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O uso de dados estatísticos e de desempenho de atletas nas plataformas digitais à luz da LGPD

Por Fernando Vasconcelos

As plataformas digitais relacionadas ao esporte, em especial as plataformas de apostas esportivas, revolucionaram a forma como os espectadores do esporte se relacionam com os jogos e eventos esportivos, trazendo um engajamento cada vez maior entre o fã do esporte e os eventos esportivos.

Tratando especificamente sobre as plataformas de apostas esportivas e os fantasy sports, percebe-se, logo em uma primeira visualização que, para o seu pleno funcionamento, é necessário o uso e análise de alguns dados estatísticos relacionados aos esportes que aquela plataforma está disponibilizando em seu site.

Afinal, seria impossível uma dessas plataformas ser capaz de determinar as chances de o Flamengo marcar mais de 1,5 gol em um jogo sem analisar um histórico prévio de dados dessa equipe.

Além de dados de desempenho e históricos das equipes, essas plataformas digitais se utilizam de alguns dados estatísticos dos próprios jogadores para determinar probabilidades (as famosas “odds”) de, por exemplo, um jogador X marcar um gol na partida do final de semana.

A problemática de toda essa questão surge com as leis de proteção de dados existentes em diversos países, como a GDPR na Europa e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil, uma vez que os titulares dos dados estatísticos de desempenho, no caso dos atletas, não necessariamente são consultados sobre o seu consentimento com o uso desses dados por essas plataformas digitais.

Antes de entrar na discussão legal em si, é importante frisar que nesse artigo vamos focar na análise diante do que a LGPD nos impõe, por razões óbvias de territorialidade.

Assim, ao mencionarmos que há uma ausência de consentimento por parte dos atletas para o tratamento de seus dados estatísticos, temos uma primeira impressão de que existe alguma irregularidade nesse fluxo de tratamento de dados, afinal os seus titulares não foram consultados sobre o uso daqueles dados pelas plataformas de apostas esportivas.

Entretanto, é importante lembrar que a LGPD traz outras bases de tratamentos de dados além do consentimento, como, por exemplo, o legítimo interesse no tratamento dos dados.

E é justamente o legítimo interesse, aliado ao caráter manifestamente público dos dados estatísticos produzidos pelos atletas durante um jogo, que traz a legalidade necessária para o tratamento desses dados, conforme análise conjunta do inciso IX do art. 7º e do parágrafo 4º também do mesmo artigo da LGPD.

O inciso IX do artigo 7º acima referido estabelece o legítimo interesse do controlador como uma das bases legais viáveis para o tratamento de dados, o que atende plenamente aos casos tratados nesse momento. Além disso, o parágrafo 4º, ainda do artigo 7º da LGPD, estabelece que, quando os dados são manifestamente tornados públicos por seus titulares, no caso os atletas, é dispensado o consentimento para tratamento dos dados.

Vejamos que os atletas, ao atuarem em eventos públicos (jogos oficiais de futebol), sujeitam-se, naturalmente à análises de desempenho baseadas em suas ações durante um jogo, de forma que não é possível entender que os dados decorrentes do desempenho do atleta nesses jogos, quando forem dados possíveis de serem recolhidos simplesmente através de observação, não sejam notoriamente públicos.

A Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) ainda não se manifestou claramente sobre os detalhes das definições de dados tornados “manifestamente públicos pelos titulares”, entretanto, é difícil imaginar um cenário no qual esses dados de desempenho de atletas, sejam interpretados de maneira diversa daquela exposta neste artigo.

Ainda sobre esse assunto, é fundamental percebermos que, ao falarmos da utilização de dados de atletas por essas plataformas digitais, todos os dados são decorrentes de ações tomadas pelos atletas durante esses eventos notadamente públicos (jogos), como chutes, passes, gols, faltas sofridas e cometidas, etc.

Ou seja, os dados estatísticos utilizados pelas plataformas não dependem de nenhuma forma tecnológica para serem coletados. Não há necessidade do uso de chips pelos atletas ou de qualquer outro aparato tecnológico, bastando alguém observar e fazer anotações sobre o jogo, o que demonstra o caráter manifestamente público desses dados estatísticos, comprovando, portanto, a legalidade no tratamento destes, ainda que ausente o consentimento de seus titulares (atletas).

O crescimento do mercado de plataformas digitais relacionadas ao esporte no Brasil já é perceptível para todos e o debate público, inclusive com a participação de órgãos públicos como a ANPD, por exemplo, é essencial para o desenvolvimento saudável e eficaz do mercado.

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