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Direito de imagem não gera tributo sobre serviços

O direito de imagem corresponde direito personalíssimo que, nos termos do ar. 87-A da Lei Pelé pode ser licenciado pelo jogador (ou a empresa que o detém) para a entidade desportiva (clube de futebol), por meio de valores e regras livremente estipulados.

O presente texto trata, no cerne, de análise da incidência de ISSQN (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza) no pagamento de direito de imagem dos atletas.

Dispõe o art. 1º da lei de regência nacional do ISS:

“Art. 1º O imposto sobre serviços de qualquer natureza, de competência dos municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.”

Cumpre examinar antes de mais nada os três tipos de fato gerador existentes para a perfeita compreensão da matéria objeto deste estudo.

Na seara do ISS existem serviços que se iniciam e terminam em um único momento, caracterizando fato gerador instantâneo.

É o caso, dentre outros, dos serviços previstos no item 6.01 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/03 (barbaria, cabeleireiros, manicuros, pedicuros e congêneres). Existem outros serviços, cuja execução se estende por um tempo mais prolongado. Correspondem ao denominado fato gerador continuado. São exemplos, dentre outros, aqueles previstos nos itens 7.01 (engenharia, agronomia, agrimensura, arquitetura, geologia, urbanismo, paisagismo e congêneres) e 8.01 (ensino regular pré-escolar, fundamental, médio e superior).

Finalmente, tem-se o chamado fato gerador complexo ou complexivo em que diversos atos e fatos interligados envolvem a prestação de serviço.

São os casos, por exemplo, dos serviços previstos no item 22.01 da lista de serviços (serviços de exploração de rodovia mediante cobrança de preço ou pedágio dos usuários, envolvendo execução de serviços de conservação, manutenção, melhoramentos para adequação de capacidade e segurança de trânsito, operação, monitoramento, assistência aos usuários e outros serviços definidos em contratos, atos de concessão ou de permissão ou em normas oficiais).

A execução desses serviços ou obras não podem ser objetos de tributação em separado ainda que tenham enquadramento em outros itens de serviços, exatamente por ser tratar de fato gerador complexo não passível de cisão.

Outro importante aspecto a considerar diz respeito à distinção entre serviços tributáveis e serviços tributados.

A expressão “serviços de qualquer natureza” consignada no texto constitucional para definição de competência impositiva municipal não se confunde com “qualquer serviço”, como sustentavam os defensores da tese da exemplificatividade da lista de serviços.

Outrossim, é importante no exame do fato gerador do ISS não confundir a expressão “serviços de qualquer natureza, ” que costumava ser invocada pelos defensores da tese da exemplificatividade da lista, com a expressão “qualquer serviço”.

Só é relevante para o ISS o “serviço definido em lei complementar, ” como consta da dicção constitucional.

Disso resulta que o legislador municipal só pode tributar os serviços especificados na lista anexa à LC nº 116/03, salvo naquelas hipóteses onde constam a expressão “congêneres”, quando o legislador local está autorizado a explicitar outros serviços similares ou análogos. Na prática, a legislação municipal limita-se a reproduzir a expressão “congêneres” afrontando o princípio constitucional da legalidade estrita.

Por fim, o serviço tributável pelo ISS há de ter natureza mercantil. O conceito dado pelo direito civil é vinculante dentro do Direito Tributário (art. 110 do CTN).

Serviço significa um bem econômico imaterial, fruto de esforço humano aplicado à produção. “É produto da atividade humana destinado à satisfação de uma necessidade (transporte, espetáculo, consulta médica), mas que não se apresenta sob forma de bem material (Cf. Grande Enciclopédia Delta Larousse. Rio de Janeiro: Editora Delta S. A, 1970, vocábulo serviço).

Prestar serviço significa servir, isto é, ato ou efeito de servir. É o mesmo que prestar trabalho ou atividade a terceiro, mediante remuneração. O ISS recai sobre circulação de bem imaterial (serviço). Resulta da obrigação de fazer, em contraposição ao ICMS que recai sobre a circulação de bem material e resulta da obrigação de dar, algo já feito.

Em síntese, o legislador ordinário não pode incluir na lista de serviços uma atividade que não configura um esforço humano aplicado à produção.

