Por Higor Maffei Bellini
Olá a todos, espero que estejam com boa saúde, que tudo esteja seguindo bem e com uma boa memória, aquela que permite que lembremos fatos acontecidos em jogos, aquelas histórias de viagens para jogos “fora de casa”, aquele jogo de meio de tabela que foi em uma quarta feira a tarde em horário de expediente, que você foi torcer “escondido”, para ninguém no emprego saber – amigos ou chefes – ou ainda recordar aquele lance bacana envolvendo uma jogadora qualquer.
Como vocês já sabem, trabalho com jogadoras de futebol, por isso em respeito às minhas clientes, muitas das quais posso chamar de amigas, daquelas eu seu desejo sempre um bom jogo e recordo dos aniversários para “dar os parabéns”, uso sempre o termo “jogadora” e não “jogador”.
Utilizar tantas vezes na introdução a expressão “recordar” ou “lembrar” traz sempre um complemente de algo bom que passou e que ficou guardado em nossas memorias; ou então, que pode ser revisitado em sites, vídeos ou em áudios em programas esportivos, em sites que sobrevivem falando da memória esportiva ou ainda em jornais esportivos.
Contudo, nem sempre a memória esportiva está ligada a fatos pelos quais as jogadoras envolvidas desejam ser lembradas, uma vez que passado o calor do momento perceberam que erraram, que de cabeça fria não fariamnovamente, que evoluíram e mudaram para melhor ou que ainda tenham sido perdoadas pelos demais envolvidos.Fatos que não podem ficar perseguindo estas atletas pelo restante da sua vida terrena, por longos e longos anos, voltando a assombrar as atletas de tempos em tempos, que passam a ser citadas como exemplos de comportamentos inadequados dentro dos quadros linhas de jogos, o até mesmo fora delas, mesmo após já terem cumpridos as penas esportivas ou paga a indenização, quando o caso; ou ainda, quem sabe tendo efetuado a transação penal para não discutir a sua culpa naquele lance.
Há ainda de ser lembrado que a imagem da atleta, ou ex-atleta, é o seu maior bem, é o que lhe garante convites para participar de comerciais, eventos corporativos ou ainda aqueles encontros entre torcedores e jogadores, nos quais as atletas podem receber um cache pela sua participação, oque pode ser a sua fonte principal de sustento ou como complemento da renda, ou até mesmo pode, por exemplo, ser utilizado para doações de caridade.
Por ser a imagem da atleta o seu maior bem, aquele que pode lhe garantir o sustento por todo o final da sua existência encarnada, é importante que a atleta possa solicitar e receber o direito ao esquecimento, o direito de não ficar sendo lembrada e marcada por um ato insensato praticado dentro do campo de jogo.
Para deixar ainda mais explicito o que estou dizendo é importante trazer a nomenclatura deste instituto em outras línguas. Nos Estados Unidos este instituto é conhecido como “the right to be let alone”, ao passo que nos países de língua espanhola é chamado de “derecho al olvido”.
Mas Higor, o Supremo Tribunal Federal já não decidiu a questão do direito ao esquecimento, tendo já até firmado uma tese?
Sim, decidiu, mas é justamente da conclusão do julgamento que veio a premissa para este artigo. Ficou estabelecido:
“É incompatível com a Constituição Federal a ideia de um direito ao esquecimento, assim entendido como o poder de obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos e licitamente obtidos e publicados em meios de comunicação social – analógicos ou digitais. Eventuais excessos ou abusos no exercício da liberdade de expressão e de informação devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais, especialmente os relativos à proteção da honra, da imagem, da privacidade e da personalidade em geral, e as expressas e específicas previsões legais nos âmbitos penal e civel”.
Havendo o excesso, que aqui entendo ser a utilização da imagem em compilações com títulos vexatórios, ou com uma clara intenção de deixar constrangidos aqueles que ali tem as suas imagens expostas. Usar a imagem de uma pessoa – que foi capturada em um jogo de futebol, ou de qualquer outro esporte relativo a um lance que aconteceu durante o jogo, seja uma falta violenta, uma agressão ou até mesmo uma cusparada de um atleta em outro, durante ou após o termino do jogo, que estava disponível na internet, ou pega da televisão que gerou a imagem – não pode ser aceito como algo correto, que não gere o dever de quem a utilizou indenizar a atleta que teve a sua imagem explorada indevidamente.
