Search
Close this search box.

O que pensam especialistas sobre a MP que muda direitos de transmissão

A MP 984 traz uma revolução jurídica para o esporte e também na gestão esportiva. Ela pegou (a imensa maioria) os clubes, as entidades esportivas, os torcedores e o movimento jurídico de surpresa. Independentemente do mérito sobre o que ela trata, a imensa maioria dos especialistas entende que esse não seria assunto para se tratar através desse dispositivo legal.

O art. 62 da Constituição Federal estabelece que “em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”.

Direitos de transmissão, ou liberação de patrocínio de empresa produtora de conteúdo nas camisas dos clubes, não me parecem assuntos urgentes e relevantes diante do cenário atual, quando vivemos uma pandemia de consequências graves e futuro ainda inimaginável.

Mas o caminho da inconstitucionalidade não deve ser discutido. A MP será analisada pelo Congresso.

A principal consequência da medida provisória é tornar o clube mandante detentor dos direitos transmissão de um evento esportivo. E isso afeta diretamente a economia do futebol brasileiro.

Contratos firmados anteriormente seguem valendo, respeitando ato jurídico perfeito. Mas, desde a última quinta, o clube mandante que não tiver contrato pode negociar de maneira individual essa cessão de direitos para transmissão de um evento esportivo.

Mas esse não parece ser o melhor caminho. Vários exemplos pelo mundo mostram que esse tipo de negociação individual aumenta a distância entre grandes e pequenos clubes, e ataca um dos princípios fundamentais do esporte: o equilíbrio esportivo.

O esporte só tem graça quando não se sabe qual será o resultado, quando a imprevisibilidade do jogo é garantida.

Na Espanha, a negociação individual estabelecida nos anos noventa provocou um desequilíbrio gigante. Real e Barcelona jogavam sozinhos, e o Espanhol perdeu a graça.

Em 2005, o Governo espanhol decretou uma lei estabelecendo uma negociação coletiva. 50% divididos entre todos os clubes, 25% pelo desempenho no ano anterior e 25% pela audiência. Os clubes se cacifaram economicamente e o campeonato ganhou competitividade.

Apesar da MP permitir uma negociação individual, essa não se torna obrigatória. Os clubes podem se organizar em uma Liga, ou mesmo em blocos para negociar esses direitos. Esse é o caminho apontado por alguns especialistas como o melhor para o cenário brasileiro.

Agora, o mais fundamental nessa hora: é preciso diálogo e cuidado. Os políticos que irão analisar a MP devem buscar referências, estudos, a palavra de especialistas na área e conversar com movimento esportivo.

Um caminho poderia ser analisar o PL 68/2017 que está parado no Congresso.

Esse projeto de lei trata da questão dos direitos de transmissão (texto da MP é praticamente idêntico ao do PL), e avança em questões importantes. Ele pensa o esporte de maneira sistêmica, unifica a legislação esportiva e foi elaborado por um grupo de juristas, depois de um logo diálogo com o movimento esportivo.

Eu conversei com outros especialistas sobre a MP decretada pelo governo na última quinta-feira (18 de junho). Veja a opinião de cada um.

Pedro Trengrouse – “Sem liga, sem clube-empresa e sem negociação coletiva, o Brasil vai na contramão dos principais mercados do futebol mundial. O Congresso deve discutir essa MP com muito cuidado. Como está, pode ser uma bomba atômica nas finanças do futebol brasileiro, que já não andam muito bem. A negociação individual não funcionou direito em lugar nenhum do mundo, por que funcionaria no Brasil? Ao invés de ir na contramão do mundo, por que a Lei não estabelece então que clubes só poderiam organizar competições profissionais através de ligas?”

Ana Paula Terra – “Quanto à recém-editada MP 984, não me parece atender aos requisitos materiais nem aos de forma. De efeito imediato, ainda que sua eficácia possa vir a ser limitada com a futura apreciação do Congresso Nacional, uma medida provisória só deveria ser usada como instrumento legislativo em casos reais de relevância e urgência, evitando situações como a que enfrentamos no momento quanto aos direitos de transmissão já negociados: como atos jurídicos perfeitos que são, os contratos ainda vigentes, na minha opinião, não deveriam sofrer qualquer impacto. O ocorrido só reforça a importância de debatermos o uso das medidas provisórias no Brasil e as vantagens dos instrumentos da democracia participativa que poderiam ser aplicados caso os mesmos temas da MP 984 fossem objeto de um projeto de lei.”

Gustavo Lopes – “No campeonato carioca, por exemplo, os clubes menores recebem entre R$ 500.000,00 e 4 milhões. Se qualquer um dos pequenos jogar duas partidas em casa contra um dos grandes do Rio, transmitir exclusivamente por streaming e atingir 2 milhões de visualizações por jogo, receberia 1 milhão de reais, fora patrocínio.

Ou seja, abre-se um novo mundo de oportunidades a ser explorado e que pode ser muito rentável tanto para os clubes grandes, quanto para os pequenos, uma vez que mesmo as equipes menos conhecidas terão jogos dos grandes para negociar ou transmitir da forma que quiserem.”

Maurício Corrêa da Veiga – “Sou favorável a algumas disposições trazidas pela MP 984/20. A redução do prazo do contrato de trabalho desportivo é medida emergencial. Todavia, determinadas questões reclamam uma participação maior dos atores envolvidos nos espetáculos desportivos,

A MP 984 traz mudanças significativas para o direito desportivo e a gestão do esporte. A transferência do direito de transmissão para o mandante da partida representa uma revolução no tocante às transmissões desportivas e abre a oportunidade para novas plataformas, nada obstante, deve ser lembrado que os contratos já celebrados devem ser respeitados (pacta sunt servanda).

O ideal seria a previsão de negociação da coletividade dos clubes, pois desta forma todos eles sairiam fortalecidos e teriam mais força fazer valer suas reivindicações.

Cumpre observar que o Projeto de Lei do Senado 68/2017 já trazia previsões no tocante às transmissões pela TV e por streaming. Contudo, o referido PL continua paralisado no Congresso Nacional.

Outra questão pouco debatida foi a exclusão da participação dos sindicatos no repasse do direito de arena que, com a nova previsão legal passa a ser feito diretamente pelo clube detentor dos direitos de transmissão.

Provavelmente a Medida Provisória poderá ser uma alavanca para que os projetos de lei sejam aglutinados e finalmente votados.”

Nos siga nas redes sociais: @leiemcampo

Compartilhe

Você pode gostar

Assine nossa newsletter

Toda sexta você receberá no seu e-mail os destaques da semana e as novidades do mundo do direito esportivo.