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Peculiaridades do contrato especial de trabalho desportivo

…e outras verbas devidas aos jogadores de futebol

O presente artigo é fruto de uma pesquisa baseada nos dispositivos legais no que se trata o contrato de trabalho especial desportivo – CETD e suas peculiaridades, assim como outras verbas inerentes ao exercício do atleta, das quais vamos estudar, além do contrato especial, cláusula indenizatória desportiva, cláusula compensatória desportiva, luvas, bichos, direitos de imagem e direito de arena.

  1. Contrato Especial de Trabalho Desportivo

O contrato especial de trabalho desportivo é o instrumento pelo qual se dá a relação de trabalho entre a agremiação desportiva e o atleta. É um vínculo de trabalho diferente dos convencionais vistos na CLT, pois se está regulado pela Lei 9.615/98 – conhecida como Lei Pelé. Este instrumento traz algumas obrigações tanto da entidade quanto do atleta empregado. Entretanto, se assemelha com a relação comum de trabalho, pois contém requisitos básicos como a onerosidade, pessoalidade, continuidade e subordinação.

Pode-se destacar, aqui, algumas das peculiaridades como prazo determinado para o contrato de no mínimo três meses e no máximo cinco anos, conforme dispõe o artigo 30 da Lei 9.615/98. “O contrato de trabalho do atleta profissional terá prazo determinado, com vigência nunca inferior a três meses nem superior a cinco anos.”. É importante trazer luz, também, ao artigo 30-A da mesma lei, acrescido pela Lei 14.117/21, o qual trouxe uma flexibilização do dispositivo supramencionado em razão da pandemia Covid-19, permitindo que clubes e jogadores celebrem contratos determinados com prazo mínimo de 30 (trinta) dias, tendo o artigo 30-A a seguinte redação:

“As entidades desportivas profissionais poderão celebrar contratos de trabalho com atleta profissional por prazo determinado de, no mínimo, 30 (trinta) dias, durante o ano de 2020 ou enquanto perdurar calamidade pública nacional reconhecida pelo Congresso Nacional e decorrente de pandemia de saúde pública de importância internacional.”

 

No artigo 31, está descrito que, em caso de atraso de três meses de contrato de trabalho ou de imagem, seja na parcial ou integralmente, o mesmo será rescindido e o jogador poderá procurar outra entidade esportiva de mesma modalidade nacional ou estrangeira. E no seu primeiro parágrafo estão elencados que é caracterizado como salário do atleta. Além disso, se a agremiação desportiva estiver com os salários do atleta com mais de dois meses atrasado, este pode se recusar a participar e partidas por conta do atraso de seus vencimentos.

Na Lei Pelé, ainda, estão os deveres dos clubes e jogadores que estão vinculados por contrato especial de trabalho desportivo. Abaixo segue a redação dos artigos 34 e 35, respectivamente:

Art. 34. São deveres da entidade de prática desportiva empregadora, em especial:

I – registrar o contrato especial de trabalho desportivo do atleta profissional na entidade de administração da respectiva modalidade desportiva;

II – proporcionar aos atletas profissionais as condições necessárias à participação nas competições desportivas, treinos e outras atividades preparatórias ou instrumentais;

III – submeter os atletas profissionais aos exames médicos e clínicos necessários à prática desportiva.

Art. 35. São deveres do atleta profissional, em especial:

I – participar dos jogos, treinos, estágios e outras sessões preparatórias de competições com a aplicação e dedicação correspondentes às suas condições psicofísicas e técnicas;

II – preservar as condições físicas que lhes permitam participar das competições desportivas, submetendo-se aos exames médicos e tratamentos clínicos necessários à prática desportiva;

III – exercitar a atividade desportiva profissional de acordo com as regras da respectiva modalidade desportiva e as normas que regem a disciplina e a ética desportivas.

  Importante, também, salientar a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT dentro da relação contratual entre atleta e clube. Essa relação entre as partes é regida pela Lei Pelé, todavia, a CLT pode ser usada de maneira subsidiária para situações em que a lei especial é omissa ao tratar de determinado assunto. Um dos exemplos que pode ser citados aqui é a demissão por justa causa do atleta, por não ser disciplinada pela Lei Pelé, é regulada conforme o art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho.

  1. Cláusula Indenizatória Desportiva e Cláusula Compensatória Desportiva

É essencial constar no contrato especial de trabalho desportivo, dois dispositivos de proteção tanto do atleta quanto do clube, a cláusula indenizatória desportiva e a cláusula de compensação desportiva. O artigo 28 é claro ao versar sobre o assunto:

“Art. 28. A atividade do atleta profissional é caracterizada por remuneração pactuada em contrato especial de trabalho desportivo, firmado com entidade de prática desportiva, no qual deverá constar, obrigatoriamente:

I – cláusula indenizatória desportiva, devida exclusivamente à entidade de prática desportiva à qual está vinculado o atleta, nas seguintes hipóteses: […]

II – cláusula compensatória desportiva, devida pela entidade de prática desportiva ao atleta, nas hipóteses dos incisos III a V do § 5º. […]”

A cláusula indenizatória desportiva protege o clube, deve ser paga em duas possibilidades. Quando ocorre a transferência do atleta para outra entidade, caso seja nacional, o valor pode chegar até o limite de 2.000 vezes o salário médio do atleta, em casos de transferências para o exterior não existe teto para o valor da multa. A outra possibilidade é devida ao clube quando um atleta aposentado na agremiação retorna as atividades esportivas por outro clube em um prazo de 30 meses após a aposentadoria.

