O Brasil é o país que mais mata homossexuais no mundo, razão pela qual a constatação do discurso homofóbico no esporte há de ser, no mínimo, objeto de consternação.
A cada 28 horas um homossexual é assassinado no Brasil em decorrência direta da repulsa violenta a sua orientação sexual. O país é líder no ranking da ONU.
Em 2013, 44% dos assassinatos de homossexuais registrados globalmente se deu no Brasil. Em 2014 houve aumento de 4% em relação a 2013.
Apesar disso, o projeto de lei que buscava a criminalização específica da homofobia no país (PLC 122/2006) foi arquivado pelo Senado Federal.
Como é de se imaginar, a manifestação homofóbica no esporte não se dá por meio de assassinatos, mas se utiliza da via da violência verbal, manifesta em diversos momentos pela torcida ou pelos atores envolvidos no contexto desportivo. Nesse sentido, observa Marco Bettine Almeida:
“Essa consideração contém a ideia de que a homofobia não se dá somente pela agressão física diretamente direcionada contra o homossexual, mas pode se firmar de maneira sutil e até imperceptível. Essa expressão da violência chamada simbólica compreende a agressão verbal, moral e toda forma velada e não física produtora de lugares minoritários e reprodutores da lógica dominação-exploração materializada em discursividades homófobas” (ALMEIDA, Marco Bettine. O futebol no banco dos réus: caso da homofobia. Movimento. Porto Alegre, v. 18, n. 1, p. 301-321, jan./mar. de 2012).
O preconceito não para por aí, como acentua Regina Navarro Lins:
“Uma pesquisa realizada pelo IBOPE em 1993 ouviu duas mil pessoas e concluiu que a metade deles já admite que convive com homossexuais em seu bairro, local de trabalho ou clubes que freqüenta. Entretanto, de todos os entrevistados, 36% não contratariam um homossexual para sua empresa, mesmo que fosse o mais qualificado; 47% mudariam seu voto caso descobrissem que seu candidato é homossexual; 79% ficariam tristes se tivessem um filho homossexual e 8% seriam capazes de castigá-los por isso” (NAVARRO LINS, Regina. A Cama na Varanda: Arejando nossas ideias a respeito do amor e sexo. [S.l.: s.n.]).
Não obstante, a legislação desportiva brasileira não empreende esforço para a prevenção da homofobia, uma vez que inexiste qualquer disposição singular que vise coibi-la especificamente.
Os preceitos que mais se aproximam dessa finalidade são aqueles que busquem garantir a dignidade da pessoa humana ou a segurança e integridade física e moral do participante.
O art. 2º da Lei 9.615/1998 (Lei Geral do Desporto) assim dispõe:
Art 2º – O desporto, como direito individual, tem como base os princípios:
(…)
XI – da segurança, propiciado ao praticante de qualquer modalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial.
De seu turno, o Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/2003) fixa, no art. 13-A:
Art. 13-A. São condições de acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo, sem prejuízo de outras condições previstas em lei:
(…)
IV – não portar ou ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com mensagens ofensivas, inclusive de caráter racista ou xenófobo;
V – não entoar cânticos discriminatórios, racistas ou xenófobos […].
Percebe-se que o Estatuto do Torcedor se dedicou a coibir explicitamente o racismo e a xenofobia, mas se absteve da homofobia, que se pode inferir compreendida na disposição abrangente das mensagens ofensivas e cantos discriminatórios.
Positivamente destaque-se a atuação da Justiça Desportiva brasileira que em 2011, com base no art. 243-G do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, condenou o Sada Cruzeiro ao pagamento de multa no valor de R$ 50 mil em razão das manifestações homofóbicas da torcida mineira contra o atleta Michael, da equipe adversária.
De toda sorte, é triste constatar que a legislação desportiva brasileira, tal como a legislação geral do país, ignora o vocábulo “homofobia”, a despeito de vivermos no país que mais extermina homossexuais em todo o planeta.
Que essa realidade seja alterada, e rápido!