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Discriminação étnica/racial de Vini Jr e possível reflexo sobre o contrato de trabalho desportivo

O leitor da coluna pode está perguntando o porquê apenas agora se opta por escrever a respeito do tema. Este assunto sempre será delicado na sociedade, uma vez que toda civilização sempre terá boa parte da população que não aceitará diferenças e tentará estigmatizar, desqualificar e isolar certos grupos de seres humanos. Isso significa que discriminação de qualquer ordem deve ser permanentemente combatida pelos órgãos públicos e todas as pessoas.

Nessa medida, apesar da importância do tema, por causar bastante polêmica, prefere-se expressar meses depois, pois conforme o descrito acima, discriminação étnica/racial deve ser enfrentada a qualquer momento e a todo instante.

Foca-se no caso Vinícius Júnior, atleta profissional, empregado do clube espanhol, Real Madrid, que vem sofrendo reiteradas discriminações étnicas/raciais por parte das torcidas do país onde trabalha. Diante do ocorrido, o jogador poderia requerer a rescisão indireta, justa causa do seu atual clube empregador e procurar a contratação com outra entidade empregadora desportiva em país diferente?

Configurada a irrefutável, reiterada e publicamente notória discriminação étnica/racial do referido atleta, não resta nenhuma dúvida, à luz do ordenamento jurídico espanhol, que ele pode requerer perante o respectivo Poder Judiciário a conhecida rosulação contratual trabalhista, equivalente à rescisão indireta (despedida indireta ou demissão por justa causa do empregador) no Brasil.

Os arts. 7, n. 5, 13, i), 16, n. 2, do Real Decreto 1006/1985 (Lei da Relação Especial Laboral dos Desportistas Profissionais) se remetendo expressamente ao arts. 4, n. 2, c), 50, n. 1, c) do Estatuto dos Trabalhadores esclarecem minuciosamente que se o jogador empregado for discriminado direta ou indiretamente no emprego por razões de origem racial ou étnica se afigura a justa causa do clube empregador, podendo o atleta mover ação trabalhista a requerer a resolução contratual, cujo os efeitos são os mesmo da despedida sem justa causa mais a possibilidade de indenização por danos extrapatrimoniais em face da discriminação sofrida.

Perceba-se que o Estatuto dos Trabalhadores da Espanha (art. 4, n. 2, c)) ao prescrever “empregado discriminado direta ou indiretamente no emprego” conota que os atos discriminatórios podem partir de pessoas do próprio ambiente de convivência do clube empregador, sua torcida, torcedores adversários ou quaisquer terceiros em relação com a entidade empregadora desportiva, sem que esta forneça qualquer amparo de prevenção, reação ou diminuição das movimentações discriminatórias.

Em outra dimensão, por mais que não se adentre em pormenores de cláusulas de indenização/compensação e elenco de fatos que se considerem justa causa para extinção do contrato de trabalho desportivo, sendo tarefa das ordens jurídicas estatais, o Regulamento de Transferência de Jogadores da FIFA, em seu art. 14 reforça a possibilidade de terminação contratual com justa causa do clube empregador ou do atleta empregado.

Nesses termos, a relação empregatícia desportiva pode ser dissolvida a requerimento do atleta empregado que sofre discriminação étnica/racial por justa causa do clube empregador que não adote qualquer medida de prevenção, combate, ou pelo menos mitigação das investidas discriminatórias de terceiros (pessoas do próprio clube, da própria torcida ou torcedores adversários).

Portanto, o jogador discriminado pode também requerer perante a Câmara de Resolução de Disputas da FIFA (DRC-FIFA) a dissolução contratual trabalhista por justa causa do clube empregador, que após concedida, cede o certificado de transferência, restando o atleta totalmente livre para contratar e jogar por outra entidade empregadora desportiva.

Diante do sistema jurídico brasileiro, da mesma forma, jogador que sofre o mesmo tipo de discriminação étnica/racial do Vinícius Júnior pode ajuizar demanda na Justiça do Trabalho pedindo a rescisão indireta do contrato especial de trabalho desportivo com os seus consectários, quais sejam: pagamento de todas as verbas rescisórias, da cláusula compensatória desportiva e indenização por danos extrapatrimoniais.

Os arts. 28, § 5o, IV, 34, II, da Lei n. 9.615/98 (Lei Pelé) não revogada, os arts. 84, IV, 90, IV, da neófita Lei n. 14.597 (Lei Geral do Esporte) se remetem explicitamente à legislação trabalhista (art. 483 da CLT e Lei n. 9.029/95), autorizando-se ao atleta a opção do pedido de rescisão indireta com o percebimento de todas as verbas rescisórias e indenização por danos morais.

Por fim, acreça-se, no pertinente à discriminação étnica/racial de jogador empregado, o art. 90, IV, da LGE, ainda que com uma redação não tão apropriada, lateral, é mais protetivo, ao determinar como uma das obrigações legais do clube empregador o dever de “proporcionar condições de trabalho dignas” a todos os profissionais esportivos que lhe prestem serviços.

Crédito imagem: Getty Images

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