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Por que jogadores turcos devem ser punidos por apoio ao exército?

Na última Data Fifa, um gesto feito pelos jogadores da seleção da Turquia gerou polêmica. Nas partidas contra França e Albânia, válidas pelas eliminatórias para a Eurocopa de 2020, os atletas turcos prestaram continência em apoio à operação militar que foi realizada no nordeste da Síria pela Turquia contra forças curdas na região.

“É impossível a separação de política e futebol. Uma partida traz consigo muito fatores simbólicos, dentre eles políticos”, opina o advogado especialista em direito esportivo Igor Serrano. “A Uefa e a Fifa tendem a proibir manifestações de cunho político em geral, sem exceções, justamente para que não exista algum tipo de juízo de valor sobre as vertentes permitidas e as proibidas, pois desta forma as entidades estariam parciais.

Assim, os órgãos que regem as práticas esportivas querem evitar que atletas usem os eventos esportivos para transmitirem ao público mensagens com teor ideológico.

A Uefa anunciou que está investigando um “comportamento político potencialmente provocador” dos jogadores durante as partidas das eliminatórias.

O gesto de alguns atletas da seleção da Turquia repercutiu em toda a Europa. A ministra do Esporte da França, Roxana Maracineanu, pediu à Uefa “uma sanção exemplar” à Turquia. “Obrigada à Federação Francesa de Futebol e à polícia por seu trabalho para garantir o bom andamento do jogo. Os jogadores turcos estragaram esses esforços fazendo uma saudação militar, ao contrário do espírito esportivo”, lamentou Maracineanu.

“Tendo em vista o histórico recente pouco rígido de ambas entidades com assuntos mais sérios, como por exemplo o racismo, acredito que os jogadores da Seleção Turca e/ou a Federação podem ser multados”, afirmou Serrano.

Na Copa do Mundo da Rússia, no ano passado, no jogo entre Sérvia x Suíça, os suíços Granit Xhaka e Xherdan Shaqiri fizeram gestos que remetem à bandeira da Albânia. Xhaka e Shaqiri são descendentes de albaneses e kosovares, povos que foram alvos de repressões dos sérvios nos tempos de Iugoslávia. Apesar de a comemoração ser uma clara crítica política aos sérvios, os dois jogadores, que poderiam ter sido suspensos por três jogos, só foram multados em R$ 40 mil.

A Fifa enquadrou Xhaka e Shaqiri no artigo 57 de seu código disciplinar, que fala sobre “comportamento ofensivo e fair play” e considerou que eles tiveram “conduta antidesportiva contrária ao espírito do Fair Play”. Esse artigo não prevê suspensão de partidas. Eles poderiam ter sido enquadrados no artigo 54, que fala em “provocar o público de modo geral”, e que prevê multa mínima de 5 mil francos suíços e suspensão por duas partidas.

Mas a punição aos jogadores, ao menos sete fizeram gestos em apoio aos militares turcos, e à federação não é mais a única preocupação da Turquia. A final da Liga dos Campeões desta temporada está marcada para acontecer no Estádio Olímpico Atatürk, em Istambul. Só que os recentes acontecimentos fizeram com que Itália pedisse que os turcos perdessem o direito de sediar o jogo mais esperado no futebol de clubes a cada ano.

“É preciso considerar neste momento se a final em Istambul é apropriada, por conta dos graves atos contra a população civil curda e da intervenção militar. É necessário tomar a decisão mais valente e mostrar, uma vez mais, que o futebol é um instrumento de paz”, alertou o Ministro dos Esportes da Itália, Vincenzo Spadafora.

Não é só no futebol que manifestações dessa ordem são coibidas, segundo o advogado especialista em direito esportivo Jean Nicolau.

“O Comitê Olímpico Internacional proíbe no seu estatuto manifestações de caráter ideológico. Qualquer manifestação ideológica, seja política, religiosa, de cunho nacionalista, é incompatível com os valores do esporte, conforme o esporte foi concebido e desenvolvido. A ideia do esporte é permitir que os povos possam se enfrentar, independentemente de qualquer crença. Vem do esporte a noção de trégua esportiva, que vem dos Jogos Olímpicos antigos, que era a ideia de se parar combates por conta do esporte. O esporte tem que ser um terreno imparcial. Por ser um dos maiores palcos da terra, o palco do evento esportivo tem que ser preservado deste tipo de ação”, analisou Jean Nicolau.

A carta do Comitê Olímpico Internacional, que é a lei maior do esporte mundial, traz na Regra 50 a vedação de toda forma de “demonstração ou propaganda política, religiosa ou racial”.

Na Alemanha, o St. Pauli, tradicional clube de Hamburgo, conhecido por seu posicionamento de esquerda e contra o fascismo, o racismo e o machismo, entre outras bandeiras, demitiu o turco Cenk Sahin por apoiar ofensiva da Turquia contra curdos através de uma postagem no Instagram.

“Depois de diversas conversas entre os dirigentes do clube e o jogador, Cenk Sahin foi liberado dos treinamentos e jogos de forma imediata. Os fatores principais para a decisão foram o desrespeito aos valores do clube e também a necessidade de proteger o atleta”, afirmou o St. Pauli. Ainda de acordo com a nota oficial, o meio-campista mantém seu contrato, mas está liberado para treinar e jogar por qualquer outro clube.

“As pessoas têm liberdade de expressão e direito a opinião política própria. O ponto delicado é quando a opinião política do jogador é associada a algum regime autoritário, como no caso do [presidente turco Recep Tayyip] Erdogan na Turquia, ou faz alusão a algum comportamento discriminatório. A maioria dos clubes vai querer manter um distanciamento desse tipo de valores. E por isso é comum a punição a jogadores que se envolvam nesse contexto pelos clubes ou a publicação de notas oficiais deixando claro ser a opinião particular e não do clube”, finalizou Serrano.

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