Estados Unidos, Inglaterra e agora Austrália. Decisões da justiça condenando entidades esportivas por abuso de menores mandam um recado claro: a proteção de menores também é uma responsabilidade do esporte.
Neste mês de novembro, o Western Bulldogs, clube de futebol australiano, foi condenado pela instância mais alta da justiça do país a indenizar em cerca de US$ 3,8 milhões (R$ 18 milhões) uma vítima de abuso sexual e pedofilia.
A quantia milionária é a maior já registrada na Austrália para casos desse tipo. Por sua vez, o clube foi o primeiro do país a ser condenado por não ter tomado medidas efetivas de proteção às vítimas de abuso.
A decisão australiana reforça um compromisso do esporte de proteção aos menores. Portanto, é fundamental que o movimento esportivo acelere projetos de conformidade. Eles vão ajudar a implementar treinamentos e fiscalização, criando uma política de combate ao assédio e efetiva assistência ao menor. Propondo debates, criando canais de denúncia, promovendo treinamentos e pedindo que seus filiados levantem essa bandeira. Não só porque a lei determina, nem porque a vigilância aumentou. É preciso tomar esse caminho porque é o certo a fazer
A decisão é considerada histórica e reforça o entendimento de tribunais de outros países, como da Inglaterra e Estados Unidos, que consideraram em casos recentes que as entidades desportivas são responsáveis pela proteção dos atletas menores de idade.
Os exemplos dos EUA e da Inglaterra
Em dezembro de 2021, após cinco anos de batalhas judiciais, as vítimas de abuso sexual do ex-médico da equipe feminina de ginástica dos Estados Unidos, Larry Nassar, chegaram a um acordo com a Federação Americana de Ginástica, os Comitês Olímpico e Paralímpico americano e suas seguradoras. As ginastas receberão ao todo cerca de US$ 380 milhões (R$ 2,1 bilhões).
Um pouco antes, em junho de 2021, na Inglaterra, uma investigação independente apontou falhas de clubes e da própria federação em um dos maiores escândalos de abuso contra menores da história do futebol inglês. Um relatório de mais de 700 páginas que mostrou a falta de mecanismos internos de controle e apresentou caminhos necessários a serem tomados pelas entidades esportivas na proteção de atletas.
Um na Inglaterra, outro nos Estados Unidos e agora na Austrália. Três casos históricos que reforçam compromisso legal de clubes e federações na proteção de atletas e servem também de exemplos para caminhos necessários a serem tomados no Brasil.
E no Brasil
As entidades esportivas também precisam proteger os menores. Não só porque o esporte tem o compromisso legal de ajudar na formação das crianças, mas também porque vários crimes de abusos contra menores acontecem dentro das entidades esportivas. Temos casos na natação, na ginástica, no futebol, recentemente na canoagem e por aí vai.
A realidade é triste, e condenável: a maioria das entidades esportivas que trabalham com crianças e adolescentes no Brasil não tem um programa específico de atendimento e aconselhamento para atletas de base, que ajude na conscientização, denúncia e combate a crimes de assédio e violência sexual.
O discurso de que a responsabilidade de combater esse tipo de crime é do Estado me parece mais um dos exemplos da falta de responsabilidade social de alguns de nossos dirigentes. O esporte de formação pode até ser um negócio, mas ele não pode deixar de assumir compromissos necessários quando se lida com crianças e adolescentes. Nossa legislação deixa isso bem claro.
A gente pode partir lembrando os artigos 5º, 6º, 7º, 217 e 227 da Constituição Federal. O que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 4º e também tratados universais de proteção ao menor.
Mesmo sabendo que a prevenção é sempre o melhor caminho, existem dispositivos legais para se punir esse tipo de crime. No Brasil, a Lei Joanna Maranhão e a Lei Geral do Esporte avançaram nessa questão.
Mas é preciso avançar.
Existem projetos importantes no Congresso que precisam ser levados adiante. Eles tratam de questões fundamentais, como registro obrigatório de clubes e escolinhas em conselhos tutelares e exigência dos formadores de certidão negativa de antecedentes criminais daqueles profissionais que irão trabalhar com as crianças e adolescentes.
O próprio movimento esportivo sabe disso. Nas mudanças apresentadas pelo Código de Ética da FIFA em 2019, apareceu a inclusão do abuso e a exploração sexual como punições específicas dentro do artigo 23. A infração tem uma pena mínimo de dez anos, mesmo tempo de casos de pagamento de propina e desvio de verba. Além disso, a FIFA estabeleceu que a proteção das vítimas de assédio sexual deve ser reforçada.
Uma responsabilidade de todos
Esse é um problema que acontece em casa, nas ruas, nas escolas, e dentro das entidades esportivas. Por isso, a responsabilidade é de todos.
De novo: não só porque a lei determina, nem porque a vigilância aumentou. É preciso tomar esse caminho porque é o certo a fazer.
As decisões recentes da Justiça são só mais um alerta para as entidades esportivas. De lá e daqui.
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