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O futebol agoniza diante dos escândalos de manipulação de resultados e a regulamentação das apostas é a única solução

Quando vejo a atual situação do futebol brasileiro lembro do início da pandemia da COVID. Milhares de pacientes agonizando em leitos de  UTI ou mesmo nos corredores de hospitais à espera da chegada de medicamentos vindos do exterior que não chegavam. As negociações feitas pelo Governo brasileiro com as farmacêuticas estrangeiras se arrastava, não havia um consenso sobre as condições do negócio. Enquanto isso as famílias iam apenas computando as perdas sofridas e seguiam sonhando com a vinda de remédios e vacinas. Os médicos, completamente perdidos, sem orientação para enfrentar essa pandemia, aprendiam na prática como combater a doença e a reconfortar o coração das famílias abaladas com os severos impactos da COVID.

O futebol brasileiro vive realidade muito semelhante. Os escândalos de corrupção no futebol são noticiados dia após dia. O Ministério Público quanto mais investiga, mais fraudes descobre. Ninguém sabe ao certo onde as apurações podem levar. Proliferam-se os casos de venda de resultados no futebol brasileiro. Os espectadores e fãs do esporte veem a credibilidade do esporte jogada às traças. Enquanto a paixão nacional agoniza em um leito, os Ministérios Públicos estaduais (assim como os médicos) lutam contra o mal da manipulação de resultados sem dispor das ferramentas adequadas.

Vendo essa situação caótica de camarote, os brasileiros aguardam com ansiedade alguma solução que possa reavivar o nosso futebol. E qual seria o remédio para combater o mal da manipulação de resultados? Na verdade, não é um único medicamento que vai salvar o futebol brasileiro, mas um coquetel que reúne uma série de medidas que, em conjunto, podem tirar o esporte da UTI.

Esse coquetel medicamentoso que o fã do esporte tanto aguarda no Brasil é composto por três pilares: (i) a regulamentação das apostas esportivas; (ii) a educação e a  informação – principalmente de atletas, técnicos, dirigentes e árbitros –  sobre os riscos envolvidos nas fraudes a resultados; e (iii) a qualificação de pessoas e o investimento em equipamentos que contribuam para o monitoramento dos eventos esportivos.

Esses três elementos são chave para que o futebol brasileiro ganhe sobrevida e tenha condições de se levantar da maca. Mas nada poderá ser feito se o primeiro passo não for dado e ele se chama regulamentação. Somente com regras claras que tragam diretrizes para todos os envolvidos é que será possível combater a manipulação de resultados e preservar a integridade do esporte. Digo isso porque em mercados regulados o índice de fraudes no esporte é baixíssimo.

Em pesquisa divulgada pela  International Betting Integrity Association (IBIA),[1] em um horizonte de 650.000 eventos esportivos analisados por ano, entre 2017 a 2020, 99,96% deles não tiveram alertas de apostas suspeitas. Ou seja, a esmagadora maioria dos eventos esportivos nos mercados regulados têm resultados legítimos.

Nos mercados regulamentados, o esporte que tem tido os menores índices de alertas de atividades suspeitas foi o basquete, como apenas 0,02% e, no outro extremo, está o tênis, com 0,20%, ocupando a posição de esporte que oferece maiores riscos de integridade, muito disso devido ao fato de ser um esporte individual em que erros seguidos podem acontecer. O futebol, globalmente, apresentou o respeitoso índice de somente 0,03% de eventos suspeitos de manipulação.

Por outro lado, os corruptores se concentram primariamente em mercados pouco regulados ou não regulados (como Brasil), os índices de atividades suspeitas são substancialmente maiores. INTERPOL e Europol já constataram esse fato.[2]

A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) identificou 139 jogos com movimentações atípicas em 2022.[3] Para 2023, a Genius Sport projeta um aumento no Brasil, estima-se mais de 150 eventos suspeitos só no futebol.[4]

A manipulação de resultados não só prejudica o espetáculo esportivo, gerando falsas expectativas sobre os fãs do esporte, como gera prejuízos esportivos aos clubes e financeiros às casas de apostas esportivas. Para se ter uma ideia, o setor global de apostas reguladas perde até US$ 28 milhões por ano por causa de fraudes em resultados.[5]

Os números falam por si só. Contra fatos não há argumentos.. Regulamentar é o primeiro passo para se preservar a integridade do esporte brasileiro. Uma vez estabelecido todo o arcabouço de regras, aí entram em jogo os outros dois pilares: a educação de todos os integrantes da indústria do entretenimento esportivo e o aprimoramento dos mecanismos de combate à corrupção (fiscalização e punição).

Solucionar esse impasse, pode não parecer, mas é uma decisão coletiva. Ao Poder Público cabe regulamentar e isso feito, fiscalizar e punir criminalmente. Às entidades de organização do esporte, aplicar sanções desportivas que desestimulem as fraudes. Aos operadores e provedores de dados, contribuírem com informações que auxiliem nas investigações, ao fã do esporte e à mídia, lhes compete cobrar publicamente que medidas sejam adotadas sempre que identificarem falhas no ambiente esportivo. Não deixemos o paciente morrer.

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[1] https://ibia.bet/wp-content/uploads/2021/10/Optimum-Betting-Market-Study-FINAL_PT.pdf

[2] Interpol Match-fixing in Football Training Needs Assessment 2013 & https://www.europol.europa.eu/content/results-largest-football-match-fixing-investigation-europe & file:///C:/Users/jfole/AppData/Local/Temp/the_involvement_of_organised_crime_groups_in_sports_ corruption.pdf

[3] https://oglobo.globo.com/esportes/noticia/2023/02/cbf-identificou-139-jogos-com-movimentacoes-atipicas-nos-sites-de-apostas-em-2022.ghtml

[4] https://igamingbrazil.com/en/sports-betting-en/2023/05/08/exclusive-genius-sports-mark-locke-we-should-give-more-attention-to-sports-integrity/

[5] https://ibia.bet/wp-content/uploads/2021/10/Optimum-Betting-Market-Study-FINAL_PT.pdf

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