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Nome, imagem e semelhança

Uma receita de US$ 1,16 bilhão. Esse foi o resultado financeiro, no ano de 2021, da NCAA (National Collegiate Athletic Association), associação fundada por Theodore Roosevelt Jr., Presidente dos Estados Unidos entre 1901 e 1909, e que congrega as instituições responsáveis pelo esporte universitário norte-americano.

Sabe quanto desse valor foi diretamente para o bolso dos atletas das principais equipes universitárias do país? Zero!

Isso mesmo. Até a histórica decisão da Suprema Corte no caso NCAA vs Alston em 21 de junho de 2021, os atletas universitários eram considerados “amadores” e não podiam ganhar dinheiro a partir da exploração econômica de suas marcas pessoais.

Quando colocado em perspectiva o imenso volume financeiro gerado por esses mesmos atletas para as suas respectivas universidades, isso era incrivelmente contraditório.

Ressalvando-se a importância de outros processos judiciais na batalha antiga dos atletas universitários por compensação financeira, foi a partir do julgamento do caso NCAA vs Alston que a sigla NIL, correspondente às iniciais de name (nome), image (imagem) e likeness (semelhança/aparência) passou a ser um elemento fundamental no ecossistema esportivo dos Estados Unidos.

Isso porque, como consequência do caso, o Conselho de Administração da Divisão 1 da NCAA aprovou que, a partir de 1º de julho de 2021, os alunos-atletas passariam a poder receber o chamado “NIL money”, ou seja, valores decorrentes de acordos comerciais para, por exemplo, promover produtos, assinar contratos de patrocínio ou aparecer em jogos de videogame.

Quem acompanha a coluna já conheceu a história de Ed O’Bannon, um ex-jogador de basquete que ajuizou, em julho de 2009, uma ação contra a NCAA e contra a Collegiate Licensing Company por ter tido a sua imagem e atributos usados, sem autorização, no jogo NCAA Basketball 09, da EA Sports.

Embora o nome do atleta não aparecesse, o jogo de videogame continha um jogador da mesma posição de O’Bannon, com o mesmo número na camisa e com as mesmas características físicas e técnicas (altura, peso, tom de pele, uso predominante da mão esquerda).

De julho de 2021 para cá, jovens como Ed O’Bannon têm lucrado, oficialmente, com o licenciamento de seus nomes, imagens e características pessoais.

O primeiro estado norte-americano a regular o NIL em sua legislação foi a Califórnia, por meio do “Fair Pay to Play Act”, utilizado como base pelos outros 32 estados que aderiram à política.

Porém, além das legislações dos 18 estados remanescentes, os Estados Unidos ainda carecem de uma norma federal que harmonize o tema.

Os impactos do NIL, naturalmente, já vêm sendo sentidos também nas principais ligas profissionais. Inúmeras equipes esportivas, de olho na popularidade de atletas universitários em seus mercados locais, começaram a aproveitar a possibilidade de remunerá-los por autógrafos, aparições em eventos e ações de marketing digital.

Tais negócios são permitidos no atual sistema, uma vez que os alunos-atletas envolvidos estão sendo pagos exclusivamente pela promoção de equipes, e não por competirem profissionalmente por elas.

Aliás, se não houvesse uma restrição dessa natureza, todo o esporte dos Estados Unidos seria profundamente transformado, com as universidades mais poderosas simplesmente pagando mais dinheiro para recrutar os melhores atletas.

Ainda assim, como seria de se esperar, violações vêm ocorrendo, atraindo ações e reações na esfera jurídica.

No último dia 23 de fevereiro, um juiz federal determinou, em caráter liminar, que a NCAA não poderia aplicar sanções a quem extrapolasse os limites da regulação do NIL.

Dias depois, o Conselho de Administração da Divisão I instruiu os funcionários responsáveis pela fiscalização de irregularidades a suspender as investigações envolvendo a participação oculta de terceiros em pagamentos a alunos-atletas.

Um exemplo para ilustrar as questões decorrentes do NIL é o da atleta Caitlin Clark, fenômeno do basquete feminino que, por haver optado pela inscrição no próximo Draft da WNBA, não disputará seu último ano como aluna da Universidade de Iowa.

No cenário pós-NIL, Caitlin Clark não precisava se tornar profissional para ganhar dinheiro, uma vez que ela já possui contratos com marcas do calibre de Nike, Gatorade e State Farm.

Certamente, ela continuará ganhando mais em decorrência desses acordos do que com os salários pagos na WNBA, em que o valor base para uma novata é de US$ 76.535 na temporada inicial.

Se Clark, que deve ser selecionada com a primeira escolha no Draft, for a novata do ano na WNBA, ela receberá um bônus de US$ 5.150, mais US$ 2.575 se for nomeada para o Jogo das Estrelas, com a chance, ainda, de faturar com outros potenciais incentivos (como participar do torneio de arremessos de 3 pontos).

Outra opção para ela seria jogar no exterior, em equipes da Ásia e da Europa que chegam a pagar salários de mais de US$ 500.000 anuais a jogadoras norte-americanas de basquete.

Logo, graças ao NIL, Caitlin Clark poderia, se fosse apenas pelo aspecto financeiro, continuar em Iowa para concluir a faculdade, certo? Não haveria, sobre ela, a pressão financeira que leva muitos jovens a, assim que elegíveis, “pularem” para uma liga profissional, como acontece com frequência na NBA e na NFL.

Para Caitlin Clark, que já estabeleceu todos os recordes possíveis de pontuação no basquete universitário como um todo (entre homens e mulheres), que já foi eleita em três ocasiões a melhor jogadora do país e que já liderou a NCAA em pontos e assistência em uma mesma temporada, a motivação para deixar a faculdade parece, de fato, ser a ambição esportiva.

Mesmo com o NIL, atletas menos carismáticos ou que não sejam automaticamente famosos como Bronny James (filho de LeBron), Arch Manning (sobrinho de Peyton e Eli Manning) e Shedeur Sanders (filho de Deion Sanders) talvez prefiram tentar a sorte em algum Draft.

Programas independentes de formação de atletas como o Overtime Elite, que se diferenciavam da NCAA por remunerem jogadores (o valor mínimo é de US$100.000 por ano), tenderão a perder força.

E atletas de exceção, como Caitlin Clark, continuarão ditando as próprias regras, dentro e fora das “quatro linhas”.

Crédito imagem: Market Watch Photo Illustration/Getty Images/iStock

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