Trago, hoje, caro leitor, como tema, a “mediação desportiva”, um mecanismo alternativo de resolução de litígios em sede de desporto a acrescer à arbitragem: aqui o mediador (de conflitos), terceiro imparcial e neutro, não tem poder de decisão nem apresenta uma solução imposta às partes – a solução será sempre aceita por elas, que são quem toma a decisão, para a qual trabalham (sendo até por isso mais elevada a probabilidade de mais facilmente a acatarem).
Para que a “mediação desportiva” não fique acantonada, importa conhecê-la, divulgá-la, utilizá-la, maximizar suas virtudes, aproveitar as vantagens que ela encerra em prol de uma “justiça desportiva” célere, especializada, eficaz. Assim, e porque intra e extra muros se tem falado e escrito pouco sobre o assunto, fica aqui, caro leitor, uma breve sistematização das principais vantagens que, na doutrina, vamos, vários autores, imputando à “mediação desportiva”.
1. As características e dinâmicas específicas do desporto: tendo presentes as características e dinâmicas específicas do desporto, designadamente prazos muito apertados, torna-se vital uma autorregulação preventiva em que as partes assegurem de forma célere uma resolução amigável, necessária e proporcionada à especificidade desportiva.
2. O clima amigável de mediação, na esteira do fair play desportivo: a natureza de colaboração, de consenso, de cooperação e de clima amigável da mediação encoraja a criação de um contexto favorável ao fair play e ao espírito de entendimento.
3. A “especificidade do desporto” – concorrência e cooperação simultâneas, propícias ao entendimento: ao contrário de outros setores, no desporto os adversários nas disputas desportivas são aliados na concepção e maximização da competição enquanto produto, razão pela qual procuram entendimentos no sentido de preservar e rentabilizar a competição, o que atingem por via da negociação, de entendimentos. Ora, essa cultura de cooperação, de solidariedade, é benéfica, porque coincidente e facilmente transponível para o contexto da mediação.
4. O desporto como um “mundo pequeno”, de “contínuas relações de negócio” e inerentes vantagens da confidencialidade da mediação: as “particularidades do setor do deporto”, designadamente o fato de os atletas terem carreiras curtas – as chamadas profissões de desgaste rápido –, em concatenação com o fato de tais agentes desportivos e os demais viverem num “mundo pequeno” de “contínuas relações de negócio”, motiva que seja preferível a resolução dos litígios dentro da “família do desporto”, com a máxima confidencialidade, em abono da manutenção das relações pessoais, comerciais e desportivas.
5. O desporto como um mundo de relações afetivas, quase paternais/fraternais, que “exige” relações pessoais permanentes e duradouras: tal como na mediação familiar, no desporto estabelecem-se relações de tal forma pessoais e especiais (quantos atletas não apelidam os treinadores ou empresários de pais…) que quase tão importante quanto a solução do problema é a manutenção/restabelecimento das relações entre as partes, estando estas como que “condenadas a entender-se” duradouramente.
6. A mediação baseada em emoções, sentimentos e interesses, mais do que na solução jurídica propriamente dita: a mediação pode assentar-se em argumentos de índole não jurídica que podem ser úteis no contexto do fenômeno desportivo, isto é, o fato de a mediação tentar conciliar interesses, e não direitos, coloca a pacificação do conflito como prioridade em relação à solução jurídica concreta propriamente dita.
7. A mediação como forma de mitigar a “desigualdade de armas” entre empregadores e trabalhadores e entre prestadores e prestatários de serviços: a mediação desportiva tem também a vantagem de mitigar a “desigualdade de armas” que existe; de fato, quando as partes se reúnem para dirimir um conflito no âmbito da mediação, propicia-se um equilíbrio de poderes que possibilita que negociem num plano de igualdade, eliminando o poder de um sobre o outro.
8. O carácter menos oneroso da mediação desportiva: comparadas as taxas e os encargos do processo no âmbito da arbitragem no TAD com os custos da mediação desportiva, estes são, de fato, menores, vantagem nada despicienda tendo presente que aqueles são elevados.
9. A mediação como solução ideal para “situações confusas” no desporto: na esteira de Oman Ongaro, da FIFA, considero que a mediação é indicada para “situações confusas” (i) em que o resultado do procedimento é totalmente aberto e incerto; (ii) em que a complexidade da matéria sugere procedimentos longos e intrincados; (iii) em que existe também a possibilidade de existência de barreiras “políticas” (assumidas pelo menos por uma das partes). Daí que me pareçam transponíveis para o TAD os cenários que, para a FIFA, “reclamam” o recurso à mediação, a saber: (i) quando possíveis mal-entendidos que possam existir careçam de ser esclarecidos; (ii) quando se pretende evitar que as partes “percam a face”; (iii) quando a mediação surge como uma forma possível de aferir/avaliar/antecipar o resultado (de uma eventual futura arbitragem) – não existindo a necessidade de aceitar a “proposta” do mediador, a mediação é vantajosa porque é um indicador a ter em conta face ao que se pode antever para cada parte no litígio em presença.