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Ministério da Fazenda publica portaria sobre meios de pagamento para as apostas esportivas: o que vem por aí

No último dia 16 de abril, foi editada a Portaria Normativa SPA/MF 615/24, que traz diretrizes para transações de pagamento relacionadas à loteria de apostas de quota fixa – as apostas – no Brasil. O normativo traz clara preocupação com a segurança, a transparência e a proteção dos apostadores. Alguns tópicos merecem destaque.

  1. Proibição do Uso de Dinheiro em espécie, Cartão de Crédito e Criptoativos

A legislação proíbe que os agentes operadores aceitem pagamentos por meio de dinheiro em espécie, cartões de crédito, ativos virtuais ou criptoativos, entre outros métodos, para garantir a segurança e evitar o uso de fontes não verificadas ou instáveis.

Isso reflete uma preocupação do regulador com a origem dos fundos e o risco associado a instrumentos de pagamento pós-pagos e ativos que podem ser usados para lavagem de dinheiro ou outras atividades ilegais.

Outra preocupação do regulador endereçada por essa medida diz respeito à integridade do apostador, ao se coibir a concessão de crédito e a utilização de dinheiro pós-pago, o Governo mostra uma preocupação em tentar minimizar os casos de endividamento dos apostadores.

A vedação à utilização de cartões é questionável, pois existe hoje possibilidade de se contornar essa proibição facilmente. Algumas fintechs no mercado concedem crédito pré-aprovado diante da existência de cartão de crédito. O cliente da fintech, em cima de uma análise feita sobre o seu cartão de crédito, tem um dinheiro disponível em sua conta que o permite apostar em um site de apostas. Ou seja, o apostador segue tendo como apostar com crédito pós-pago, contornando a restrição normativa.

Para se coibir essa prática, seria preciso ao regulador (Ministério da Fazenda) atuar em conjunto com o Banco Central do Brasil (BACEN) para coibir tal prática. Enquanto isso não for feito, o uso de crédito será mitigado, mas não impedido.

Sobre a utilização de criptoativos, a vedação se deve em muito à preocupação do governo com riscos associados à lavagem de dinheiro e ao financiamento do crime organizado. Devido ao caráter descentralizado e ao anonimato inerente aos criptoativos, eles podem ser usados para movimentações financeiras ilegais, facilitando a ocultação de origem e a transferência de fundos sem deixar rastros, o que preocupa o regulador. Vale notar que a ausência de uma entidade central para regular transações dificulta o rastreamento e a aplicação da lei, criando um ambiente menos seguro. A dificuldade de supervisionar operações em criptoativos, ao que tudo indica, foi determinante para o governo, que tem como missão, garantir a proteção dos consumidores e a estabilidade do sistema financeiro.

A despeito de aprimoramentos necessários na legislação, é louvável a intenção do regulador de preservar a segurança do sistema e a saúde financeira dos apostadores.

  1. Garantia de Liquidez e Reserva Financeira

Para assegurar a solvência dos agentes operadores e a capacidade de honrar pagamentos de prêmios, a portaria estabelece uma série de requisitos para a gestão de liquidez e reserva financeira.

Dentre eles, os agentes operadores devem manter uma reserva financeira mínima de R$ 5.000.000,00 que tem como principais finalidades:

  • Proteção aos Apostadores: se um operador se tornar insolvente, a garantia de liquidez ajuda a garantir que os apostadores ainda recebem seus prêmios e retiradas.
  • Prevenção de Riscos Financeiros: ela reduz o risco de operadores entrarem em colapso financeiro, o que poderia prejudicar a reputação da indústria e a confiança do público.
  • Conformidade Regulamentar: ao manter uma garantia de liquidez, os operadores mostram conformidade com as leis e regulamentações de apostas, demonstrando que são financeiramente sólidos.

Essa reserva deve ser custodiada em instituições financeiras autorizadas pelo BACEN e pode ser aplicada em títulos públicos federais com prazos e limites bem definidos. Além disso, o saldo da reserva financeira só pode ser utilizado mediante prévia autorização do regulador, a Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda.

A exigência de uma garantia de liquidez significa que os operadores de apostas esportivas devem manter um montante mínimo de 5 milhões em ativos líquidos, que podem ser rapidamente convertidos em dinheiro, para assegurar pagamentos de prêmios e outras obrigações financeiras. Isso pode ser mantido em várias formas, como:

  • Dinheiro ou equivalentes de caixa: como depósitos bancários, títulos do governo ou outros investimentos de baixo risco e alta liquidez.
  • Contas em instituições financeiras: o operador pode ser obrigado a manter esses fundos em uma conta segregada em um banco autorizado pelo BACEN

Enfim, trata-se de um mecanismo destinado a assegurar que os operadores de apostas tenham recursos financeiros suficientes para cobrir pagamentos e prêmios devidos aos apostadores. O objetivo é evitar que operadores se tornem insolventes ou incapazes de honrar seus compromissos financeiros para com os ganhadores de apostas. Isso promove confiança no sistema e reduz o risco de escândalos financeiros ou fraudes.

Mas é preciso destacar que o valor da garantia fixada pelo regulador (R$ 5.000.000,00) é arbitrário e não leva em conta o volume transacionado por cada operador até porque, para fazer isso, é necessário aguardar a abertura do mercado regulado para se ter a dimensão da movimentação financeira de cada casa de apostas.

