Por Leandro Antonio Pamplona[1]
No início do ano algumas declarações da Ministra dos Esportes, Ana Moser, causaram grande descontentamento para aqueles que orbitam e atuam nos esportes eletrônicos. Após comparar um ciberdesportita a cantora Ivete Sangalo, que treina para dar show, mas não é uma atleta, ela foi além e deixou claro que não possui intenção em investir nessa modalidade.
Diante da repercussão negativa voltou a falar sobre o tema e na criação de “ação intersetorial” para investir nessa modalidade.
Para Ministra eSports seria entretenimento e não esporte.
Esse viés equivocado, acredita-se provém da questão semântica. A palavra esporte está ligada à atividade física. Com efeito essa ligação, salvo melhor juízo, está ultrapassada e mostra desconhecimento do cenário atual. Em 2001 o xadrez foi reconhecido pelo COI como esporte. Na mesma esteira bridge e poker são considerados “esportes da mente”.
Fundamenta sua conclusão em duas questões: a) a ONG “Atletas pelo Brasil” atuou para que o conceito de esporte, na Lei Geral do Esporte – ainda em tramitação – não fosse alargada a ponto de incluir os e-esportes e; b) o jogo eletrônico não é imprevisível.
Passamos a análise dos argumentos.
Em primeiro lugar se mostra importante a definição de esporte. Mas onde está essa definição? Para que tenhamos uma análise técnica precisamos procurar essa definição na lei.
Semanticamente a palavra esporte envolve um conteúdo de atividade física. O art. 1º da Lei Pelé destaca que o desporto abrange práticas formais e não formais. A seu turno, o art. 3º da mesma Lei deixa claro que o desporto pode ser reconhecido como educacional, de participação, de rendimento e de formação. Não há, na Lei Pelé, qualquer vedação ao equiparar os esportes eletrônicos as “esportes raiz”. Já o Projeto de Lei entende- por esporte “toda forma de atividade predominantemente física que, de modo informal ou organizado, tenha por objetivo atividades recreativas, a promoção da saúde, o alto rendimento esportivo ou o entretenimento.” Mantendo essa definição, o Projeto deixa claro que o cibersporte é sim esporte. A redação, inclusive, torna estéril qualquer discussão que pretenda distinguir desporto de entretenimento.
Em verdade, o esporte também é entretenimento! O entretenimento aqui é gênero do qual o esporte -raiz ou cibernético – é uma espécie. Logo, a ideia de que o e-sports é entreterimento e não esporte não se sustenta.
Da mesma forma, defender que esporte somente pode ser assim considerado se ligado a atividade física também é desconhecer o cenário atual. Em 2001 o xadrez foi reconhecido pelo COI como esporte. Na mesma esteira bridge e poker são considerados esportes da mente.
No que tange ao argumento de que o esporte eletrônico não é imprevisível também não pode prosperar. Uma partida de Fifa Soccer é tão imprevisível quanto uma partida real de futebol. Dois ciberatletas que se enfrentam – e competem – não conhecem o resultado da disputa. Ainda que o jogador enfrente a máquina, mesmo assim, o resultado final será incerto.
A indústria dos eSports é bilionária, lota estádios, possui diversos craques, tão conhecidos, quiçá até mais, do que os chamados desportistas raiz. Não há razão, e sequer fundamento jurídico, para a marginalização ou segmentação entre esportes eletrônicos e esportes raiz.
Em verdade, o Ministério dos Esportes precisa muito mais do apoio e da organização dos eSports que o contrário. De qualquer forma, trazer as modalidades de eSports para dentro do Ministério dos Esportes, chancelando essa modalidade, seria importante para o desenvolvimento da atividade, incentivos governamentais e também a troca de experiências, além do aumento de patrocinadores.
Indubitavelmente, pensar de forma diversa é atrelar-se, de forma injustificada, a um conservadorismo infundado e suprimir uma modalidade esportiva com potencial econômico, fiscal, educador, de formação, social que permeia essa atividade. Não parece ideal realizar distinção quando o lema do próprio governo é de união.
Infere-se, portanto, que sob todos os prismas analisados, não é defensável, atualmente, o enquadramento dos eSports como algo marginalizado dos esportes. Sem falar no potencial econômico, fiscal, educador, de formação, enfim, social que permeia essa atividade tal qual o esporte considerado raiz.
Não parece ideal realizar distinção quando o momento é de união.
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[1] Doutor e Mestre (PUCRS) em Direito – área de concentração Jurisdição e Processo (PUCRS). Professor da Faculdade João Paulo II – Porto Alegre. Foi professor concursado da UNISC na graduação e pós, professor convidado do Pós Graduação em Direito Processual Civil da FEEVALE, Faculdade Meridional – IMED e Escola Superior de Advocacia. Avaliador da Revista Cadernos do Programa de Pós-Graduação em Direito da UFRGS. Sócio do escritório Bonetti, Krugen & Pamplona Advogados Associados. Membro da Comissão de Direito dos Jogos da OAB/DF. e da OAB/RJ. Membro da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/RS. Membro do Ibradim. Eleito um dos advogados mais admirados do Brasil, pela Revista Análise, em 2018 e 2020.