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La Liga, Racismo e Vini Jr.

Por Matheus Laupman

No último El Clásico, ocorrido no domingo (19/03), que terminou com vitória do Barcelona sobre o Real Madrid por 2 a 1, Vini Jr. foi mais uma vez alvo de perseguição, violência e discriminação por parte dos torcedores adversários. Após o gol da equipe merengue, cantos de “Morra, Vinicius” foram entoados pela torcida catalã, repetidos em diversos momentos da partida.

 Infelizmente, é mais um caso claro de racismo no futebol mundial.

A La Liga já registrou sete denúncias de casos de injúrias raciais contra o mesmo jogador. Torcidas do Atlético de Madrid, Mallorca, Real Betis, Real Valladolid, Osasuna e do próprio Barcelona foram as responsáveis pelos casos anteriores.

No episódio envolvendo o Mallorca, o torcedor foi punido com 12 meses sem poder entrar em estádios e mais 21 mil Reais de multa pela comissão estatal espanhola, após gritar insultos racistas no jogo do dia 5 de fevereiro. Diferentemente o que ocorreu com o Mallorca, abusos raciais da torcida do Barcelona, manifestados em outubro de 2021, foram engavetados, sem qualquer punição aos catalães.

Será que essa ação não representa muito pouco para uma das maiores ligas de futebol no mundo?

Fundada em 10 de fevereiro de 1929[1], a La Liga foi fruto da reunião dos clubes espanhóis para regulamentar o futebol no país, seu objetivo era aumentar a rentabilidade dos clubes e da competição, atraindo mais público e mantendo os principais times da Espanha com o calendário movimentado durante boa parte do ano, além de ter criado clássicos e rivalidades históricas.

Os objetivos comerciais e de negócios parecem ter sido alcançados pela Liga,  pois em 2021 ela vendeu 10% de seus negócios à empresa CVC por 3,2 bilhões de dólares[2].  Estima-se que a Liga fature atualmente 1,9 bilhão de Reais por ano com direitos televisivos.

Mas, respondendo à pergunta acima, o que tem chamado a atenção é que para uma Liga tão poderosa financeiramente, o descaso com as questões raciais e perseguição a atletas negros são frequentes e nos levam a falar sobre as políticas ESG e normativas que buscam punir o racismo.

Se observarmos o site da La Liga[3], nos depararemos com a política do “Stop Racismo” em que a Liga afirma possuir tolerância zero com a prática, informando ainda um e-mail para denunciar os casos, [email protected]. A ação está longe de responder com rigor à gravidade do problema.

 A falta de ações efetivas da La Liga nos demonstra não só que sua política de governança tem sido insuficiente no que se refere ao racismo, como também demonstra a não aplicação do Código Disciplinar na Fifa para tais casos.

O Artigo 15 do Código Disciplinar da FIFA estabelece que casos de violência ou discriminação devido a cor, raça, etnia, nacionalidade, religião, origem social, gênero, língua, orientação sexual, opinião política, dentre outros devem ser sancionados, vejamos:

 “15. Discrimination 1. Any person who offends the dignity or integrity of a country, a person or group of people through contemptuous, discriminatory or derogatory words or actions  on account of race, skin colour, ethnicity, nationality, social origin, gender, disability, sexual orientation, language, religion, political or any other opinion, wealth, birth or any other status or any other reason shall be sanctioned with a suspension lasting at least ten matches or a specific period, or any other appropriate disciplinary measure.”

Ademais, o item 2 do referido artigo, determina que se um ou mais torcedores realizarem manifestações de violência e discriminação, os Clubes deverão ser punidos, com as seguintes sanções:

“2. If one or more of an associations or club’s supporters engage in the behaviour described in paragraph 1, the association or club responsible will be subject to the following disciplinary measures:

a) For afirst offence, playing a match with a limited number of spectators and afineofat least CHF 20,000 shall be imposed on the association or club concerned.

b) For recidivists or if the circumstances of the case require it, disciplinary measures such as the implementation of a prevention plan, a fine, a points deduction, playing one or more matches without spectators, a ban on playing in a particular stadium, the forfeiting of a match, expulsion from a competition or relegation to a lower division may be imposed on the association or club concerned.”

Para os casos envolvendo Vini Jr., a La Liga, uma vez filiada e subordinada ao Código Disciplinar da Fifa, poderia sancionar os clubes envolvidos limitando o acesso dos torcedores ao estádio e aplicando uma multa de 20 mil francos suíços, o que equivaleria hoje a aproximadamente 113 mil Reais ou 20 mil Euros.

Em caso de reincidência, o clube poderia jogar sem torcida, sofrer WO, perder pontos, ser expulso da competição ou, até mesmo, rebaixado para divisões inferiores.

Se as ações ocorridas com Vini Jr. ocorressem em competições esportivas no Brasil, os envolvidos poderiam ser sancionados com as disposições previstas pelo Artigo 243-G[4] do CBJD, resultando em suspensão de cinco a dez partidas, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de 120 a 360 dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural submetida a esse código, além de multa, de 100 a 100 mil Reais.

Em caso de ato praticado simultaneamente por considerável número de pessoas vinculadas a uma mesma entidade de prática desportiva, poderia ser aplicado o §1º do artigo 243-G, em que a entidade de prática desportiva também é punida com a perda do número de pontos atribuídos a uma vitória no regulamento da competição, independentemente do resultado da partida, prova ou equivalente, e, na reincidência, com a perda do dobro do número de pontos atribuídos a uma vitória no regulamento da competição, independentemente do resultado da partida, prova ou equivalente; caso não haja atribuição de pontos pelo regulamento da competição, a entidade de prática desportiva pode ser excluída da competição, torneio ou equivalente.

Diante disso, verificamos que a La Liga, como uma das maiores do mundo, poderia realizar políticas ESG mais eficientes contra racismo, violência e perseguição sofridas por Vini Jr. O Código Disciplinar da Fifa possui excelentes disposições e sanções que poderiam facilmente ser aplicadas, tudo observando os princípios do devido processo legal, ampla defesa e contraditório aos envolvidos.

Ao nosso craque Vini Jr., desejemos todo sucesso e apoio na luta antirracista, contra os preconceituosos e intolerantes. “Baila VINI!”

Crédito imagem: Real Madrid

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Matheus Laupman, advogado de Murta Goyanes (equipe de mídia, entretenimento e esportes), mestrando em Direito Desportivo pela PUC-SP, gestor esportivo pela FGV/FIFA/CIES, auditor assistente do STJD do Futebol, membro filiado do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo – IBDD, ex-secretário do TJD–SP do Futebol e ex-responsável pelo Departamento de Filiação da FPF.

[1] https://reidopitaco.com.br/universo-pitaco/esportes/futebol/campeonatos/campeonato-espanhol/historia

[2] https://www.uol.com.br/esporte/ultimas-noticias/afp/2021/08/04/laliga-espanhola-vende-10-de-seus-negocios-a-empresa-cvc-por-32-bilhoes-de-dolares.htm

[3] https://www.laliga.com/es-US

[4] Art. 243-G. Praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009). PENA: suspensão de cinco a dez partidas, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de cento e vinte a trezentos e sessenta dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural submetida a este Código, além de multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais). (Incluído pela Resolução CNE nº 29 de 2009).

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