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Justiça do trabalho reafirma que futebol feminino é profissional ao reconhecer vínculo empregatício de jogadora

A Justiça do Trabalho de Rondônia proferiu uma importante decisão para o futebol feminino na última quinta-feira, 17 de agosto. A juíza Fernanda Cavalcante Soares deferiu a ação de uma jogadora que pediu o reconhecimento do seu vínculo empregatício com seu clube, o Real Ariquemes.

A partir do reconhecimento, a magistrada determinou ao clube roraimense o pagamento de direitos previstos em contrato, como: 13º salário proporcional, férias, depósitos de FGTS de todo o período contratual, salários retidos e cláusula compensatória.

Na ação, em que o Lei em Campo teve acesso, o Real Ariquemes alegou que o futebol feminino não pode ser considerado profissional pela lei brasileira, mas sim amador. No entanto, o entendimento da juíza seguiu a linha contrária.

Fernanda Cavalcante apontou na decisão que o Real Ariquemes explorou comercialmente a atuação das jogadoras, seja através da cobrança de ingressos para os jogos, do recebimento de patrocínios ou da tentativa de conseguir incentivos dados pela CBF. Além disso, a juíza também citou que havia obrigatoriedade para as atletas, assim como para o time masculino, de comparecer aos treinos e jogos nos horários definidos, caracterizando dessa forma o vínculo de trabalho.

“A ausência de liberdade de prática das atividades desportivas – pois não havia autonomia na escolha dos horários, dias de treinamentos e participação em partidas – demonstram a presença de subordinação jurídica (…)”, cita um trecho da decisão.

Ainda na decisão, a magistrada fez ponderações importantes e reforçou que não há distinção de gênero entre os atletas desportivos.

“A prática do desporto no Brasil é regida precipuamente pela Lei nº 9.615/98 (Lei Pelé), que em seu artigo 3º, parágrafo 1º, faz a diferenciação do jogador profissional e do não-profissional (…) Segundo os ditames da lei, atua de forma profissional o atleta que recebe remuneração pactuada em contrato de trabalho, enquanto o jogador não-profissional é identificado pela ausência do pacto contratual, podendo, no entanto, receber incentivos materiais e de patrocínio (…) Observa-se, portanto, que não há distinção de gênero entre os atletas desportivos na conceituação de atletas profissionais e atletas não profissionais”, citou a juíza.

“Além disso, o reconhecimento de direitos trabalhistas ao time masculino, mas a negativa de tais vantagens às jogadoras do gênero feminino, não obstante a identidade da forma de atuação, resulta em conduta discriminatória, em total afronta ao art. 5º, I, e 6º, inciso XXX, da CRFB”, acrescentou Fernanda Cavalcante.

O advogado Higor Maffei Bellini, que defendeu a jogadora no processo, comemorou a decisão favorável em primeira instância.

“Mais uma vez a justiça do trabalho, cumpre o seu papel histórico, de trazer a igualdade entre homens e mulheres. Não se pode mais admitir que clubes de futebol, se defendam em processos trabalhista, pedindo o reconhecimento do vínculo e anotação de carteira, dizendo que o futebol feminino é amador. O futebol feminino não é amador, o futebol feminino é tão profissional quando o masculino, já que ambos os clubes, conseguem renda cobrando ingressos, dos torcedores que comparecem aos jogos nos estádios”, declarou.

“Eu acreditei quando conseguimos a famosa decisão contra o Fluminense, que é citada em diversos TCC que os clubes iriam parar de usar este argumento, mas, estava errado. Espero que agora com uma nova sentença reafirmando a igualdade de tratamento como profissionais para homens e mulheres, os clubes deixem de fazer estas alegações que discriminam o empregado em razão do gênero”, completou o advogado.

A decisão que Higor Maffei Bellini se refere foi contada pelo Lei em Campo em julho de 2021. A 23ª Vara do Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro condenou o Fluminense a reconhecer o vínculo empregatício de uma jogadora. O clube carioca minimizou a condição da atleta na Justiça ao negar um pedido para reconhecimento de vínculo empregatício de 2019, alegando que a modalidade feminina é inferior à masculina.

Para sustentar sua contestação, o Tricolor citou no processo um trecho da Lei Pelé para dizer que o futebol, era e ainda é, segundo o clube, majoritariamente praticado por atletas do sexo masculino, com condições distintas, como receitas e transmissão. Para o clube, as jogadoras mulheres, diferentemente dos homens, não poderiam ter o vínculo de emprego reconhecido, por serem amadoras.

W.O. foi estopim para jogadoras do Real Ariquemes

A última rodada da primeira fase do Campeonato Brasileiro Feminino A1 da atual temporada foi encerrada de maneira triste. Em forma de protesto pelos mais de dois meses de salários atrasados e condições precárias de trabalho, as jogadoras do Real Ariquemes se recusaram a entrar em campo contra o Santos, no dia 12 de junho, e acabaram sofrendo W.O.

Um dos problemas graves relatados pelas jogadoras do Real Ariquemes ao longo do campeonato foi a alimentação, que precisou ser custeada pelo treinador Paulo Eduardo e pelo coordenador da equipe.

“Não foi só pela falta de salários, foi muito além. Foi pela falta de respeito, de investimentos, de programação, foi por tudo. Foi pelo descaso com a modalidade e a única forma que a gente encontrou de mostrar isso foi tomando essa atitude”, disse uma das jogadoras da equipe rondoniense que não quis ser identificada.

Após o triste episódio, dez jogadoras do Real Ariquemes decidiram entrar com ações contra o clube na justiça do trabalho de Rondônia pedindo, entre outras coisas, o reconhecimento do vínculo empregatício.

O Lei em Campo tentou entrar em contato com o Real Ariquemes, mas até o momento não conseguiu. Caso isso aconteça, a matéria será atualizada com a posição do clube.

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