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Plano de regulação do futebol inglês é bom exemplo para o Brasil? Especialistas avaliam

O governo do Reino Unido apresentou nesta quinta-feira, 23 de fevereiro, um plano para melhorar a governança do futebol de elite do país. A principal medida é a criação de um órgão regulador, estabelecido por lei, para supervisionar a sustentabilidade financeira do jogo.

“Este plano surgiu na esteira da criação da Superliga, quando o então primeiro-ministro Boris Johnson resolveu intervir contra a possibilidade de adesão dos clubes ingleses. A partir daí resolveram criar este ‘plano de organização’ do futebol britânico, tentando aumentar aos clubes. Isso passa por algumas ações populistas, como dar algum poder de voto aos torcedores, mas também traz melhorias, como um sistema de licenciamento rígido para todas as divisões, que separam amadores de profissionais”, explica o economista especializado em gestão do esporte Cesar Grafietti.

O plano atinge em cheio a autonomia das entidades esportivas.  Ele pode prever a proibição de integrantes do Campeonato Inglês de ingressarem em ligas independentes/separatistas, como a Superliga Europeia, tornar mais rígidas as regras de propriedade e assim dar “mais espaço” aos torcedores na administração dos clubes.

A ideia é de que esse órgão regulador tenha controle total sobre o processo de licenciamento dos clubes, que teriam de provar a sua solvência e modelos de negócios “financeiramente sólidos”. Por fim, ele também iria supervisionar os testes para proprietários e diretores dos clubes da elite inglesa.

Principais pontos do plano:

– O primeiro regulador independente para o futebol masculino de elite;

– Um sistema de licenciamento da primeira até a quinta divisão inglesa, com o requerimento de modelos sólidos de negócios;

– Fortalecimento dos testes de proprietários e diretores dos clubes;

– Aumento do poder dos torcedores na administração dos clubes;

– Bloqueio para clubes ingleses ingressarem em ligas separatistas.

Apesar da legislação ser estatal, a Federação Inglesa de Futebol (FA) e a Liga de Futebol Inglês (EFL) – responsável pelas divisões inferiores – apoiam o plano do governo do Reino Unido.

Já a Premier League (1ª divisão do futebol inglês), porém, disse em comunicado que busca implementar uma regulamentação mais independente nos últimos anos, indicando que não precisaria de intervenção por parte do governo.

Especialistas ouvidos pelo Lei em Campo entendem que as medidas ajudam na proteção do esporte, mas partem pelo caminho errado. Para eles, a iniciativa teria que partir do movimento esportivo, através da autorregulação. No Brasil, legislação similar poderia ser contestada com base no art 217 da Constituição Federal, que protege a autonomia das entidades esportivas.

“Entendo que este caminho deveria ter origem através da CBF ou da Liga, pois através de dispositivo legal gera conflito com a autonomia constitucional. A título exemplificativo, o movimento de implementação do licenciamento de clubes pela CBF teve origem através de imposição regulamentar da Conmebol seguindo orientações da FIFA. Me recordo que o movimento do PROFUT em 2015 pretendia ser mais abrangente, porém teve alguns dispositivos questionados em relação a sua constitucionalidade”, explica Andre Galdeano, advogado especialista em direito desportivo.

O que pensam especialistas sobre a criação do órgão regulador?

O Lei em Campo ouviu quatro especialistas sobre o plano do governo britânico bem como a criação do órgão para regular o futebol do país. Além disso, o portal questionou se ele poderia ser um bom exemplo para o Brasil.

César Grafietti, economista e especialista em gestão e finanças no esporte:

Vejo como um exemplo muito positivo, mas feita da forma errada. Nenhuma intervenção do Estado é positiva numa atividade privada. Mas a atividade precisa de regulamentação, como um caderno de licenciamento duro para excluir os clubes que não tem capacidade financeira, de estrutura e solidez para operar, além de incluir um modelo de controle de entrada de novos sócios. Seria útil para o desenvolvimento do futebol brasileiro, ainda frágil em termos estruturais”, acrescenta.

Fernando Monfardini, advogado e consultor de compliance esportivo:

“Eu vejo com bons olhos a criação de uma regulação mais forte sobre governança e sustentabilidade dos clubes e acredito que a falta de um texto nesse sentido foi um dos pontos que fracos da Lei da SAF. Inclusive, a experiência da Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte, que criou o PROFUT e a APFUT, poderia servir como base de aprendizado, sendo uma possibilidade aumentar a estrutura e escopo do órgão. Instituir na prática a legislação, com previsão de sanções desportivas e sem o apoio das entidades desportivas, poderia gerar as mesmas nulidades reconhecidas pelo STF no PROFUT, por conta da autonomia desportiva. Até mesmo na Premier League eu acho difícil a aplicação da lei sem que ela absorva a legislação”, analisa.

Jean Nicolau, advogado e especialista em direito internacional:

“Em princípio, são medidas que podem ser benvindas sob uma perspectiva de contribuir com a sustentabilidade do sistema e, em última análise, com preservação da ética esportiva. Com todo o respeito devido à autonomia das entidades esportivas e a todos princípios a ela associados, num contexto de crescente concentração de riquezas no mercado do futebol, não é simples imaginar soluções que, sem a participação dos poderes públicos (internos ou europeus), possam mitigar o problema. Em outros termos, vale pensar se seria possível acreditar apenas na boa vontade de clubes e ligas esportivas”, pondera.

André Galdeano, advogado especialista em direito desportivo:

“O que poucos pensam que se não houver bons princípios de governança estas podem quebrar como qualquer empresa. O modelo original das SAD’s em Portugal foi recentemente revisto, pois 20% destes quebraram. A possibilidade de punição aos dirigentes, uma maior fiscalização para que clubes não sejam usados para que os clubes não sejam usados como ‘barriga de aluguel’ para agentes de atletas ou ‘limpar’ dinheiro sujo de origens duvidosas. Nada adianta que esta fiscalização seja interna, pois fere as regras de autonomia. Não tem cabimento que quem fiscalize seja um funcionário da própria instituição. Transparência, Governança e Profissionalismo são caminho sem volta para o desenvolvimento do futebol”.

Crédito imagem: Premier League/Divulgação

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