Começou a fase dos playoffs da NBA. E tem muito jogador em quadra que ainda não disse obrigado a Spencer Haywood.
As regras do esporte mudam por diferentes motivos. Por necessidade de dar mais dinamismo ao jogo; pela evolução física dos atletas; pela inovação tecnológica. Os motivos são muitos, mas o que nos interessa aqui é a mudança das regras por meio de uma discussão jurídica. E o basquete viu isso algumas vezes. Com relação ao draft, o personagem principal desse jogo se chama Spencer Haywood.
Haywood foi um dos principais nomes do basquete americano nos anos 70. De 1969 a 1975 manteve a impressionante média de 25 pontos e 10 rebotes por jogo. Mas o feito acabou meio que esquecido diante de uma conquista jurídica que favoreceu jovens atletas desde então. Nomes como Magic Johnson, Michael Jordan, Kobe Bryant, LeBron James… a lista é longa dos atletas que têm muito a agradecer a Haywood.
Talentoso, Haywood, com 19 anos, levou a seleção americana de basquete à medalha de ouro nas olimpíadas do México, em 1968. Na mesma temporada ele obteve uma média de 32 pontos e 21,5 rebotes por partida jogando pela Universidade de Detroit.
O desempenho impressionante o levou a jogar profissionalmente na temporada seguinte pelo Denver Rockets da ABA, a American Basketeball Asssociation, uma liga então rival da NBA. O que revoltou os puristas do basquete universitário americano. Sem dar a mínima importância para isso, com um jogo espetacular, Haywood se tornou MVP, o jogador mais valioso da temporada.
Mas ele não estava satisfeito. Haywood tinha uma proposta milionária para jogar na NBA, uma liga mais forte do que a ABA. E queria aceitar. Mas havia um problema: o draft. A regra determinava que, para jogar na NBA, um atleta precisaria esperar pelo menos quatro anos desde a saída do High School, o ensino médio nos Estados Unidos. A ideia era fazer com que o atleta jogasse o basquete universitário nesse tempo e só depois pudesse ser “draftado” pela liga.
Com proposta do Seattle Supersonics, Spencer Haywood ousou desafiar a NBA. Ele foi à Justiça para exigir o direito de trabalhar, mesmo sem ter cumprido os quatro anos desde a saída do ensino médio, como determinava a regra de então.
O caso Haywood vs. NBA foi levado até a autoridade jurídica máxima dos EUA, a Suprema Corte.
Em jogo, as necessidades econômicas do atleta e os danos irreparáveis para o trabalho de Haywood caso ele não pudesse ser contratado pelo Seattle. Além disso, a defesa também usou a Lei Shermann, de 1890, que legisla sobre monopólio nos Estados Unidos.
Em 1970, a Suprema Corte, por 7 votos a 2, decidiu a favor de Spencer Haywood. Ela permitiu que o atleta se incorporasse ao Seattle e jogasse a NBA. Assim, segundo a principal autoridade jurídica americana, o atleta não teria seus direitos como trabalhador violado.
O processo criou precedente. E a NBA precisou mudar. A partir daquele momento ela criou a Regra da Necessidade, na qual qualquer atleta poderia ser contratado mesmo sem cumprir os quatro anos desde a saída do High Scholl. Essa regra mudou a história da NBA porque praticamente todos os grandes jogadores desde então chegaram à liga sem cumprir o tempo que antes era exigido.
Spencer Haywood teve um começo avassalador na NBA. Com atuações brilhantes, ele liderou o Seattle Supersonics quando a franquia chegou aos playoffs pela primeira vez. Mas depois de deixar o Sonics, viveu uma trajetória obscura.
Envolvido com drogas e pouco comprometido com o jogo, viu seu desempenho cair de maneira vertiginosa. E isso acabou pesando para um reconhecimento que veio muito mais tarde do que especialistas imaginavam: em 2015 ele entrou para o Hall da Fama do basquete americano.
Reabilitado das drogas, hoje Haywood se dedica a ser um porta-voz da NBA, ajudando pessoas a se livrarem da dependência química. Assim como ele se recuperou do vício, os EUA recuperaram a história desse atleta. E nesse começo de playoffs da principal liga de basquete do mundo, muitos dos ídolos que estarão em quadra têm muito a agradecer a Spencer Haywood.