Escrevendo um novo livro sobre direitos humanos e esporte, tenho acompanhado decisões recentes sobre o tema do Tribunal Arbitral do Esporte (TAS). Em junho de 2022, inclusive, o portal do TAS publicou uma análise sobre esporte e direitos humanos, destacando uma nova perspectiva em suas decisões. Sim, há avanços, e eles refletem uma mudança significativa na forma como o tribunal aborda questões que vão além dos regulamentos esportivos.
O documento de 28 páginas, assinado por Estelle de La Rochefoucauld e Matthieu Reeb, começa apresentando regras esportivas que reforçam a proteção de direitos humanos no ambiente esportivo. Em seguida, aborda o papel da Convenção Europeia de Direitos Humanos (CEDH) nas decisões do TAS, mostrando como princípios internacionais têm influenciado o tribunal. Essa abordagem é um sinal claro de que o TAS está se abrindo para uma interpretação mais ampla e humanizada do direito esportivo.
Segundo Antoine Duval, em seu artigo Lost in translation? The European Convention on Human Rights at the Court of Arbitration for Sport, o TAS está passando por um processo semelhante ao da CEDH: um reconhecimento interno da importância dos direitos humanos, impulsionado por pressões externas por maior vigilância e proteção. Essa evolução não é trivial. Ela reflete uma mudança cultural no esporte, que tradicionalmente priorizava a autonomia e os regramentos privados, mas agora começa a reconhecer a necessidade de alinhar-se a padrões internacionais de direitos humanos.
Além de avançar nos regramentos internos do Comitê Olímpico Internacional (COI) sobre direitos humanos, o documento destaca a atenção que o futebol tem dado ao tema. A FIFA, por exemplo, comprometeu-se com todos os direitos humanos reconhecidos internacionalmente, incluindo os da Carta Internacional dos Direitos Humanos (Declaração Universal dos Direitos Humanos, Pactos Civis e Políticos e Econômicos, Sociais e Culturais) e a Declaração da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho. Esse compromisso é um marco importante, pois coloca o esporte em sintonia com as demandas globais por justiça e equidade.
Ao analisar decisões do TAS, percebe-se um olhar mais cuidadoso com os direitos humanos. O intérprete precisa entender que esporte e direito caminham juntos. Já há decisões que vão além dos regulamentos privados, buscando no direito respostas para litígios esportivos. Por exemplo, em casos envolvendo doping ou suspensões, o TAS tem considerado não apenas as regras esportivas, mas também o impacto dessas decisões na vida pessoal e profissional dos atletas. Essa abordagem mais humana é um avanço significativo.
O TAS avança ao explicar a aplicação das normas da CEDH no âmbito do esporte. O documento cita exemplos da aplicação do artigo 6º, §1, da CEDH (direito a um julgamento justo) e do artigo 8º (direito ao respeito pela vida privada e familiar). Esses princípios têm sido usados para garantir que os atletas tenham acesso a processos justos e transparentes, além de proteger sua privacidade em casos sensíveis. Essa integração entre o direito esportivo e os direitos humanos é um passo importante para a modernização do TAS.
Ou seja, embora o TAS ainda priorize a autonomia esportiva e os regramentos privados, ele tem dado passos significativos para incorporar os direitos humanos em suas decisões. Essa mudança não só fortalece a credibilidade do tribunal, mas também reflete uma evolução necessária no mundo do esporte, que cada vez mais se vê como um espaço de inclusão, justiça e respeito aos direitos fundamentais. O desafio agora é garantir que esses avanços sejam consistentes e aplicados de forma equitativa em todos os casos.
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