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Mundial na Arábia Saudita é derrota da política de Direitos Humanos da FIFA

A Fifa decidiu: irá levar o próximo Mundial de Clubes para a Arábia Saudita. Uma escolha que não representa um crime, mas que – sem dúvida – é mais uma derrota para a política de direitos humanos da entidade.

A Arábia Saudita é um país que não respeita a proteção internacional de direitos humanos. Segundo a Anistia Internacional, o país pratica uma repressão implacável contra ativistas pacíficos, jornalistas e académicos, está todos os anos no topo dos países que mais praticam a pena de morte, com dezenas de pessoas executadas a cada ano, tem uma política discriminatória contra mulheres e não permite a liberdade religiosa, a tortura é instrumento rotineiro de trabalho oficial e o país é acusado de matar e esquartejar um jornalista no exercício da profissão.

Teria mais, mas dá para parar por aí.

Esporte como máquina de lavar imagem 

Claro que um país como a Arábia Saudita, assim como recentemente a China, o Qatar e a Rússia, usam de eventos esportivos para tentar melhorar sua imagem internacional. É o que se passou a chamar de Sportswashing. 

O Sportwashing é uma estratégia de marketing que utiliza o esporte para reposicionar a imagem de uma marca, produto ou país. Uma estratégia antiga, usada por Adolf Hitler nos Jogos Olímpicos de 1936 para propagar a ideologia nazista, por exemplo.

A Arábia Saudita faz o papel dela, mas a Fifa entrar nessa que nos leva a uma reflexão necessária. A entidade realmente leva a sério a política de direitos humanos que tem?

Ao levar o Mundial para o país asiático, a entidade esquece direitos universais e também a própria política interna da entidade, que traz no Estatuto a proteção de direitos humanos

A política de Direitos Humanos da Fifa 

É importante entender que o fato de levar a Copa ou um Mundial para um país que desrespeita direitos humanos não é um crime. Pronto. Pessoas viajam para lá para fechar negócios sem cometer crime algum. Mas lá estando, não permitir atos em defesa de direitos humanos seria possível? Creio que não. É nessa permanente contradição que a Fifa insiste em ficar.

Esporte não se afasta do direito e o direito tem como base a proteção de direitos humanos. A Declaração Universal de Direitos Humanos, tratados internacionais e os próprios regramentos internos da Fifa reforçam esse compromisso inegociável.

Basta dar uma olhada no estatuto da entidade, a “constituição” do movimento privado do futebol.

No art 4. 2, a entidade se declara neutra em matéria política e religiosa (tentando proteger a utopia da neutralidade esportiva). Mas complementa escrevendo que exceções se darão em casos que dizerem respeito aos objetivos estatutários da Fifa.

Um pouquinho antes, o artigo 3 do estatuto diz que a Fifa protege direitos humanos.

A entidade traz ainda a Política de Direitos Humanos apresentada em 2017 e um novo Código Disciplinar que se tornou mais rigoroso no combate ao preconceito.

Mudanças vieram depois de escândalo

Depois do Fifagate – escândalo de corrupção que derrubou a cúpula da entidade – a FIFA criou uma agenda positiva e estabeleceu expressamente compromisso de se articular construtivamente com os Estados para sustentar a sua política de direitos humanos.

Um dos avanços significativos foi o de que a observância desses direitos passaria a ser critério para a escolha das sedes dos eventos da entidade. Na escolha da sede da Copa de 2026, critérios de complicande e de direitos humanos foram colocados como indispensáveis para a escolha do país sede.

No livro “Lex Sportiva e Direitos Humanos: Entrelaçamentos Transconstitucionais e Aprendizados Recíprocos”, Vinícius Calixto explica:

“A escandalização gerada pela deflagração dos esquemas de corrupção aliada aos problemas envolvendo violações de direitos humanos, com destaque para a situação dos trabalhadores migrantes no Catar, e a necessidade de retomar a credibilidade da instituição fizeram com que a FIFA tomasse medidas para retomar a sua credibilidade, buscando promover maior democracia, transparência e accountability, e mudando sua postura frente à proteção e promoção de direitos humanos”.

A partir dessa nova política, a organização mandava um recado de que exigiria que as revisões de direitos humanos fizessem parte do processo de licitação de seus eventos.

E agora? 

Mas a associação com países que violam direitos humanos segue forte, como na escolha da Arábia Saudita como sede do Mundial de Clubes. E fica cada vez mais difícil para a entidade convencer a opinião pública de que realmente está comprometida com sua política.

A verdade é que a Fifa precisa decidir se abraça ou não sua política de direitos humanos. A autorregulação não pode ser só propaganda institucional, precisa ser guia concreto de conduta.

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