O senador Romário Faria (Podemos-RJ) apresentou na última quinta-feira (22) ao Senado o Projeto de Lei 5004/2020, que visa proibir entidades esportivas de punirem atletas por se manifestarem politicamente. O ex-jogador de futebol e político reprovou a punição do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) que advertiu a jogadora de vôlei Carol Solberg por gritar “Fora, Bolsonaro” durante uma entrevista depois da partida.
“Foi uma interpretação jurídica equivocada. Dentro da dinâmica esportiva, punições devem ser aplicadas em caso de ofensas diretas a atores envolvidos na disputa, organização e patrocínio da própria competição”, defendeu Romário em seu perfil no Twitter.
Com base nisso, o texto do PL 5004 prevê mudança na Lei Pelé: “Nenhum atleta poderá ser punido com as penalidades previstas neste artigo ou enquadrado em qualquer infração disciplinar devido a uma manifestação de natureza política, salvo se houver ofensa direta e expressa, durante a disputa de uma competição, a um de seus participantes, patrocinadores ou organizadores”.
Martinho Neves, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo, alerta para o perigo da aprovação do projeto. “Há o risco de que, assim, o esporte se transforme em palco de infindáveis manifestações políticas. O esporte não é para isso. É uma clara interferência no esporte”, avalia o especialista em direito esportivo.
“É um perigo primeiro porque toda a estrutura esportiva é internacional, e a própria Lei 9.615 traz para dentro do ordenamento jurídico as normas esportivas internacionais, havendo aí um potencial conflito de normas. Mas mais que isso, caso as federações internacionais não aceitem manifestações políticas, uma lei como essa pode resultar na desfiliação das confederações brasileiras, impedindo que nossos atletas disputem as competições internacionais e reduzindo muito o fluxo financeiro dentro de determinadas modalidades. Gerar um conflito como esses pode ser fatal para o fortalecimento do esporte enquanto mercado no Brasil, resultando em significativas perdas financeiras para os próprios atletas”, completa o advogado especialista em direito esportivo e colunista do Lei em Campo, Vinícius Loureiro.
Em suas redes sociais, Romário justificou a apresentação da proposta citando o artigo 5º da Constituição Federal que fala em “livre manifestação do pensamento”.
“A autonomia das entidades esportivas não pode se sobrepor à nossa Constituição, que nos garante a livre manifestação de pensamento. Punir um atleta por se manifestar contrariamente a um personagem estranho à competição, e que não atrapalhe o seu andamento, é um constrangimento ao artigo 5º da nossa Constituição”, disse o senador.
“A alegação de que essa vedação fere a liberdade de expressão, em minha opinião, não persiste, porque também há a liberdade de associação e, caso o atleta não concorde com as regras daquela associação ela pode simplesmente deixa-la. O exercício da liberdade também implica em responsabilidade pelas próprias escolhas”, afirma Loureiro.
Os especialistas acreditam que a proposta do senador Romário não deve prosperar.
“Parece mais um jogo de cena do senador, se aproveitando da repercussão do caso para se posicionar politicamente”, finaliza Vinícius Loureiro.
Andrei Kampff, advogado e colunista do Lei em Campo, entende que “não se trata aqui da defesa da liberdade de expressão – que entendo como fundamental -, mas da proteção da autonomia do esporte. É importante entender que quando o esporte não protege valores da sua natureza – como liberdade de expressão e proteção de direitos humanos -, existe o o permanente risco dessa irritação no sistema esportivo sofrida pela intervenção do Estado. A mudança precisa vir de dentro da própria cadeia esportiva, com os atletas se manifestando. Isso funciona, basta ver o exemplo da NBA”.
Recentemente, o Lei em Campo contou que o Comitê Olímpico Internacional (COI) estuda uma mudança na Regra 50 da Carta Olímpica, que prevê uma maior liberdade para os atletas se manifestarem durantes as competições. O pedido é feito há anos pelas associações, federações e competidores, e ganhou ainda mais força depois de casos recentes em que atletas decidiram se manifestar, se posicionando contra o preconceito racial e protegendo direitos humanos.
Crédito imagem: Senado
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