A nossa Constituição Federal de 1988 inovou, até mundialmente, e se tornou também a Lei Maior do esporte brasileiro. Ela entendeu a importância da área, sua influência na cultura brasileira, e suas necessidades jurídicas.
A Carta de 88 atribuiu autonomia à Justiça Desportiva para solucionar os litígios responsáveis por influenciar diretamente o campo esportivo, como infrações às regras do jogo, à disciplina e à organização do desporto. E só. Por isso que se vê ações aos montes na Justiça Trabalhista, uma vez que o que se está discutindo ali são questões relativas a trabalho – só para dar um exemplo.
Ou seja, a Justiça Desportiva é uma justiça especializada, que ganhou autonomia constitucional para decidir sobre determinadas questões, mas possuindo uma eficácia limitada. E é nessa limitação que esta garantido o Livre Acesso à Justiça – princípio da Inafastabilidade da Jurisdição –, expresso na Constituição no art 5º, inciso XXXV.
E por que é importante existir uma Justiça Desportiva?
Simples: por causa da especificidade, da natureza particular do mundo do esporte.
Alváro Melo Filho, um dos maiores pensadores do Direito Esportivo brasileiro, na obra “Desporto na Nova Constituição” , escreve sobre o esporte na Constituição de 1988:
“Além das idéias e idéias subjacentes às normas desportivo-constitucionais, seu conhecimento é essencial e vital, conquanto caberá às entidades, órgãos e pessoas que integram a comunidade desportiva brasileira zelar pela eficácia jurídica e social de tais noras e fazer valer o direito nelas protegidos e assegurados
É no art 217 que a CF, nos § 1º e § 2º, que estão definidas a autonomia e limitação dessa justiça especializada.
Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:
I – a autonomia das entidades desportivas dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento;
II – a destinação de recursos públicos para a promoção prioritária do desporto educacional e, em casos específicos, para a do desporto de alto rendimento;
III – o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não- profissional;
IV – a proteção e o incentivo às manifestações desportivas de criação nacional.
§ 1º – O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei.
§ 2º – A justiça desportiva terá o prazo máximo de sessenta dias, contados da instauração do processo, para proferir decisão final.
§ 3º – O Poder Público incentivará o lazer, como forma de promoção social.
Como esporte se organiza juridicamente
O esporte se organiza dentro do princípio da autonomia esportiva, garantida inclusive como mostrado acima pela nossa Constituição Federal. O inciso I do artigo 217 da Constituição Federal garante essa autonomia às entidades desportivas, dirigentes e associações, quanto a sua organização e funcionamento.
E por que precisa ser assim?
Um exemplo: imagine um Campeonato Brasileiro em que o VAR é permitido em São Paulo e Rio Grande do Sul, mas proibido no Rio de Janeiro e na Bahia… Ou um campeonato de vôlei em que transgênero pode jogar na França e nos Estados Unidos, e não no Brasil e no Irã.
Como ficaria um dos princípios mais caros ao esporte, o da paridade de armas, que garante equilíbrio entre os competidores?
Por isso existe a pirâmide associativa do esporte. Clubes são filiados a federações, que são ligados a confederações, que seguem (todas) as determinações do Comitê Olímpico Internacional (no caso do futebol, da FIFA). Essa associação é voluntária, e no direito esportivo é conhecida como Ein Platz Prinzip.
E TODOS precisam cumprir as mesmas regras. Inclusive o atleta, que ao assinar com um clube, se compromete com todas as regras e procedimentos da modalidade da qual o clube é filiado nessa cadeia, como numa espécie de contrato de adesão.
Ter uma justiça especializada e um caminho jurídico que respeite essa cadeia na busca de solução para litígios esportivos passa a ser crucial para a sobrevivência do movimento esportivo da forma como é organizado hoje.
Por isso que a CF também dá poderes a essa justiça especializada, permitindo a apreciação posterior do Poder Judiciário, sem nenhuma afronta ao acesso a justiça.
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