Já a cláusula compensatória desportiva é devida ao atleta em casos de rescisão contratual  nas hipóteses de rescisão indireta e na despedida imotivada, sendo o seu valor previamente pactuado em contrato de trabalho com valor mínimo relativo ao restante dos salários mensais a que teria direito o praticante até o termo final do contrato, podendo subir até quatrocentas (400) vezes o valor do salário mensal no momento da rescisão contratual de acordo com art. 28, § 3º.

  1. Luvas

As Luvas ou Direito de Luvas, como é amplamente reconhecido pelo público geral, é um valor de incentivo pago ao atleta para celebrar o contrato com o clube. Importante destacar que as luvas têm natureza salarial. Pode ser paga em parcela única, geralmente no ato de assinatura do contrato, ou pode ser parcelada com pagamento durante o período de vigência do contrato de trabalho. Na Lei Pelé, as luvas estão de maneira implícita dentro do artigo 31, §1º como “demais verbas”.

 

  1. Bichos

O bicho é uma premiação especial paga aos atletas e comissão técnica dos clubes por metas e objetivos alcançados em competições. Pode ser um determinado número de vitórias, uma determinada posição em um campeonato, classificação e, principalmente, pelo título conquistado. Também existe bichos para vitórias e, até mesmo, empates nos jogos disputados. É de total importância mencionar que, após a sanção da Lei n.º 13.467/2017, conhecida como “Reforma Trabalhista”, o art. 457, § 2º da CLT retirou do bicho sua natureza salarial que antes lhe era peculiar, fazendo com que esse valor deixe de fazer parte da remuneração do atleta e também não tenha reflexos de encargos trabalhistas e previdenciários.

  1. Direito de Imagem

O direito de imagem é personalíssimo, e, ao contrário do que muitos pensam, não tem sua primeira menção na Lei Pelé (9.615/98), mas é destacado na própria Constituição Federal de 1988, no artigo 5°, incisos V, X e XVIII, alínea “a” como um direito personalíssimo, indisponível e de natureza civil, cuja exploração comercial pode ser cedida a terceiros. Já na esfera esportiva, tal instrumento refere-se à exploração comercial do atleta fora da órbita desportiva. A redação dos artigos 87 e 87-A da Lei Pelé determinam:

Art. 87. A denominação e os símbolos de entidade de administração do desporto ou prática desportiva, bem como o nome ou apelido desportivo do atleta profissional, são de propriedade exclusiva dos mesmos, contando com a proteção legal, válida para todo o território nacional, por tempo indeterminado, sem necessidade de registro ou averbação no órgão competente.

Parágrafo único. A garantia legal outorgada às entidades e aos atletas referidos neste artigo permite-lhes o uso comercial de sua denominação, símbolos, nomes e apelidos.

Art. 87-A.  O direito ao uso da imagem do atleta pode ser por ele cedido ou explorado, mediante ajuste contratual de natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo.

Parágrafo único.  Quando houver, por parte do atleta, a cessão de direitos ao uso de sua imagem para a entidade de prática desportiva detentora do contrato especial de trabalho desportivo, o valor correspondente ao uso da imagem não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total paga ao atleta, composta pela soma do salário e dos valores pagos pelo direito ao uso da imagem.

O direito de imagem do atleta tem natureza civil, no entanto com o artigo 87-A adicionado pela Lei 13.155/2015, trouxe uma peculiaridade no ordenamento jurídico brasileiro. O caput do artigo diz que a cessão dos direitos de imagem tem natureza civil. Entretanto, o parágrafo único do referido artigo versa que o valor do direito de imagem não pode ultrapassar 40% (quarenta por cento) da soma dos valores pagos entre salários e direito de imagens, assim, a cessão tendo caráter remuneratório. Ou seja, algo que se contradiz dentro do artigo. Tal limitação foi feita para coibir fraudes que mascaravam salários em forma de direito de imagem para fugir dos reflexos trabalhistas. Porém, em decisão recente do Tribunal Superior Trabalhista pacificou o entendimento de que o direito de imagem tem natureza civil, salvo se for comprovado que tal pagamento está sendo feito para fraudes. Resumindo, o direito de imagem é pactuado livremente entre as partes respeitando o teto dos 40% e se refere aos aspectos personalíssimos do atleta: sua imagem, voz, nome, apelido desportivo, representações como caricaturas e autógrafos. Algo que se bem explorado, pode render bons resultados financeiros tanto para o atleta quanto para o clube.

  1. Direito de Arena

O Direito de arena é um valor recebido pelos atletas de futebol referente às transmissões das partidas de futebol. Os clubes detêm a negociação de suas partidas, conforme artigo 42 da Lei Pelé. O valor do direito de arena é de 5% do total recebido por aquela partida, já negociado previamente pelo clube com as emissoras. Esse valor, correspondente proveniente da exploração do direito de arena, deve ser repassado ao sindicato dos jogadores e depois distribuído igualmente entre os atletas que tiveram a sua imagem reproduzida na respectiva transmissão de partida de futebol, até mesmo os reservas que não atuaram. Importante destacar que os valores recebidos pelos atletas referentes ao Direito de Arena, também, não têm natureza salarial.

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Jorge Luis Gonçalves dos Santos é graduando em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) em Florianópolis – SC, atualmente no 7º período. Tem certificado de Direito Desportivo pela PUC Rio e FUTJUR. Atualmente é membro pesquisador do Grupo de Estudos de Direito Desportivo da PUC-PR e cursa Direito Desportivo Trabalhista com Bernardo Pozza. Twitter: @jorgeeluisgs.

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