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MP do Mandante está de volta à pauta. Especialistas analisam o cenário atual

Os direitos de transmissão do futebol brasileiro deverão voltar às discussões nos próximos dias. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não desistiu de mudar o formato das negociações e deverá publicar em breve uma nova versão da Medida Provisória 984, também conhecida como MP do Mandante. A informação foi divulgada primeiramente pelo jornalista Jorge Nicola, do Yahoo Esportes, e confirmada pelo Lei em Campo.

Segundo apurou o Lei em Campo com duas fontes, o presidente da República deve cumprir uma promessa feita ao Flamengo após a MP 984 caducar e publicar o novo texto no Diário Oficial da União nos próximos dias. Dessa forma, a lei entrará em vigência pelos próximos 180 dias até que seja votada pela Câmara dos Deputados.

Assinada por Bolsonaro no dia 18 de junho do ano passado, o texto da MP 984 buscava mudar as regras de transmissão do futebol brasileiro. Nele, a exibição da partida passava a ser de responsabilidade do mandante do evento, e não mais das duas entidades envolvidas, como prevê a Lei Pelé. A única mudança do novo texto é a inclusão de atletas e árbitros na distribuição percentual dos direitos de transmissão pagos pelas emissoras de TV.

Imediatamente após a publicação, a MP 984 foi muito criticada por pessoas influentes no meio do futebol por conta das articulações políticas envolvendo o presidente Bolsonaro e o presidente flamenguista Rodolfo Landim. Na época, o Flamengo estava sem contrato com a Globo para a transmissão do Campeonato Carioca e, por isso, seria o único clube imediatamente beneficiado pelo texto.

Apesar da grande discussão causada, a MP 984 acabou caducando após não ser votada pela Câmara dos Deputados dentro do tempo estipulado. Uma das especulações é de que o presidente da casa na época, Rodrigo Maia (DEM-RJ), articulou-se com os deputados para que o projeto fosse engavetado devido a desavenças políticas com Bolsonaro.

Agora o cenário é diferente. Com a mudança na presidência da Câmara após a eleição de Arthur Lira (PP-AL), o presidente Jair Bolsonaro está confiante de que conseguirá fazer a nova MP do Mandante triunfar. É preciso esperar, mas tudo leva a crer que um novo texto sobre o tema trará de volta a insegurança jurídica e judicialização do futebol brasileiro.

“Se realmente houver essa MP, é mais uma oportunidade para que o Congresso Nacional discuta um novo marco regulatório para o futebol brasileiro, o único mercado entre os 10 maiores do mundo sem clube empresa e sem liga profissional que organize competições e negocie direitos coletivamente”, afirma Pedro Trengrouse, advogado especialista em direito desportivo e professor da FGV

Insegurança Jurídica

O que se viu algumas semanas após a MP 984 entrar em vigor foi um show de disputas jurídicas e muita insegurança. A Globo, emissora responsável por transmitir a maioria das partidas do Campeonato Brasileiro Série A, travou inúmeras batalhas judiciais com a Turner e principalmente com o Athletico.

O clube paranaense, único a não possuir contra de TV aberta com a emissora brasileira, assinou um acordo com a empresa Livemode durante a vigência da MP, para transmitir suas partidas da competição nacional através de seu pay-per-view próprio, o Furacão Play. A Globo reagiu e foi à Justiça para impedir a transmissão, alegando que seu contrato foi assinado com as equipes antes da assinatura da MP do Mandante, e que, portanto, o acordo deveria ser respeitado.

Para Pedro Juncal, advogado especialista em direito desportivo, uma possível segunda edição da MP do Mandante trará novas ações judiciais.

“Há quem acredite que possa gerar insegurança jurídica, pois há clubes que estão sob contrato e exclusividade de transmissão, enquanto outros não estão. Ao meu entender, porém, o contrato apenas faz lei entre as partes, não perpetuando seus efeitos sobre terceiros. Ainda assim, imagino que poderemos ter muitas ações judiciais durante as competições, já que as partes sempre buscarão o melhor para si”, avaliou.

“Há uma importante diferença no cenário político de momento em comparação com aquele existente quando da edição da MP 984. Ainda que isso não afaste a possibilidade de litígios (conforme os que se iniciaram em decorrência da MP 984, ou também em função de aspectos formais relacionados à edição dessa possível nova medida provisória), o atual contexto sugere uma maior probabilidade de sua conversão em lei pelo Congresso Nacional”, pondera Pedro Mendonça, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.

Reflexos econômicos

Apesar de caducar, a MP 984 trouxe reflexos para o futebol brasileiro. Um deles foi a desvalorização dos direitos de transmissão do Campeonato Carioca. Após a Globo rescindir o contrato em 2020, a Record será a nova casa da competição a partir deste ano.

A proposta apresentada pela Record pelos direitos do campeonato estadual foi de R$ 11 milhões (valor total a ser dividido pelos times) em 2021 e outros R$ 15 milhões no ano seguinte. A quantia representa 10% do que era pago pela Globo até o ano passado, que era em torno de R$ 100 milhões se tivesse todos os times.

“Cada vez que o setor público coloca a mão o mercado é reduzido. Esse novo contrato infinitamente menor demonstra que mudanças estruturais não podem misturar interesses individuais. Não há quem pague o que a Globo paga. A questão é que o mandante deveria ter o direito, mas a forma utilizada (através de MP) reduz o nosso mercado”, afirma o consultor de marketing Amir Somoggi.

“Continuo achando que não havendo negociação coletiva poderemos ter uma redução e, por outro lado, um potencial crescimento na disparidade de receitas televisas entre os clubes, o que naturalmente pode levar a um maior desequilíbrio competitivo. Acredito que qualquer alteração do direito de arena deva ser realizada com prévia discussão e debate de ambos os lados, os que apoiam e os que não, o que novamente não parece ter ocorrido”, analisa Juncal.

Se o ambiente for o mesmo vivenciado pelo o da MP 984, os clubes poderão ter perdas enormes em suas receitas.

“O ambiente criado pela MP, com uma possível judicialização e falta de segurança jurídica dos direitos de TV, pode causar um estrago ainda maior que a própria crise do coronavírus. Segundo estudo recente da Sports Value, as receitas dos top 20 clubes do Brasil podem cair R$ 2,5 bilhões em 2021 por conta dos impactos da crise. Deste total, os direitos de TV podem representar R$ 500 milhões em perdas de receitas”, completa Amir.

Crédito imagem: Estadão Conteúdo

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