Não pode ser considerado serviço aquilo que contraria as balizas constitucionais e legais, conferindo-lhe natureza de serviço onde não há qualquer esforço humano aplicado à produção, como no caso, por exemplo, de locação de bem móvel considerado inconstitucional pelo STF, hoje, objeto da Súmula vinculante nº 31.

Alguns autores, com suposto amparo na doutrina de Bernardo Ribeiro de Moraes, indiscutivelmente, grande mestre do imposto municipal sob comento, afirmam que o ISS incide sobre o “serviço de qualquer natureza” e não sobre a prestação desse serviço. Ora, isso é confundir o objeto do imposto que é, de fato, o “serviço, ” um elemento extrajurídico e econômico, com o fato gerador do ISS, que é um elemento jurídico, deflagrador de efeito jurídico.

Bernardo Ribeiro de Moraes examinando o objeto do ISS afirma:

“De acordo com seu objeto, o ISS se apresenta como um imposto que grava os ‘serviços de qualquer natureza’, conforme discriminação constitucional de renda tributárias (Emenda Constitucional n. 1, de 1969, art. 24, n. II). Devemos observar que o ISS não recai sobre a prestação de serviços, mas, sim, sobre serviços de qualquer natureza. A norma constitucional outorgou aos municípios competência para onerar o serviço.”

Porém, mais adiante, referindo-se ao fato gerador do ISS assevera:

“Já dissemos que o ISS o que se grava “é a efetiva prestação de serviços”, a venda efetiva de um bem imaterial.

Embora as legislações dos municípios, via de regra, não tenham se utilizado da expressão “efetiva prestação de serviço”, mas apenas “prestação de serviço”, para o conceito de incidência do ISS, o elemento efetiva prestação não pode ser dispensado. Quem ler “prestação de serviço” na legislação municipal, deve entender atividade efetiva de prestação de serviço.”

Nem poderia ser de outra forma, pois quando a norma definidora do fato gerador refere-se à “prestação de serviços constantes da lista” está expressando a ideia de real execução de um determinado serviço incluído na lista. Por isso, a jurisprudência tem exigido a presença de efetiva atividade não bastando o lançamento do ISS referir-se a estabelecimento ou profissional autônomo que presta serviço de qualquer natureza, sem especificar o serviço prestado.

A cessão de direito de uso de marcas e de sinais de propaganda está prevista no item 3.02 da referida Lista Anexa, in verbis:

3.02 – Cessão de direito de uso de marcas e de sinais de propaganda.

O objeto, então, é verificar a possibilidade de incidência do ISS sobre as atividades de cessão de uso da imagem de atleta.

Nessa linha, mostra-se pertinente colacionar a lição de Hugo de Brito Machado acerca do item 3.02 da Lista Anexa:

O subitem 3.02 contempla a cessão do direito de uso de marcas e de sinais de propaganda, que não envolve, está claro, prestações de fazer, mas simplesmente o consentimento no uso de bens imateriais, posto que essa é a natureza jurídica das marcas e dos sinais de propaganda.

Com efeito, os contratos de cessão de direitos de imagem são considerados pela doutrina como espécie de locação de coisa móvel, configurando-se em nítida obrigação de dar em que uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição.

Assim, tendo em vista a ausência de prestação de serviço que implique em uma obrigação de fazer, não há fato gerador capaz de autorizar a cobrança do tributo.

Nesse sentido, é a jurisprudência do TJRS:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. ISS. CESSÃO DE DIREITOS DE IMAGEM. ITEM 3.02 DA LISTA ANEXA À LEI COMPLEMENTAR Nº. 116/03. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR ESTA CORTE. NÃO INCIDÊNCIA DO IMPOSTO. I) Objeto da ação que se limita à não incidência do ISS sobre as receitas obtidas em virtude da cessão do direito de uso da marca, visto que a autora concorda com a incidência do imposto sobre as demais atividades. II) Ao analisar o Incidente de Inconstitucionalidade nº. 70029311743 o Órgão Especial deste Tribunal reconheceu a inconstitucionalidade material do item 3.02 da Lista anexa à Lei Complementar 116/2003, por entender que a cessão de direitos de uso de marcas não trata de verdadeira prestação de serviços e, por isso, não pode sofrer a incidência do ISS. Assim, a sentença que reconheceu a não incidência do imposto deve ser mantida na íntegra. APELO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70079542783, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 13/12/2018).

Portanto, o pagamento de cessão de direito de imagem não constitui fato gerador do imposto.

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