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NBA e Covid-19

A pandemia de Covid-19 tem sido tema recorrente em nossa coluna. Mas não há como ser diferente, diante da realidade que tem sido igualmente recorrente no Brasil: o avassalador e trágico crescimento dos números de casos e mortes nas últimas semanas nos relembra a gravidade da situação.

É nesse contexto que diversas competições esportivas vêm sendo impactadas. No automobilismo, a própria promotora da Stock Car decidiu pelo adiamento da primeira etapa do campeonato 2021, inicialmente agendada para o dia 28 de março, em Porto Alegre. Já no futebol, a dinâmica vem sendo diferente: restrições à continuidade de campeonatos estaduais ocorrem à medida que diversas unidades federativas vêm estabelecendo normas que impedem a realização de eventos esportivos em seus territórios.

Recentemente, esse tema ganhou novos contornos. Primeiramente, a partir da paralisação do campeonato paulista de futebol em função de determinação do governo estadual – o que já suscitou a possibilidade de disputa da competição em estados vizinhos (o que já foi negado pelas autoridades do Rio de Janeiro e de Minas Gerais) ou de adoção de medida judicial visando a continuidade do evento. Em segundo lugar, devido à notícia de que o jogador Gabriel Barbosa foi flagrado em um cassino clandestino no fim de semana, em claro descumprimento das normas sanitárias vigentes (sem falar nas questões jurídicas concernentes à atividade do cassino em si).

Embora o atleta em questão não participe do campeonato paulista de futebol, tem se estabelecido uma relação entre os dois fatos. De um lado, clubes e federação defendendo a segurança de seus protocolos; de outro, o comportamento de um atleta sugerindo que esses protocolos são limitados na gestão dos riscos de contágio – uma vez que não restringem as atividades “extracampo” dos atletas e demais envolvidos na prática esportiva (por exemplo, membros da comissão técnica e demais funcionários dos clubes). Em meio a isso, são inevitáveis as comparações com métodos utilizados ao redor do mundo, e a NBA tem sido um dos exemplos comumente referidos.

A primeira lembrança vem da “bolha” instituída pela liga para a conclusão da temporada 19/20, que reuniu quase todas as franquias no complexo da Disney, em Orlando. Segundo noticiado pela imprensa norte-americana, os protocolos então aprovados pela NBA eram extremamente detalhistas, com normas inclusive sobre os momentos de lazer dos atletas. A título de ilustração, havia regras proibindo o compartilhamento de óculos na piscina, vedando a presença de carregadores de tacos nos campos de golfe, impedindo que o tênis de mesa fosse jogado em duplas e determinando que os baralhos utilizados em jogos de cartas (sempre usando máscara) fossem descartados. Em cerca de três meses, foi possível encerrar o campeonato e o modelo adotado se tornou um case de sucesso ao lidar com a pandemia.

Evidentemente, a “bolha” é de complexa execução para competições mais longas, que se desenvolvem ao longo de meses. Mais ainda considerando o calendário do futebol, que prevê a disputa de torneios simultâneos (por exemplo, campeonato estadual e Copa do Brasil ou Copa Libertadores); nesse caso, ainda que um estadual adotasse esse modelo, haveria a necessidade de que equipes saíssem ou entrassem na “bolha” vez ou outra, em função de partidas de outras competições. E aí o próprio modelo restaria prejudicado.

Mesmo num cenário sem competições simultâneas, a temporada 20/21 da NBA já não funciona no mesmo formato. Certamente, contribuiu para essa decisão a longa duração de uma temporada completa da liga. Assim, novos protocolos foram criados, adaptados à realidade fora da “bolha”.

Um fato, no entanto, chama a atenção. Em janeiro de 2021, mês no qual se observou o pico de casos e mortes por dia nos Estados Unidos, a NBA e a associação dos atletas que atuam na liga (National Basketball Players Association – NBPA), diante da gravidade da situação, anunciaram medidas adicionais ao protocolo já instaurado. Dentre elas, destacam-se restrições na circulação de atletas e demais pessoas envolvidas nas operações das equipes, pelas quais, quando não houvesse partidas fora de casa: (i) por pelo menos duas semanas, todos eram obrigados a ficar permanentemente em suas residências (quando não em viagem para disputa de partidas fora de casa); (ii) a saída da residência era permitida apenas para treinos nas instalações da sua franquia, para exercícios ao ar livre, para atividades essenciais ou em função de circunstâncias excepcionais; (iii) as interações fora do ambiente de trabalho eram limitadas a familiares e pessoas que trabalhassem ou vivessem na mesma residência.

É possível constatar, assim, que tanto no modelo de “bolha” quanto no atual regime, a NBA edita normas que vão além da esfera puramente esportiva, impondo regras que eventualmente limitam atividades “extraquadra” dos atletas e dos demais profissionais envolvidos. Vê-se aí uma importante diferença em relação ao que tem sido adotado como regra no futebol brasileiro – o que não significa que a NBA também não enfrente problemas: por exemplo, recentemente dois jogadores foram impedidos de participar do All-Star Game após terem contato com um barbeiro que testou positivo para Covid-19.

Enfim, é certo que há diferenças entre o basquete e o futebol, entre o modelo de franquias da NBA e o modelo associativo do esporte brasileiro, entre as legislações dos dois países. Também é verdade que, fora de uma “bolha”, parece não haver nenhum formato que elimine por completo os riscos e problemas associados à Covid-19. No entanto, a NBA pode, sim, servir de inspiração para a evolução permanente dos protocolos existentes no Brasil, como forma de proteger cada vez mais a saúde de todos os envolvidos e como meio de demonstrar a possibilidade de continuação das competições durante a pandemia.

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