40 anos se passaram desde a realização dos Jogos Olímpicos de Moscou 1980, e um acontecimento segue provocando a raiva e a decepção dos brasileiros: o bronze concedido a João do Pulo no salto triplo, prova tradicional do Atletismo.
É que ao invés de ganhar o bronze, dizem, nosso maior atleta daquele momento, deveria ter levado o ouro, não fosse a atuação duvidosa dos árbitros do evento: apenas 2 saltos em um total dos 6 que realizou, foram considerados válidos. Dentre os saltos anulados, o salto que lhe daria o ouro, acima dos 18 metros.
Entenda-se: apesar de João do Pulo ter chegado à Moscou em sua melhor performance, era a antiga União Soviética, em Guerra Fria, e um filho da casa era considerado favorito, de modo que o brasileiro não teve chance contra os soviéticos que, injustamente, levaram ouro e prata.
Quanto da raiva pelos saltos anulados serviria como combustível para os saltos seguintes e igualmente anulados um após o outro?
João Carlos de Oliveira nasceu em 28 de maio de 1954 em Pindamonhangaba, mas nosso João do Pulo surge junto com seu recorde mundial de 17,89m alcançado nos Jogos Pan-Americanos da Cidade do México, em 15 de outubro de 1975 e mantido até hoje.
Carismático, foi mecânico, soldado e o primeiro negro a competir pelo Clube Pinheiros de São Paulo. Perdeu uma perna em um acidente de carro em 1982 e foi eleito deputado por 2 mandatos.
Várias reportagens citam as múltiplas mortes metafóricas do João – a perda do ouro, a perda de uma perna e a perda da vida em 1999 – mas a verdade é que sua história me mostra seguidos e surpreendentes renascimentos através do esporte e de uma energia pulsante que precisava se superar. Usou a angústia e redescobriu outro e mais outro caminho, todos novos e nem sempre em linha reta, mas sempre em frente. Morreu cedo, mas nos deixou lições inesquecíveis de luta e renascimento, mesmo em face de obstáculos maiores que a própria prova.
Recentemente, assisti a um vídeo da atriz Denise Fraga que me fez (re)pensar essa história de vida do João do Pulo. O vídeo se chama “oração pela fúria” e pode ser acessado através do link https://twitter.com/DeniseFragaReal/status/1287553807614787584?s=08 para ouvir a atriz interpretando a seguinte súplica:
“Santo Deus, não aplaque a minha fúria, proteja a minha indignação dos dias iguais, dos dias banais, renove a minha perplexidade diante do absurdo. Deus, meu Pai, mantenha aceso o fogo que incendeia a minha alma para que possa forjar o magma da minha fúria em assertividade e paixão. Canalize o jorro de minha indignação furiosa em gotas de lucidez implacável para minha luta diária a caminho da verdade e da liberdade”.
Essa mesma energia, encontro na história do João do Pulo: a cada anulação de mais um salto tecnicamente perfeito, sua fúria usada como chama de uma nova e renovada esperança, sem perder a coragem. Cada desafio trazendo um novo. “Como água no meio das pedras, é o que a gente tem de ser: a força da água no meio das pedras. É esse o antídoto.”
Assim seja, amém.
Para saber mais:
https://www.uol.com.br/esporte/reportagens-especiais/a-morte-tripla-de-joao-do-pulo/#cover