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Pensando o Esporte

Se seguimos investigando por que o ambiente esportivo pode dificultar a participação de atletas nas estruturas de organização do esporte, ou no uso da atividade como plataforma pra reivindicar outras melhorias sociais, pensemos mais um pouco sobre o que não se vê.

Já falamos por aqui que podemos chamar de linguagem qualquer meio de comunicar ideias ou sentimentos através de signos convencionais, sonoros, gráficos ou gestuais. Nesse universo, o esporte é menos o que acontece, e mais o que se sente, ou o que se fala sobre ele.

Por isso, fatores ligados à linguagem reproduzida tanto dentro dos centros de treinamento, quanto pela indústria esportiva e seus consumidores reafirmam ou enfraquecem o poder que cada um tem de interferir no dia a dia do processo de desenvolvimento da alta performance.

Pra começar, a dinâmica competitiva impõe aos atletas uma obediência acentuada, não apenas à hierarquia entre quem dá ordens e quem as recebe, mas também às instruções de ordem física, psicológica e técnica, imprescindíveis ao alcance e à manutenção da performance em altíssimo rendimento – e que pressupõem a dedicação à profissão em tempo integral.

A depender da idade em que a atividade esportiva foi iniciada, pode ser que toda a formação pessoal desse sujeito seja forjada nesse complexo cenário, tornando-o uma espécie de produto do ambiente, cujas condições, por vezes inadequadas, vão se naturalizando gradativamente, causando pouca estranheza quando adultos.

Quanto aos aspectos subjetivos da formação cognitiva desse mesmo ser humano, também a infância é um estágio crucial de aprendizado. Nessa etapa da formação psíquica e social, a imersão na lógica da concorrência e o profundo incentivo à postura individualista na busca pelo sucesso podem naturalizar mais competição, e menos o engajamento com o outro.

Ainda, falando em linguagem, mesmo os ambientes físicos em que por vezes o trabalho é desempenhado podem contribuir para o enfraquecimento do indivíduo, por torná-lo, aparentemente, pequeno, e com pouco poder de interferir nas coisas.

Acho que já falei sobre um professor contava que “quando Lúcio Costa e Niemeyer pensaram Brasília, os grandes espaços serviriam para abrigar multidões, como a Praça Vermelha, em Moscou. Hoje se percebe que esse formato de cidade segrega, mais do que reúne. Até os tamanhos colossais das avenidas, praças e edifícios contribuem para diminuir o tamanho das pessoas”. Segundo ele mesmo dizia, era o espaço falando, e reforçando falas. Verdade seja dita, o ambiente formal dos grandes estádios e espetáculos, por vezes, pode ser capaz de diminuir e desarticular pessoas, por tornar “pequenos”, proporcionalmente, os atletas cercados pelas grandes estruturas ou mesmo em razão do número de espectadores presentes. Isso acontece não só dentro de construções arquitetônicas gigantes e históricas como o Mineirão, em Belo Horizonte, ou o Maracanã, no Rio de Janeiro – que por muitos anos foi o maior estádio do mundo. Também as tão gigantes construções ideológicas em torno do que representa, no tecido social, um clube de futebol, podem desarticular ou enfraquecer a reunião de atletas em torno de um objetivo comum.

Quanto pesa um escudo, uma história, uma camisa? Se vamos entrar nesse assunto, precisamos falar sobre os impactos de um ingrediente extra, a temperar (talvez, apimentar) essa história toda. Na próxima semana: o torcedor.

Referências

VIANA, Anamaria Fernandes; VIANA, Márcio Túlio. O juiz, o operário e o bailarino: relações entre o palco, a fábrica e a sala de audiências. Belo Horizonte: RTM, 2016. p. 17.

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