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O boxe cubano: profissionalismo, deserção e embargos americanos

Por Rafael Ramos e Elthon Costa

A Federação Cubana de Boxe (FCB) anunciou, em abril de 2022, um acordo histórico com a Golden Ring Promotions para permitir que os lutadores cubanos em seu sistema amador/olímpico se tornem profissionais e lutem no exterior, permitindo o boxe profissional pela primeira vez em sessenta anos[1].

O boxe profissional não é reconhecido em Cuba desde 1962, durante o governo do falecido líder Fidel Castro, que considerou esse aspecto do esporte como corrupto. O boxe foi limitado a um esporte amador desde então, com seus participantes incentivados a lutar pela glória nacionalista. Nesse período, as equipes de boxe de Cuba ganharam 78 medalhas olímpicas, incluindo 41 de ouro – quase metade do total de 84 do país em 15 esportes diferentes.

O sistema esportivo em vigor na ilha concede a seus atletas um salário mensal e, nos últimos anos, incentivos em dinheiro ou bens como carros e casas, longe dos ganhos milionários que eles poderiam obter com acordos internacionais. Os boxeadores cubanos tem tido um sucesso considerável no nível profissional, embora por meio de deserção.

Pelo novo acordo, os boxeadores treinarão em Cuba e participarão dos outdoors com seus treinadores e médicos. Eles não representarão nenhum clube, mas competirão sob o nome de “Domadores de Cuba”. De qualquer forma, a prioridade para os atletas será sempre seus compromissos olímpicos antes das lutas acordadas.

O vice-presidente do órgão oficial INDER (Instituto Nacional de Deportes, Educación Física y Recreación de Cuba), Ariel Sainz Rodríguez, anunciou[2] que os 20% concebidos para a Federação Cubana de Boxe como pagamento pelo direito de treinamento serão utilizados fundamentalmente para o desenvolvimento da base, e estabeleceu cinco compromissos competitivos já identificados para o corrente ano, o primeiro deles em maio. Comentou também que, que de acordo com a atual política de estímulo a todos os esportes, a renda será destinada principalmente aos atletas (80%), e também beneficiará treinadores (15%) e pessoal médico (15%).

Ao contrário do beisebol, vôlei e basquete, o boxe nunca deixou as fileiras amadoras. Ele fez apenas algumas incursões no World Series of Boxing (WSB), o circuito profissional criado pela AIBA na última década. Coincidentemente, a entrada dos boxeadores cubanos no mundo profissional ocorre em um momento em que a disciplina corre o risco de desaparecer do programa olímpico dos Jogos de Los Angeles em 2028[3].

Longe da tutela do Estado, o pugilismo inexiste em Cuba, e convites aceitos por boxeadores para carreiras fora do país eram, até então, interpretados como traição ao país. Durante muito tempo, principalmente enquanto o país latino-americano mantinha relações estreitas com a União Soviética, o boxe local não sofreu grandes dificuldades para manter seus grandes nomes perto de Havana.

Em 2007, depois de terem abandonado a delegação cubana que participava dos Jogos Pan Americanos no Rio de Janeiro, dois boxeadores cubanos, Erislandy Lara e Guillermo Rigondeaux, foram presos no Brasil e deportados para Cuba. Na ocasião, a Polícia Federal se manifestou alegando que a deportação, diferentemente da extradição ou expulsão, é um ato administrativo privativo da instituição, previsto na lei do estrangeiro, não sujeito ao Poder Judiciário ou a qualquer outra instância.

Mesmo diante das justificativas, o debate sobre o caso foi parar em Brasília, usado, oportunamente, como munição política. Então integrantes da oposição ao então governo Lula criticavam a interferência brasileira e apontavam um equívoco de ordem diplomática.

A profissionalização do boxe cubano é um grande negócio, finalmente permitindo que atletas de um dos países mais ricos em talentos do planeta sejam compensados ​​por seu ofício sem arriscar suas vidas e as de suas famílias em fugas de sua ilha. Também funciona bem para o programa amador, pois agora há muito menos risco de suas potências fazerem uma pausa durante eventos internacionais.

A questão que agora está na cabeça dos fãs de boxe é se o embargo dos Estados Unidos[4], em vigor desde 1962 – que impede empresas americanas e empresas organizadas sob a lei ou de propriedade majoritária de cidadãos americanos, de realizar comércio com interesses cubanos. sendo o embargo comercial mais duradouro da história moderna – permitirá que os campeões cubanos participem dos principais eventos de boxe profissional, que geralmente são organizados nos Estados Unidos.

Crédito imagem: Getty Images

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Elthon Costa é advogado trabalhista e desportivo. É Sócio-Diretor Jurídico e Desportivo no Todde Advogados e Membro da Diretoria e Pesquisador do Grupo de Estudos e Desporto São Judas (GEDD-SJ) e da Comissão de Direito Desportivo da OAB/DF.

REFERÊNCIAS

FREITAS, Bruno; DEHÒ, Maurício. Em 12 Rounds: histórias do boxe no Brasil, de Jofre a Popó, dos Zumbano a Tyson. Rio de Janeiro: Via Escrita, 2014. 218 p. ISBN 978-85-67831-05-3.

RODRIGUEZ, Robert G. The regulation of boxing: A history and comparative analysis of policies among American States. Carolina do Norte, EUA: McFarland & Company, Inc., Publishers, 2009. ISBN 978-0-7864-3862-4.

[1]FUCS, Daniel. Profissionalismo oficial para cubanos era esperado desde 2021. Blog do Daniel Fucs, Site, 5 abr. 2022. Disponível em: https://ge.globo.com/boxe/blogs/blog-do-daniel-fucs/post/2022/04/05/profissionalismo-oficial-cubanos.ghtml. Acesso em: 14 abr. 2022.

[2]boxeo cubano anuncia presencia en circuitos profesionales. Site, JIT. 4 abr. 2022. Internacionales. Disponível em: http://www.jit.cu/NewsDetails.aspx?idnoticia=309410. Acesso em: 14 abr. 2022.

[3]OLYMPICS: Boxing, weightlifting & modern pentathlon not in initial programme for Los Angeles 2028. BBC, Site. 3 fev. 2022. Disponível em: https://www.bbc.com/sport/olympics/60240238. Acesso em: 14 abr. 2022.

[4]CUBA Sanctions. U.S. Department of State, 1 fev. 1962. Disponível em: https://www.state.gov/cuba-sanctions. Acesso em: 14 abr. 2022.

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