A 5ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve o entendimento de instâncias inferiores e negou um recurso do Internacional que pretendia manter a dispensa por justa causa do zagueiro Dalton Moreira Neto, atualmente do Bangu, por ter participado de um torneio de várzea sem prévia autorização. A decisão foi sustentada após uma testemunhar comprovar de que houve autorização para a participação do campeonato amador por parte de um diretor do clube.
“A lição mais significativa se aplica às justas causas. O empregador precisa se ater ao motivo da época da rescisão, entregue por escrito. Ao que parece, o clube inovou, acrescentando outro durante o processo. Em relação à norma esportiva (art. 35, II, da Lei Pelé, que obriga a preservação das condições físicas), no caso, segundo o Acórdão, o atleta produziu prova de que um diretor autorizou a participação em evento amador. Foi justamente em virtude dessa autorização do clube que a justa causa foi revertida”, explica o advogado Rubens Gama, especialista em direito trabalhista.
O advogado Rafael Ramos, especialista em direito desportivo e trabalhista, conta que não existe nenhuma norma que proíba o pluriemprego/pluritrabalho, mas ressalta que o contrato especial de trabalho desportivo não pode ser acumulado com outra atividade atlética, ainda que não profissional, sob pena de violar a obrigação especial do art. 35, II, da Lei Pelé.
“Uma violação do art. 35, II, da Lei Pelé tem a ver com o objeto principal do contrato especial de trabalho desportivo, por isso pode ensejar justa causa específica deste tipo de contrato. Todavia, no caso em questão, o diretor do clube empregador (Internacional) autorizou a participação do atleta em competição amadora, comprovado nos autos por prova testemunhal, afastando a justa causa. Não cabe mau procedimento ou incontinência de conduta por usar uniforme com patrocínio de prostíbulo, uma vez que o atleta não é famoso, a competição não era transmitida e não foi descrita na rescisão como motivação para justa causa”, analisa o advogado.
Entenda o caso
Dalton foi contratado pelo Colorado em julho de 2010 e, durante o contrato, foi emprestado ao Athletico-PR e o Criciúma. Após o término do empréstimo, segundo ele, a diretoria o isolou do restante do grupo e o colocou para treinar “sem bola” em lugar distante do clube, onde ficavam os “Renegados do Beira-Rio”, o estádio do Internacional. Para o zagueiro, o clube tinha interesse em demiti-lo, e só não o fez porque teria de pagar uma multa pela rescisão do vínculo.
No final de 2013, Dalton quase foi emprestado novamente, desta vez para o América-RN. No entanto, a transação não aconteceu. Segundo o zagueiro, o Inter submeteu a cessão à quitação de parcelas salariais e de direito de imagem atrasadas, o que não foi aceito por ele. No dia seguinte, o jogador foi comunicado da dispensa por justa causa.
O Colorado justificou que o motivo da dispensa seria a participação de Dalton em um campeonato de várzea na cidade gaúcha de Viamão, em setembro daquele ano, sem autorização. Ainda segundo o clube, o atleta utilizava nesses jogos um uniforme patrocinado por uma casa de eventos eróticos, o que poderia causar dano à imagem do Inter.
“Não se pode admitir que um atleta profissional de futebol venha participar de ‘jogos de várzea’, colocando sua integridade física em risco, nem utilizar uniforme do time amador com patrocínio de casa noturna erótica, o prostíbulo ‘La Barca’”, diz um trecho da sustentação feita pelo Internacional.
Acontece que uma das testemunhas disse que Dalton e outros jogadores considerados “excluídos” pediram a um dos diretores do Inter para fazer academia e jogar campeonatos de várzea, pois estavam perdendo preparação física. Segundo a mesma testemunha, a autorização foi dada por esse diretor, conhecido como ‘Chumbinho’.
Decisões da Justiça
Em 2015, a 10ª Vara do Trabalho de Porto Alegre reverteu a justa causa, por considerar a pena desmedida em relação à falta cometida. Entre outros aspectos, o juízo disse que o clube não conseguira comprovar a necessidade de autorização para a participação em jogos amadores.
Em relação ao dano à imagem, o juízo entendeu que o jogador não era conhecido por grande parte dos torcedores, pois havia atuado poucas vezes pelo Internacional, e não se poderia atribuir a ele ofensa à imagem do clube “por opções que dizem respeito estritamente à parcela privada de sua vida”.
A decisão da 10ª Vara do Trabalho de Porto Alegre foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, ao verificar que uma cláusula contratual exigia a especificação, por escrito, dos motivos para a justa causa. Nesse sentido, o motivo que constava da rescisão – a participação sem consentimento no campeonato amador – foi derrubado pelo depoimento da testemunha.
Assim, para o TRT-4, o motivo real seria o uso de uniforme patrocinado pela casa noturna. Porém, esse fato não foi apontado no ato de rescisão e, portanto, não poderia ser alegado na ação.
No TST, por decisão unânime, o relator do caso ministro Douglas Alencar Rodrigues, observou que, diante da fundamentação do TRT, pautada na desconstituição do motivo alegado para a dispensa e constante do termo de rescisão, o caso não se enquadra como incontinência de conduta ou mau procedimento (artigo 482, inciso “b”, da CLT) nem como violação do dever do atleta de preservar suas condições físicas (artigo 35, inciso II, da Lei Pelé – Lei 9.615/1998).
A carreira de Dalton
Formado na base do Fluminense, Dalton ganhou projeção no ano de 2009, quando foi titular no vice-campeonato da Copa Sul-Americana e na arrancada que livrou o Tricolor das Laranjeiras do rebaixamento à Série B do Brasileiro. Ele também atuou pelo Criciúma, Athletico-PR, Fort Lauderdale Strikes (Estados Unidos), RB Brasil, Luverdense e Bangu.
Crédito imagem: Jeremias Wernek/UOL
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