Depois do primeiro ano de operações reguladas, certamente será necessário refinar e individualizar a garantia de liquidez de acordo com a realidade de cada operador. Talvez tivesse sido mais eficiente ter definido um percentual em cima do faturamento de cada empresa como medida de liquidez. Vale destacar que se trata de uma medida crítica para manter a confiança do público e assegurar a conformidade com padrões regulatórios.

  1. Segregação de Contas e Proteção dos Fundos dos Apostadores

A legislação exige a segregação de contas para separar os fundos dos apostadores dos recursos do agente operador. Isso garante que os recursos dos apostadores não possam ser utilizados para despesas operacionais ou outros fins do agente operador. A segregação de contas ajuda a evitar a mistura de fundos e protege os apostadores em casos de insolvência, recuperação judicial ou liquidação do agente operador.

Para isso, a Portaria Normativa SPA/MF 615/24 traz definições para conta gráfica, conta proprietária e conta transacional. Vale entender cada um desses tipos de conta e suas diferenças:

a) Conta Gráfica

A conta gráfica é uma conta virtual, disponibilizada pelo agente operador em seu sistema de apostas. Ela permite ao apostador gerenciar suas apostas e recursos financeiros. É como um painel de controle onde os usuários podem visualizar seu saldo, apostar, acompanhar seus ganhos, e resgatar ou transferir dinheiro. Esta conta gráfica, como é virtual, não envolve transações diretas com bancos ou instituições financeiras; é uma interface que facilita a interação do apostador com o sistema de apostas.

b) Conta Proprietária

A conta proprietária é uma conta de depósito ou de pagamento pré-paga de titularidade do agente operador. Ela é mantida em uma instituição financeira ou de pagamento autorizada pelo BACEN.

Esta conta é usada para despesas operacionais e gerenciamento de liquidez do agente operador. Ou seja, trata-se da conta que o agente operador usa para suas operações internas, como pagamento de funcionários, custos administrativos, e outras despesas relacionadas ao seu funcionamento.

c) Conta Transacional

A conta transacional é uma conta de depósito ou de pagamento pré-paga também de titularidade do agente operador, mantida em uma instituição financeira ou de pagamento autorizada pelo BACEN. A diferença é que essa conta é destinada a receber os aportes financeiros feitos pelos apostadores, manter valores relativos a apostas em aberto e, se o apostador optar, também para guardar os prêmios recebidos.

Essa conta serve como um “meio de campo” entre os apostadores e o agente operador, garantindo que os recursos destinados a apostas e prêmios estejam segregados dos recursos destinados a despesas operacionais.

d) Diferenças Principais

  • Conta Gráfica: É virtual e serve para gerenciamento de apostas e recursos financeiros pelos apostadores. Não tem movimentação bancária direta.
  • Conta Proprietária: É usada pelo agente operador para despesas operacionais e gerenciamento de liquidez. É uma conta real, mantida em instituição financeira autorizada pelo BACEN.
  • Conta Transacional: Serve para receber aportes dos apostadores e manter valores relativos a apostas em aberto. É a conta que lida com o dinheiro dos apostadores e prêmios, garantindo a segregação desse capital, dos recursos do agente operador. Também é mantida em uma instituição financeira autorizada pelo BACEN.

Tais parâmetros trazidos pela Portaria Normativa SPA/MF 615/24 ajudam a manter a segurança e transparência no sistema de apostas, evitando a mistura de fundos entre operações e valores dos apostadores, e garantindo que cada recurso seja usado para seu propósito correto.

  1. Instituições Autorizadas pelo BACEN

Para reforçar a segurança e confiabilidade das transações, a legislação exige que todas as operações financeiras ocorram por meio de instituições autorizadas pelo BACEN. Isso inclui as contas transacionais, onde os aportes e retiradas de recursos financeiros são realizados, e a conta gráfica, que permite aos apostadores gerenciar suas operações e recursos financeiros.

  1. Prazo para Pagamento de Prêmios

Os prêmios dos apostadores devem ser pagos exclusivamente por meio de transferência eletrônica para uma conta bancária ou de pagamento previamente cadastrada, e o prazo para pagamento é de até 120 minutos após o encerramento do evento ou sessão. Essa diretriz garante um prazo razoável para o pagamento de prêmios, evitando atrasos e promovendo a transparência no processo de liquidação das apostas.

A previsão contida no § 2º do artigo 6º da Portaria Normativa SPA/MF 615/24, entretanto, ao dispor que “é vedado ao agente operador restringir a retirada do saldo financeiro disponível dos apostadores, devendo os recursos financeiros estar disponíveis na conta cadastrada do apostador em até cento e vinte minutos após a solicitação de retirada”, deverá ser conciliada com medidas de segurança adotadas pelo operador a fim de checar a idoneidade do apostador. Vale lembrar que a própria portaria requer para realizar apostas ou acessar contas em plataformas o usuário deverá comprovar a identidade e informações pessoais, sem isso, poderá o operador reter o pagamento dos prêmios e ainda deverá comunicar às autoridades competentes sobre atividades suspeitas.

  1. Conclusão

A Portaria SPA/MF 615/2024 é um passo importante para o amadurecimento do setor de apostas esportivas no Brasil. Ela define um marco regulatório que se propõe a equilibrar a liberdade de operação dos agentes operadores com a proteção dos apostadores e a segurança financeira do sistema. A portaria ajuda a garantir que as práticas de apostas sejam conduzidas de maneira responsável, reduzindo riscos de atividades fraudulentas ou irregulares.

Essas diretrizes são louváveis, pois ainda que haja margem para aperfeiçoamentos, se propõe a promover um ambiente de apostas seguro, confiável e transparente, contribuindo para a estabilidade do setor como um todo.

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