A PEC de alteração do parâmetro brasileiro de duração do trabalho semanal vem sendo conhecida como o fim da jornada semanal 6X1 exatamente por conter um avanço, ao mesmo passo que pode acentuar um retrocesso promovido pela reforma trabalhista. A começar pela possível melhora social, propõe-se a redução da carga horária semanal de labor de 44 horas para 36 horas semanais.
Com efeito, ao invés da regra de oito (8) horas diárias em cinco (5) dias consecutivos e mais quatro (4) horas em um sexto (6o) dia sequencial de labor por um (1) dia de repouso (descanso semanal remunerado), passaria a ser oito (8) horas diárias em quatro (4) dias consecutivos de trabalho com pelo menos um (1) dia inteiro de descanso (repouso semanal remunerado) na sequência, autorizando-se mais quatro (4) horas de trabalho em dia diferente do quinto (5o) dia, desde que realizadas nos casos de compensação de jornada e banco de horas, perfazendo um máximo de trinta e seis (36) horas semanais, sugerindo-se ainda um limite de inclusão neste teto horário semanal de mais quatro (4) possíveis horas extras distribuídas entre os quatro (4) dias de trabalho.
Na mesma proposta de modificação do texto normativo constitucional não se delimita o espaço a uma generalizada e intensificada negociação contratual ou coletiva sobre a flexibilização de duração laboral, através da compensação de jornada ou banco de horas em vários módulos (o famoso negociado sobre o legislado), já que se mantém a parte ruim da norma ao se replicar “falcutada a compensação de horários e a redução de jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;” (restar-se-ia a parte final do art. 7o, XIII, da CF/88), a despeito da proposta de reduzir a jornada máxima semanal.
Incumbe-nos a explicação, compensação de jornada como descreve o próprio nome é a possibilidade do acordo entre as partes laborais contratantes para compensar as horas de trabalho entre os dias da semana, desde que não supere o módulo mensal de horas trabalhadas. Por outro lado, o banco de horas é o possível negócio entre empregado e empregador (ou entre os seus sindicatos) para realizar um balanceamento de horas trabalhadas entre meses, ou seja, uma compensação de horas laboradas em um módulo mais elevado, a ultrapassar a carga horária máxima mensal. Se o banco de horas passa de seis meses de trabalho a negociação necessariamente deve ser realizada entre os sindicatos de empregados e empregadores.
A recordar, a indigitada Reforma Trabalhista (Lei n. 13.467/17) modificou a CLT para permitir os conhecidos “negociado sobre o legislado” e o “individualmente negociado sobre o legislado” para os neomeados empregados hipersuficientes, o primeiro significou as alterações de dispositivos para conceder aos sindicatos uma força de negociar a piora de direitos trabalhistas mínimos em alguns setores, tais como as fórmulas diversas de compensação de jornada e banco de horas, possibilidade de horas seguidas de labor acima do padrão civilizatório das 8 horas diárias, sem intervalo intrajornada, etc. O segundo representa que o trabalhador hipersuficiente, aquele que ganha duas vezes ou mais o maior benefício continuado da seguridade social e detém diploma de nível superior, pode individualmente por contrato de trabalho pactuar situações piores do que o piso legal em alguns direitos laborais, mormente as referidas flexibilizações de duração do seu trabalho.
Nas próprias disposições de alterações da CLT pela teratológica Reforma Trabalhista, a duração do trabalho não se considera mais matéria de higiene, saúde e segurança do trabalho, ou seja, abre-se espaço para as diversas fórmulas de jornada por negociação coletiva e até acordo individual escrito se não ultrapassado seis meses compensatórios (banco de horas), sendo o acordo tácito ou expresso (compensação de jornada) possível dentro do mesmo mês (arts. 59, caput, § 2o, § 5o, § 6o, 59-A, 59-B, 611-B, parágrafo único, da CLT), ao passo que o intervalo intrajornada dentro desses novos parâmetros de jornada podem ser compensados financeiramente (arts. 59-A e 59-B da CLT).
Com os denominados “neogicado sobre o legislado” e o “individualmente negociado sobre o legislado”, sem nenhuma proposta de delimitação destes módulos de compensação de jornada e banco de horas pelo texto da nominada PEC 6×1, ao contrário mantendo a facultatividade ilimitada de flexibilização de duração do trabalho, os sindicatos e as entidades empregadoras prosseguirão a elevar o padrão civilizatório das oitos (8) máximas diárias, tais como: 12h de trabalho seguidos por 36h de descanso, 24h de trabalhos seguidos por 48h de descanso, e não se duvida que o Colendo Tribunal Superior do Trabalho (C.TST) em sua jurisprudência permita futuramente até 36h seguidas de labor em uma semana, restando descanso para o restante semanal.
Em um país como o Brasil onde é frequente a submissão do trabalhador a horas extras e em horário noturno, de maneira habitual, violando a Constituição e a Lei, muito em função da inexistência de segurança no emprego (ignoração da norma pragramática do art. 7o, I, da CF/88 e a denunciada CV n. 158 da OIT), seria necessário pautar as negociações (individuais e coletivas) sobre compensação de jornada e banco de horas, reforçando ainda o resguardo o descanso semanal remunerado e o intervalo intrajornada, permitindo por exceção a indenização financeira, não por regra. Somente desta maneira significaria um avanço social incontestável a redução da carga máxima semanal de 44h para 36h.
Na seara laboral desportiva não se verifica tanto impacto da PEC 6×1, uma vez que são pouquíssimas as entidades empregadoras desportivas ou quase nenhuma (clubes, SAFs) a utilizarem as aberturas normativas da Lei Pelé (Lei n. 9.615/98) e Lei Geral do Esporte-LGE (Lei n. 14.597/23), conjugadas às normas da CLT exprimidas acima, que possibilitam a compensação de jornada, o banco de horas e a indenização para tentar controlar os grandes fluxos horários de disposição do atletas empregados em viagens, concentração, preleção, pré-temporada, etc.
Neste ponto, é bom frisar sobre a compensação financeira por tempo à disposição, o art. 97, III, da LGE a extingue contrariando o art. 28, § 4o, III, da Lei Pelé que a prevê, ambos em vigor, o que pode ser um obstáculo para uma melhor acomodação no uso da compensação de jornada ou do banco de horas no contrato especial de trabalho desportivo.
Portanto, acredita-se que a maioria dos empregadores desportivos permanecerão não resolvendo a questão do controle de duração de jornada semanal de seus jogadores empregados, inexistindo qualquer respaldo contratual de compensação de jornada ou banco de horas, possibilidade intensificada se a PEC 6×1 se tornar norma constitucional, restando os conflitos oriundos desta celeuma para a Justiça do Trabalho ou Câmara Nacional de Resolução de Disputas (CNRD) da Connfederação Brasileira de Futebol (CBF) – método extrajudicial de solução de querelas individuais laborais no futebol.
Em resumo, a PEC 6×1 poderia ser boa para a atividade trabalhista desportiva que requer jornadas longas e variáveis em torno de competições, jogos, treinos, preparações, mas como no Brasil os Sindicatos de atletas são inativos e as associações de clubes menosprezam este problema de duração do trabalho desportivo, o resultado da referida PEC na prática do ramo laboral do desporto seria quase irrelevante.
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