tem mostrado que passou a ser também uma obrigação legal (ainda bem).
Ex-craque dos gramados, o francês Michel Platini foi detido na manhã desta terça em Paris pelas autoridades e levado para o gabinete anticorrupção da Polícia Judiciária francesa. A prisão vem na esteira das denúncias de corrupção na atribuição da organização da Copa do Mundo de 2022 ao Qatar.
O Qatar foi nomeado país sede do Mundial 2022 em dezembro de 2010, ano em que Platini ainda exercia funções como presidente da União das Associações Europeias de Futebol (UEFA). Em 2015, o futebol foi desmoralizado com o maior escândalo da história do esporte. Um tsunami investigativo e jurídico que derrubou a mais alta cúpula do futebol mundial e desencadeou uma série de mudanças no esporte. Muitas, importante frisar, ainda caminham a passos lentos.
No dia 27 de maio de 2015, o FBI, com a chancela do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, comandou uma operação-surpresa num hotel luxuoso de Zurique, Suíça. Lá estavam os principais dirigentes da FIFA. Catorze deles foram presos, entres eles José Maria Marin, ex-presidente da Confederação Brasileira de Futebol.
Os dirigentes eram acusados de corrupção, por meio de fraude e lavagem de dinheiro em acordos de marketing e direitos televisivos de transmissão, passando também pela decisão das sedes da Copa do Mundo.
O suborno ultrapassou os US$ 100 milhões, e a primeira medida tomada pelo FBI foi extraditar os detidos para os Estados Unidos.
Cinco meses depois da prisão na Suíça, o Comitê de Ética da FIFA (que tem independência estatutária da entidade) afastou, entre outros, o então presidente Joseph Blatter. Dois meses depois, Blatter e Michel Platini, preso nesta terça, foram considerados culpados por gestão desleal e conflitos de interesse e afastados do esporte por oito anos.
Gianni Infantino assumiu a FIFA prometendo transparência e um novo modelo de gestão. Mas a prática ainda não caminha ao lado do discurso. Em novembro de 2018, um juiz do Comitê de Ética da FIFA foi preso na Malásia acusado de usar o cargo para faturar com benefícios pessoais. O caso aconteceu poucos meses depois de o Conselho da FIFA ratificar, em julho de 2018, o novo Código de Ética. Nele a palavra “corrupção” simplesmente sumiu. Logo ela, que havia sido decisiva no combate ao maior escândalo da história do esporte.
Mesmo assim, discursos por transparência e ética têm sido mais frequentes na cúpula do futebol mundial e por aqui. Já falamos sobre o que disse o novo presidente da CBF, Rogério Caboclo. Mas do que se diz para o que se faz, sempre existem muitas histórias.
Investir em planos de integridade, com conselhos independentes e órgãos fiscalizadores autônomos, seria mais do que discurso, seria uma verdadeira atitude comprometida com ética e transparência.
Existe um projeto de lei que tramita do Senado, o PL 68, que tem relatoria do professor de direito e colunista do Lei em Campo Wladimyr Camargos, que seria revolucionário para a gestão esportiva no Brasil. Entre outras coisas, ele tipifica o crime de corrupção privada no Brasil. Roubou de clube ou entidade esportiva, vai preso.
E por que você não faz a sua parte? Pressione o Congresso, faça com que esse PL seja analisado e aprovado. Ele traria uma revolução na gestão esportiva.
Ou seja, chega de desculpas!
Caminhos existem, na esfera esportiva e estatal: planos de integridade e PL 68. Com eles, ser transparente e ético deixa de ser apenas uma necessidade moral de nossos dirigentes – passa a ser também uma obrigação legal.