Indevidamente utilizaram a imagem, como assim?
Sim, porque se o atleta não permitiu o seu uso por quemfez a compilação, ou um meme, este uso é não autorizado, é indevido; até porque aquela imagem foi gerada por uma outra empresa, com uma finalidade distinta, que a princípio era informativa e que ainda a princípio foi devidamente paga pela empresa que gerou as imagens aos clubes, que pagam direito de arena a atletas.
A única utilidade permitida daquela imagem gerada durante o lance, porque o pagamento do direito de arenaserve para isso, seria a de levar o jogo aos torcedores do time, ou aos interessados em futebol feminino. Sendo ainda possível ser utilizada em matérias jornalistas pelos veículos de comunicação. Assim, foi permitido pela decisão do Supremo revisitar aquele fato com a intenção jornalística de recontar a história para uma geração futura, mantendo-se a continuidade de conhecimento entre as gerações.
Contudo, nunca poderá ser utilizada por terceiros, ainda mais quando utilizada, sem a autorização e sem pagar àatleta por sua utilização aquela imagem compilada ou mesmo um meme.
Até porquê, se pedir autorização de uso para a atleta provavelmente será negado, já que a presunção logica é a de que ninguém permitiria a utilização da sua própriaimagem para prejuízo junto a torcedores, patrocinadores ou outras pessoas envolvidas que também podem ver aquele episódio esquecido pela ação das brumas do tempo.
Como lecionaram Louis Brandeis e Samuel Warren, em linhas muito gerais ainda em 1890, portanto há mais de um século, ambos já definiam a importância do direito àprivacidade, o que podemos colocar como sendo uma demonstração do direito à dignidade da pessoa humana,visto que é direito da jogadora ter a sua intimidade preservada, não tendo a sua imagem utilizadas por terceiros para lhe retirar a paz e a marcando para todo o sempre como uma pessoa que cometeu aquela atitude insensata
Não é sem proposito que citamos estes autores. O fazemos por terem há cento e trinta anos tratado do tema, ainda que à luz da tecnologia e da sociedade daquela época, mas que com as devidas atualizações se tornam validados até os dias atuais. E demonstram a importância de ser possível acessar as informações e notícias do passado para efeitos de estudos.
E como os leitores podem observar o que fizemos ao citar todos os autores foi os enaltecer, demonstrando a sua importância para fundamentar a construção deste texto, o que gera problemas aos autores citados e ao Higor, autor deste. Ou seja, o bom uso da informação, ou da imagem, é valido e permitido.
O que não é permito, e se acontecer gerar repercussão civil com pedido de danos morais e materiais se for o caso, é a perda de um contrato de patrocínio, ou ainda a repercussão penal no caso da compilação, da narração ou da manchete/título de vídeos que já trazem uma carga negativa para os ali retratados.
Assim, podemos concluir que a atleta tem o direito – de uma vez utilizada a sua imagem por terceiros, em especial quando em montagens e compilação efetuadas por estes,que não quem capitou originalmente as imagens, com a finalidade colocar a atleta em uma situação vexatória ou complicadora da sua carreira, por não respeitar a sua privacidade, intimidade ou dignidade, ou ainda por não preservar a sua imagem, já que todos estes fatores anteriormente citados a compõe, seja a auto imagem da atleta ou a imagem que as outras pessoas fazem dela –pedir em primeiro lugar a retirada do vídeo ou do meme, pedido a ser encaminhado à empresa que administra as plataformas onde existe esta divulgação e, depois, o pedido de reparação civil contra a pessoa que efetuou a compilação ou fez o meme, utilizando indevidamente a imagem da atleta.
É de suma importância fazer esta discussão não apenaspelo lado jurídico da questão, mas também pelo lado da gestão de imagem das jogadoras, possibilitando assim a estas terem os meios necessário para encaminhar os pedidos ao poder judiciário.
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