Prestes a ser votada na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 2337/2021, que propõe alterações na legislação do Imposto de Renda para pessoas físicas e jurídicas, além de diversas modificações nas regras de tributação dos investimentos financeiros, promete mexer consideravelmente na área social, uma vez que prevê a redução do potencial dos incentivos para projetos da cultura, esporte, infância, idoso e saúde.
A proposta inicial do Governo reduz o potencial dos incentivos em 33%. Já o parecer preliminar do relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), a redução para projetos sociais é ainda mais acentuada, chegando a 83%.
“Uma reforma tributária é necessária no país, não é de hoje. Mas é absolutamente lamentável que, como consequência da reforma, o Estado diminua o fomento ao esporte. O fomento ao esporte é um dever constitucional do Estado; é claro que não é limitado ao fomento de cunho financeiro, já que há diversas formas de fomento, mas é inegável o papel do financiamento no esporte. Isso ficou claro inclusive para a opinião pública, que reconheceu que, com um incentivo monetário maior, o Brasil conquistaria mais expressivos resultados nas Olimpíadas em Tóquio”, avalia Fernanda Soares, advogada especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
“O Congresso se apressa em aprovar o PL 2337/2021, com pouquíssimo debate e participação da sociedade (e sem a devida atenção aos princípios republicanos!), pretende tributar dividendos e criar um modelo de integração entre o imposto de renda que é devido pelas empresas e aquele devido pelas pessoas físicas. A pretendida integração entre o imposto de renda das empresas e das pessoas físicas gera, em última análise e sem a necessidade de qualquer cálculo, uma conclusão inexorável: empresas no geral terão menos imposto de renda a recolher, já que serão tributados os dividendos distribuídos aos seus sócios, por exemplo”, afirma Glauco Hanna, advogado especialista em direito tributário.
A legislação vigente que trata do Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas no Brasil permite que até 1% do imposto devido por empresas tributadas pelo Lucro Real seja destinado a projetos esportivos previamente aprovados pelo Ministério da Cidadania.
No entanto, esse percentual não incide sobre todo o IRPJ, mas apenas sobre a alíquota básica. O art.3º da Lei 9.249/1995 determina que, o IRPJ é formado por uma alíquota básica de 15% e um adicional de 10%, totalizando 25%. Esse adicional possui duas características: 1) incide apenas sobre o lucro que supera R$ 20 mil mensais e 2) não aceita qualquer dedução.
A reforma proposta pelo Governo prevê a redução da alíquota do IRPJ dos atuais 25% para 20%. Essa redução aconteceria exclusivamente na alíquota básica, que cairia de 15% em 2021 para 12,5% em 2022 e para 10% em 2023. Segundo o texto, o adicional segue mantido em 10%.
PL 2.337/2021
“Art. 8o A Lei no 9.249, de 1995, passa a vigorar com as seguintes alterações:
Art. 3o A alíquota do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza das Pessoas Jurídicas será de:
I – doze inteiros e cinco décimos por cento, nos períodos de apuração compreendidos entre 1o de janeiro e 31 de dezembro de 2022; e
II – dez por cento, nos períodos de apuração a partir de 1o de janeiro de 2023.”
Ao direcionar o corte do Imposto de Renda na alíquota básica, o governo gera uma redução considerável no potencial de destinação de recursos para projetos aprovados através da Lei de Incentivo ao Esporte. Para ser ter uma noção do potencial dessa diminuição, os R$ 272 milhões de incentivo de empresas para projetos esportivos, previstos no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2022, cairia para cerca de R$ 90 milhões.
Já segundo o parecer do relator, a alíquota básica do IRPJ é reduzida para 2,5%, gerando um corte superior a R$ 220 milhões na Lei de Incentivo ao Esporte. O número passaria de R$ 272 milhões para R$ 45 milhões, representando 83% de redução.
“Se o PL 2337/2021 tendo a gerar uma integração entre o imposto de renda das empresas e das pessoas físicas, com a redução do imposto de renda devido pelas empresas, haverá, necessariamente, uma indireta redução do benefício e incentivo gerado pela LIE em favor do desporto, com a consequente redução do volume de patrocínios e doações beneficiados pela LIE”, ressalta Glauco.
Para pressionar pela preservação dos números da Lei de Incentivo ao Esporte, grupos como a Rede Esporte pela Mudança Social (REMS) e Esporte pela Democracia, deram início a uma campanha nas redes sociais. O movimento também conta com o apoio de diversos atletas.
“Na votação da Reforma do IR, a Lei de Incentivo ao Esporte deve ser preservada. Os recursos não podem ser diminuídos, pelo contrário, precisamos de mais investimentos!”, pede a campanha.
Apenas no ano de 2020, mais de 200 mil pessoas foram beneficiadas diretamente por projetos realizados com apoio da Lei de Incentivo ao Esporte, aponta o Relatório de Gestão 2020 do Governo.
“A falta de maior debate e de um olhar atento deve, se nada for alterado, inviabilizar o espírito da Lei de Incentivo ao Esporte, que viabilizou, através de renúncia fiscal, a aplicação de recursos em projetos das diversas manifestações desportivas e paradesportivas distribuídos por todo o território nacional. A reforma pode inviabilizar, com a redução de doações ou patrocínios, projetos sociais desportivos que atendem crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos, e certamente fará ruir a garantia e o suporte construídos ao longo desses anos – e tão necessários! – para que aos atletas de alto rendimento possam participar e representar o Brasil em competições nacionais e internacionais”, finaliza Glauco.
O que é a Lei de Incentivo ao Esporte?
Publicada em 29 de dezembro de 2006, a Lei 11.438/2006 estabelece a possibilidade de pessoas e empresas investir parte do pagariam no Imposto de Renda em projetos esportivos aprovados pelo governo.
O seu art. 2º estabelece três categorias de projetos desportivos e paradesportivos (destinado a pessoas com deficiências físicas) que podem captar recursos segundo as regras previstas na lei. São eles:
– Desporto educacional: que visa o desenvolvimento integral da pessoa, evitando a seletividade e competitividade excessiva entre os participantes
– Desporto de participação: praticado livremente pelas pessoas, sem regras oficiais a serem seguidas, como as brincadeiras infantis. Seu principal objetivo é promover a integração na vida social, a saúde e a preservação do meio ambiente
– Desporto de rendimento: compreende as modalidades praticadas conforme regras nacionais e internacionais, com o objetivo de obter resultados em competições.
Segundo a legislação vigente, as empresas podem deduzir até 1% do Imposto de Renda devido em cada período de apuração, enquanto as pessoas físicas podem deduzir o máximo de 6% a partir das doações. Também é possível contribuir como patrocinador, transferindo recursos a fim de promover sua marca ao público.
A aprovação dos projetos que podem receber recursos por meio da Lei de Incentivo ao Esporte é feita pela Secretaria Especial do Esporte, do Ministério da Cidadania.
Crédito imagem: Dreamstime
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