O Choque-Rei da última quinta, disputado no Allianz Parque, pelas oitavas de final da Copa do Brasil, continua gerando muita polêmica. Neste sábado (16), a CBF (Confederação Brasileira de Futebol) divulgou os áudios do VAR nos lances capitais do clássico e indicou que houve um erro da equipe de arbitragem ao não traçar a linha de impedimento na jogada que resultou no pênalti em Calleri, atacante do São Paulo.
Assim que o conteúdo foi divulgado, torcedores palmeirenses questionaram sobre uma possível anulação da partida. No entanto, especialistas ouvidos pelo Lei em Campo entendem que isso não deve acontecer.
“Nesse caso, a equipe de arbitragem deixou de traçar a linha de impedimento em um lance que seria ajustado anteriormente à marcação de um pênalti, o qual deveria ser objeto de revisão obrigatória segundo o protocolo do VAR. Tais determinações fazem parte das regras do jogo, o que poderia ensejar um erro de direito. Porém, as mesmas regras aduzem que não seria possível invalidar uma partida por conta de decisão errada envolvendo o VAR, retornando à situação ao campo do erro de fato”, afirma Carlos Henrique Ramos, advogado especialista em direito desportivo.
“Entendo que houve um erro, contudo, este erro não justifica a anulação da partida, uma vez que, ao meu ver, não configura como um erro de direito, mas sim um erro de fato. Evidente que esse erro causou danos para o clube, e a arbitragem poderá ser penalizada por meio de atos da CBF (entidade organizadora)”, avalia Alberto Goldenstein, advogado especializado em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
Martinho Miranda, advogado especializado em direito desportivo, segue o mesmo entendimento. “Acho que não cabe anulação. Houve um erro de fato e não de direito. A regra do jogo foi aplicada, de forma errada, mas foi. O erro de direito ocorre quando se ‘inventa’ uma regra, o que não foi o caso. Só assim é que caberia anulação”.
Erro de direito x Erro de fato
“Erro de direito” é quando um árbitro comete intencionalmente uma irregularidade ou demonstra desconhecimento da regra. Já o “erro de fato”, diz respeito a um lance de interpretação, não havendo intenção de modificar o resultado de um jogo.
Em exemplos práticos, o erro de direito se caracteriza quando o árbitro não checa se as traves dos gols estão conformes as dimensões definidas pelas regras. Por seu turno, o erro de fato ocorre quando se aplica um cartão amarelo em situação em que, segundo as regras, regulamentos e demais normas federativas impostas, era para ser aplicado o cartão vermelho.
“Embora haja uma certa indeterminação conceitual, o erro de direito pressupõe uma errônea interpretação ou aplicação de regra aplicável ao jogo (exemplo: uma equipe de futebol que atua com 12 jogadores em campo), ao passo que o erro de fato diz respeito à interpretação equivocada do evento ou dos fatos nele ocorridos, levando a equipe de arbitragem a crer em uma realidade que não é verdadeira (exemplo: um gol em impedimento é validado)”, explica Carlos Henrique Ramos.
Quando uma partida pode ser anulada?
O Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) é bem claro quanto a isto em seu artigo 259, parágrafo 1º, quando fala que a anulação de uma partida é possível quando não se observam as regras da modalidade, ou seja, no momento em que temos um erro de direito.
Art. 259. Deixar de observar as regras da modalidade
PENA: suspensão de quinze a cento e vinte dias e, na reincidência, suspensão de sessenta a duzentos e quarenta dias, cumuladas ou não com multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 1.000,00 (mil reais).
§ 1º A partida, prova ou equivalente poderá ser anulada se ocorrer, comprovadamente, erro de direito relevante o suficiente para alterar seu resultado.
O advogado Carlos Henrique Ramos explica que “o erro de fato não permite a atuação administrativa a posteriori da Justiça Desportiva, posto estar situado dentro da falibilidade humana à qual a arbitragem está submetida, mesmo com a introdução de novos mecanismos tecnológicos, como o VAR”.
Além disso, ele ressalta que são raros os casos que a Justiça Desportiva anula uma partida.
“É preciso pontuar que a Justiça Desportiva, histórica e sabiamente, tem sido contida ao apreciar pedidos de anulação de partidas como forma de preservação do princípio da pró-competição, o qual protege o resultado validamente produzido dentro de campo. Eventual invasão no mérito das competições só deve ocorrer diante de situações extremamente graves e que estejam tipificadas nos regulamentos lato sensu”, afirma.
Árbitros retirados da rodada
Emerson de Almeida Ferreira e Marcus Vinicius Gomes, que trabalharam no Choque-Rei como árbitros de vídeo, foram retirados pela CBF da escala da 17ª rodada do Brasileirão. De acordo com a entidade, os dois “estão sob avaliação de seu desempenho técnico”.
Diante das recentes polêmicas envolvendo a linha de impedimento do VAR no futebol brasileiro, o advogado Carlos Henrique Ramos sugere que é preciso abandonar a tecnologia atual e implementar novas ferramentas.
“A meu ver, a solução está na necessidade de os clubes abandonarem essa discussão de ‘varejo’ e cobrarem da CBF a rápida introdução de mecanismos tecnológicos mais modernos, semiautomatizados e baseados em inteligência artificial, como os que serão implementados na próxima Copa do Mundo pela FIFA, que prescindem de elevada intervenção humana. Como ‘traçar a linha’ nas situações de revisão obrigatória depende de intervenção humana ‘discricionária’ do operador do VAR (que decide no ‘olho’ quando é necessário traçar a linha ou não), ficaremos estagnados no campo da falibilidade humana e do erro de fato. O caminho é abandonar a tecnologia atual, que é retrógrada”, finaliza.
Crédito imagem: Reprodução
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